Cartas entre nós

Onze

O ensino médio chegou e, com o passar do tempo, algumas coisas da infância ficaram para trás.

Não demorou muito para que Ben e Lis já não fossem mais os excluídos do colégio. Pelo contrário, o traço enigmático e impetuoso de Benjamin não era mais julgado como ruim, mas sim atraente, para desespero de Lis.

Por sua vez, ela logo ficou conhecida no colégio Pracinha não só como uma das mais inteligentes de sua turma, mas também como um dos destaques do time de voleibol da escola. Todos afirmavam que ela teria um futuro brilhante pela frente, não havia a menor possibilidade de um outro destino.

- Você foi sensacional hoje! – Benjamin a interceptou depois de um treino, quando Lis saía do vestiário ainda tentando arrumar os cabelos, que estavam molhados pelo banho que acabara de tomar. – Como sempre, aliás. Preparada para o jogo de amanhã?

- Não... – Ela respondeu, sorrindo. – Nunca estou. E é a final do campeonato, Ben! A nossa primeira final! A primeira final da escola! Como poderia estar preparada? Logo depois vão ser as provas finais... Se perdemos o campeonato, como vou ter cabeça para as provas?

- Ei, calma. Vai dar tudo certo! Não tem como perder com você no time. – Benjamin tentou motiva-la, passando o braço pelo ombro da garota e fazendo-a estremecer com o gesto.

- Seu elogio vale tanto quanto o da minha mãe, você sabe... – Lis desconversou, tentando disfarçar o que qualquer simples toque dele causava nela.

- Que absurdo! Você sabe que estou sendo sincero!

- Não sei se devo acreditar. – Ela brincou, só para ver a expressão indignada em seu rosto. - Para onde você vai agora? Eu preciso passar na biblioteca antes do plantão de Física.

As aulas dos garotos já tinham terminado há algumas horas. Lis tinha ficado para o treino de vôlei e, posteriormente, para o plantão de dúvidas de Física. Ben a acompanhava nas duas atividades, já que a outra opção era ficar sozinho em casa, enquanto Haro trabalhava no ferro velho.

- Me encontra no plantão? Eu fiquei de explicar sobre Matemática para o Pablito.

- Claro! Te vejo lá. Sei que você tem alergia à biblioteca...

Benjamin riu com a afirmação dela. Suas notas eram boas, mas ele odiava o ambiente antigo da biblioteca, ao contrário da amiga, que podia passar o dia inteiro ali.

Elisabete suspirou quando se separaram e Benjamin a soltou para tomarem caminhos diferentes. A cada dia que passava ficar perto de Benjamin se tornava mais difícil. Tinha raiva de si mesma por não conseguir tomar atitude nenhuma quanto a ele e aguardava, com um medo crescente, o dia que Ben apareceria com qualquer outra garota.

Essa situação, o jogo do dia seguinte e as provas finais da próxima semana faziam Lis quase ter um ataque de nervos. Caso um desandasse, a chance de levar todos os outros acontecimentos junto era grande.

- Elisabete...

Ela demorou apenas um segundo para reconhecer a voz que a chamava antes de virar para encontrar Maria Madalena a encarando, parecendo tímida ou ansiosa.

- Oi, Madá.

De todas as amizades que tinha perdido quando começou a conversar com Benjamin, a de Madá é a que tinha doído mais. E, por coincidência, foi a única que não retomou o contato com eles com o passar dos anos.

- Eu... eu queria desejar boa sorte para o jogo de amanhã. – A menina falou, desviando os olhos de Lis, como se tivesse vergonha de encara-la.

- Ah... Obrigada! Você vai vir assistir?

- Vou sim.

- Que bom! Nos vemos lá, então!

- Ei, Lis, espere... Será que eu poderia, sei lá, ligar para você qualquer dia desses?

- Claro que sim, Madá! – Lis sorriu abertamente com a ideia, e Maria Madalena a acompanhou. - Você sempre pode...

- Obrigada!

Ainda sorrindo, ela se virou e deixou Lis ali, ainda sem entender direito o que tinha acontecido, mas feliz porque, aparentemente, ela queria retomar a amizade. Sentia falta dela. Esperava que ela realmente ligasse, seria bom colocar o papo em dia depois de tantos anos. Talvez Madá conseguisse dar uma luz para os sentimentos confusos de Lis sobre Ben, seria bom conversar com alguém.

Durante o percurso até a sala onde seria feito o plantão de Física, Lis refletiu sobre as mudanças que estavam acontecendo em sua vida recentemente.

Estava indo para o último ano do ensino médio, era uma excelente jogadora – mesmo que não assumisse isso nem para si mesma -, tinha as melhores notas da turma e, agora, Madá queria retomar a amizade com ela.

As únicas pendências que restavam eram seus sentimentos por Ben e a profissão que escolheria ter para o resto de sua vida. Coincidentemente, eram as duas coisas que mais a tiravam o sono ultimamente.

Distraída com essas reflexões, demorou para entender o que estava acontecendo na sala de aula quando entrou.

Não era Pablo que estava ali com Benjamin, mas sim Carla, que era nada mais nada menos do que a menina mais bonita da turma, quiçá de todo o colégio.

E, também, eles não estavam exatamente estudando. Carla estava quase em cima de Benjamin, que tinha um sorriso dançando em seu rosto.

Lis quase podia ouvir seu coração caindo no chão e se quebrando. Sabia que isso aconteceria, mais cedo ou mais tarde e vê-lo assim, feliz com outra garota, provava seu ponto de que Ben nunca tivera qualquer tipo de interesse romântico com ela.

Magoada, deixou seus cadernos caírem com violência na mesa mais próxima, do lado oposto ao que eles estavam. Não teve coragem de olhar para Ben, mas o silêncio na sala se tornou palpável.

Antes que alguém pudesse dizer alguma coisa, o professor entrou na sala, seguido de mais alguns alunos. O olhar dele foi de Lis para Ben, estranhando que estivessem sentados tão longe um do outro.

Os olhos de Lis arderam com a vontade que sentiu de chorar, mas ela segurou firme. Tão firme que seus dedos se fecharam na mesa e ela teve que se esforçar para abri-los, na tentativa de aparentar alguma naturalidade.

O professor atendeu a cada dúvida que fora perguntada e, antes que ele terminasse de se despedir, Lis pegou suas coisas e saiu como um raio porta afora.

O ciúme era amargo e sufocante. Ela queria gritar, chorar ou apenas esquecer. Qualquer coisa, menos falar com Benjamin.