Retirada.

456 33 5
                                    

Andei cabisbaixa por todo o corredor e torci para que não fosse vista. Não foi dessa vez que minhas preces foram atendidas. Percebi que alguém estava logo atrás de mim, passos que acompanhavam o ritmo dos meus. Bem provável que essa pessoa queira me alcançar.

Normani: Hey! – Continuei, torcendo para que ela não insistisse. Meus olhos ainda estavam cheios de lágrimas. Eu estava definitivamente derrotada em todos os sentidos. – Camila? – Ouvi os passos atrás de mim mais rápidos. – Tá surda? Camila? Preciso falar com você, é sobre a fábrica. – Desisto. Cessei os passos, sequei minhas lágrimas e fiz a melhor cara possível.

Camila: Certo. O que houve? – Normani inclinou seu pescoço para direita, franziu o cenho e pôs-se a me analisar. Ela ficou por quase um minuto me observando, aquilo estava me dando nos nervos. – Então... O que queria me dizer?

Normani: Você está bem? – Era esse o tipo de pergunta que eu estava tentando evitar.

Camila: Acho que minha vida pessoal não tem tanta relevância quanto a fábrica. Não concorda? – Vi expressões de espanto. Talvez ela quisesse entender o motivo da grosseria.

Normani: Devo concordar, mas é interessante saber se posso ajudar uma amiga. Não concorda? – O feitiço se virou contra a feiticeira? Nada mais justo, ainda mais depois da resposta que dei à ela.

Camila: Justo. Estou bem sim, são apenas problemas, todos temos. Podemos voltar aos problemas da fábrica? Ele talvez tenha mais relevância.

Normani: Claro, você está certa. Então... –  Mais uma vez ouvi passos distantes, não devo dizer passos, era mais uma corrida. Posso dizer que a pessoa estava em uma maratona, pois corria bem rápido. – Algumas linhas estão precisando ser inspecionadas... – Antes que ela terminasse, ouvi um grito.

Dinah: Ela não pode fazer isso com você!!! – Arregalei meus olhos, fechando-os logo em seguida e rezando para que Dinah não prosseguisse.

Camila: Essa não. - Sussurrei baixinho. Dinah se aproximou, puxando-me pelo braço. – Não é hora para isso! – Exclamei.

Dinah: Não é hora de ser omissa, isso sim. Até quando vai aguentar tudo o que lhe é imposto sem reclamar sobre seus direitos? Você não pode continuar assim! – Era quase um grito de guerra.

Camila: Esse não é o meu local de fala. Eu sou empregada, ou melhor, fui empregada, agora não sou mais. – Dinah rangeu os dentes.

Dinah: Você foi omissa, complacente, teve toda empatia possível, pra ser demitida?! Qual o problema da Lauren!!? – Normani arregalou os olhos.

Camila: Pshhhhh... Quer diminuir o tom da sua voz? Estamos bem próximas, ouço sua voz claramente, não há uma razão para levantar o tom.

Dinah: Eu estou lutando para manter você aqui. Todas sabemos que esse é o seu lugar, esquece a Lauren. Você nos pertence, queira você ou não. – Não sei se considero isso fofo, ou abusivo. – Ela não tem crivo, só pode, não consegue filtrar as coisas idiotas que ela faz. Isso é ridículo. Não se trata apenas dela, ela não pode simplesmente te demitir, você depende desse emprego. –

Camila: Dinah... – Respirei fundo e tentei me acalmar. – Sim, você tem razão. Ela está sendo egoísta, mimada, tudo isso e mais, porém, o meu erro foi ter confrontado ela. Não foi apenas isso... Meu erro foi achar que meu lugar era aqui. Todos me avisaram sobre essa fábrica. Confesso que não queria aceitar essa “oportunidade”. - Fechei as aspas no ar. – Aceitei por conta do meu orgulho, mas a verdade, é: Eu não sei se consigo cuidar disso tudo.

Dinah: O que?!?! Do que você está falando? A sua gestão melhorou essa fábrica, você fez o que ninguém fez antes. Nos auxiliou, nos ouviu, nos atendeu. Camila, você foi a melhor de todos. 

Camila: Sim, mas para confrontar a Lauren. Passei noites em claro, aguentei crises e crises de ansiedade, chorei, deixei de me alimentar, não tive mais contato com minha família. Simplesmente por orgulho, só para provar à Lauren que eu conseguiria. Isso não foi saudável. – Um extenso período de silêncio. Dinah estava refletindo sobre tudo o que falei.

Normani: Noites em claro, crises de ansiedade, você fez tudo isso para confrontar ela? Realmente, você não está sendo gentil consigo mesma. – Dinah me observou, depois fixou seu olhar sobre Normani. – Se estar aqui tira a sua paz, pode ser que seja a hora de procurar algo melhor. Dinah permaneceu calada. 

Camila: Sim. Errei comigo mesma, exigi o meu máximo, para ser sincera, eu posso dizer que excedi o meu limite. Fiz do meu trabalho algo que me sobrecarregou, ao invés de ser prazeroso comecei a odiar estar aqui, exceto pela companhia de vocês. – Dinah abriu um leve sorriso.

Normani: Plausível. Não há o que discutir, você sabe sobre os seus limites. – Normani se aproximou e me puxou para um forte e longo abraço. Dinah logo em seguida fez o mesmo.

Dinah: Eu não queria que você partisse. – Seus olhos estavam cheios de água. Olha só? Parece que ela tem um coração. Ri por conta do meu próprio comentário. – Isso é engraçado? – Perguntou a mulher revoltada.

Camila: De forma alguma. Vou sentir saudades! – Acho que posso chorar agora, não tenho motivo para esconder. E assim começou o choro coletivo. Nós três no maldito corredor, chorando como crianças.

Dinah: Sabe onde precisa ir, não é? Lucy tem uma enorme fábrica também, é nossa concorrente, mas eu aceito que você vá. Não quero que você fique sem um emprego. – Olha só... Eu não me recordava disso, bem lembrado!

Camila: Dinah, eu te amo!! – Abri um enorme sorriso ao perceber que ao menos desempregada eu não ficaria. – Eu não me recordava sobre esse pequeno detalhe. Um detalhe pertinente. – Mantive o sorriso no rosto. 

Normani: Vai esperar a Ally para se despedir? – Devo aguardar dentro dessa fábrica? Um ambiente que me traz péssimas recordações? Acho que não, minha cota sobre esse lugar já está encerrada.

Camila: Eu preciso sair daqui. Não aguento mais esse lugar, estou farta. Só preciso ir embora e agora... Depois eu falo com todos. – Me afastei das garotas, acenei e parti em retirada, entretanto tive a agradável surpresa de ser acompanhada pelas duas mulheres.

Dinah: Vamos te acompanhar. Não vai ser agora que se livrará de nós duas. – Dei um leve sorriso. – Andamos até o final do corredor que nos levava até a portaria. Já na entrada, encarei todo aquele ambiente, queria que aquela fosse a minha última lembrança de lá. Memorizei cada detalhe daquela estrutura, fiz daquele momento, um momento único. Olhei para as expressões de Dinah e Normani, fiz daquelas expressões um incentivo, um incentivo para melhorias em minha vida, pois ambas estavam com uma expressão de satisfação, de orgulho por me terem como amiga.

Camila: Eu prometo que vou voltar, prometo também que não esquecerei sobre a importância de vocês em minha vida. – Todas nós abrimos um sorriso. – Agora posso ir em paz. – Andei até o estacionamento, entrei no carro e caí aos prantos.

Eu odeio a minha chefeOnde histórias criam vida. Descubra agora