Um local seguro.

249 17 2
                                    

Uma noite de 7 graus! As pontas dos meus dedos estavam congelando. Liguei o aquecedor do carro enquanto me aproximava do local. Circulei o estabelecimento que já estava se fechando, porém, havia um frentista no lugar, o mesmo se encontrava próximo à Alana... Talvez por estar preocupado com a garota sozinha naquele lugar e horário.

Encolhida na calçada e ao lado de uma enorme mala, essa era a situação em que ela se encontrava. Balancei a cabeça desaprovando tudo aquilo. Parei meu carro rapidamente ao lado dela, abri a porta e quase instantaneamente fui a seu encontro. O frio era tanto que vi sua pele arrepiada, seu corpo estremecia involuntariamente.

Camila: Tá tudo bem? – Olhei diretamente para seu rosto. Nele havia um grande inchaço acompanhado de um roxo que se esverdeava no final da lesão. Arregalei os olhos. – O-o... O que aconteceu? – Eu me tremia de frio, misturado com medo e culpa. Alana começou a chorar, eu rapidamente a puxei para um abraço. Sua pele estava fria, seu corpo inteiro estava paralisado.

A abracei com tanta força, que pude sentir seu corpo enrijecer. Ouvi e senti seu choro baixo, enquanto ela tentava se desvencilhar do meu abraço e por reflexo não desprendi meu corpo do dela. Percebi a garota secar as lágrimas com as mãos, seu corpo tremia freneticamente.

Camila: Você está congelando! - Tirei meu casaco e tentei cobrir as partes expostas ao frio.  – Eu sinto muitíssimo. Isso é tudo culpa minha, se eu tivesse ficado calada. – Alana não soltou nenhuma palavra. Peguei a bagagem que estava no chão e coloquei dentro do carro. Não houve nenhuma reação por parte dela, Alana continuou imóvel. Isso tudo é um choque, tanto para mim quanto para ela. Observei-a por alguns segundos.

Alana: Ele me deu um soco na cara. Eu não fiz nada, eu não consegui fazer nada. – Meu corpo se tremia, aquilo tudo me parecia um filme de terror.

Camila: A gente precisa ir na polícia, imediatamente! – Esbravejei.

Alana: Não adianta. – Arregalei os olhos.

Camila: O que? Claro que adianta, você não pode ficar aqui e morrer de medo, enquanto aquele babaca está livre por aí.

Alana: Eu só quero sair daqui, por favor. – Alana não conseguiu segurar o choro. – Por favor, me tira daqui. Eu estou acabada, não estou nada bem. - Puxei delicadamente a garota para que entrasse no carro, ela se encolhia mais por causa do frio.

Camila: Eu sinto muito por isso. E-eu... – Meus olhos se encheram de água. Já com ela dentro do carro, senti um grande alívio. Esfreguei minhas mãos esperando que o atrito me ajudasse com aquele frio infernal. Olhei diretamente para ela, que percebeu meus olhos vermelhos.

Alana: Está tudo bem, não foi sua culpa. – Não consegui conter meu choro. Uma sensação tão ruim, indescritível, eu diria. Culpa, raiva, nojo.

Camila: Me desculpa, por favor. – Coloquei minhas mãos nos olhos para tentar controlar o choro. – A culpa é toda minha, eu não deveria ter contado. Eu só queria proteger a Lauren, eu não sabia que você estava em perigo, não pensei em você. – Alana me puxou para perto, segurou meu rosto e manteve sua visão sob mim.

Alana: Não foi você quem me bateu, a culpa não é sua. – Eu estava tremendo de agonia, me senti tão mal. Isso é muito grave, uma pessoa se feriu por minha causa.

Camila: E... E se ele tivesse feito algo com você, se ele tivesse te matado. Meu Deus! – Comecei a soluçar, o choro que eu tanto tentei prender saiu como uma barragem rompida.

Alana: Você veio me ajudar. Eu preciso te agradecer por isso, nem imaginava que você faria isso. Pensei que me odiasse, que estivesse com raiva de mim por querer acabar com o casamento de Lauren. Nem ao menos pensei que você acreditaria em minha palavra. – A cada frase dita, meu coração se acalmava.

Camila: Não poderia te deixar aqui. – Sequei minhas lágrimas. – Eu me imagino na sua situação, isso é horrível.

Alana: Você veio, isso que importa. Eu sabia, sabia que não negaria ajuda. – Olhei em seu rosto, ela parecia estar calma. – Por um momento pensei que iria dormir na rua. James pegou todos os meus cartões, só não pegou o meu celular porque não deixei, mordi o braço dele e ele “retribuiu” com um soco.

Camila: Que verme desprezível, não da para acreditar. – Respirei fundo e tentei me manter branda, se é que existia alguma possibilidade disso acontecer.

Alana: Deixei ele com um prejuízo de quatro milhões. Não esperava menos que isso. – Coloquei a mão na cabeça para expressar minha surpresa e indignação.

Camila: Mas você também ficou no prejuízo. – Rebati indignada.

Alana: Acha mesmo que ele dividiria esse dinheiro comigo? Com certeza não. Se ele realmente fosse dividir, eu não contaria o plano para você, justamente por saber o risco de você contar à Lauren.

Camila: Mas, o que? – Tentei digerir aquela informação. – Por que aceitou o plano? – Questionei.

Alana: Porque Lauren merece alguém melhor, não uma sanguessuga que vai usurpar tudo que ela tem. Não era pelo dinheiro, era pela Lauren.

Camila: Você ainda a ama. – Abri a boca. A garota soltou uma risada baixa.

Alana: Já amei muito, hoje tenho um sentimento de gratidão. Enquanto estive com ela, pude ver quem realmente o James era, ela me fez sentir bem, fez com que eu entendesse o meu valor.

Camila: Vocês ficaram tão pouco tempo juntas. – Foquei minha visão em seu rosto.

Alana: Sim e nesse pouco tempo ela me fez sentir bem comigo mesma. Vivi um relacionamento abusivo com o James, acho que ela passava a mesma coisa com o ex-marido dela. – Balancei a cabeça concordando.

Camila: Ela também passou por muita coisa com o ex dela. Ele a agredia, era possessivo. Vocês estavam juntas enquanto casadas?

Alana: Não foi bem assim, é difícil explicar. – Eu já estava tão tranquila, que senti minha respiração leve. A garota conseguiu transmitir segurança e calma. – Parece que você está mais tranquila.

Camila: Eu... E-Eu... Sim! Obrigada, eu estava precisando disso. – Meus olhos piscaram rapidamente. – Não sei o que te dizer.

Alana: Só me leve para um hotel mais próximo. Vou ver o que consigo fazer.

Camila: Mas você não tem dinheiro, tem certeza? Se quiser pode ficar comigo essa noite. Amanhã a gente pode ver algo para te ajudar.

Alana: Não, está tudo bem, eu me viro. – Duvido muito que ela consiga algo, ainda mais nesse horário.

Camila: São 22 horas, não tem nenhum caixa eletrônico aqui perto, você não vai conseguir sacar dinheiro e provavelmente nem pagar um quarto de hotel. – Alana fechou os olhos com força e lamentou a situação. – Você vai para casa comigo.

Alana: Eu não quero incomodar. – Chega até ser cômico esse pensamento dela. Achar que depois de levar um soco na cara por minha culpa, eu iria me incomodar por ceder estadia.

Camila: Incomodar? Você não tem para onde ir, você tá achando que sou escrota o suficiente para deixar você, uma mulher assim como eu, sozinha num hotel e ainda por cima sem dinheiro? Em que mundo você vive?

Alana: Haha... Não sei o porquê estou espantada. – Recebi um sorriso carismático. – Você realmente é interessante demais.

Camila: Ser interessante é ter medo que uma pessoa que eu gosto fique na rua, no frio e sem dinheiro? Okay, diferente o seu conceito.

Alana: Não é isso, você entendeu o que eu quis dizer. – Dei um leve sorriso e liguei o carro. – Acho que já podemos ir.

Camila: É, já podemos ir. – Procurei por toda parte do carro algo para limpar o para-brisa embaçado, por sorte havia um pano velho que eu uso para esfregar meus sapatos, acabei esquecendo aqui dentro.

Alana: Experimenta abrir só um pouco o vidro, pode ser que resolva. – Esfreguei todos os vidros. Sem sucesso. Abaixei um pouco o vidro da janela do meu lado, Alana também tentou ajudar da forma dela, passando suas mãos nos locais embaçados e abrindo a sua janela até a metade.

Camila: O jeito é ir bem devagar, é até melhor para não sentirmos muito frio com esse vento congelante vindo do lado de fora.

Alana: Não estou com nenhum pouco de pressa, não agora que estou com você. Me sinto bem mais segura, isso sim.

Camila: Não se precipite, ainda temos que ir à polícia. – Com o carro em movimento, observei toda a rua. Escuro, essa parte da cidade não parece ter tanta visibilidade pela prefeitura. Bairro estranho. – Não teve medo de ficar alí?

Alana: Claro que tive. – Rebateu indignada. – Só não tive escolha, James me deixou há duas ruas abaixo do posto, em um lugar totalmente deserto e escuro.

Camila: Ah... Havia me esquecido desse detalhe. – Dei um sorriso amarelo.

Alana: Não sabe o alívio que eu senti ao ver o posto de combustível. Corri o mais rápido possível para chegar nele, eu juro que estava me tremendo de medo.

Camila: Além de medo, também tem o frio. – Aumentei um pouco a velocidade do carro. Preciso chegar em casa, tomar um banho e descansar.

Alana: O medo naquele momento nem me deixou sentir frio, só depois que me senti um pouco mais segura, aí o frio foi tomando conta do meu corpo.

Camila: É, consigo imaginar bem o que você passou. – Só mais um pouco até chegar em casa. Meu corpo já havia se acostumado um pouco com a temperatura, apesar do carro estar frio, não era algo incômodo.

Alana: Vou subir o vidro, acho que esse pouco embaçado não vai te atrapalhar na condução.

Camila: Claro, a gente já está chegando também. Pode subir por completo. – Assim se foi feito. Em poucos minutos já estávamos na portaria do condomínio. Uma breve sinalização ao porteiro e pronto, já estávamos no estacionamento e preparando para subir ao prédio.

Alana: A pior parte é sair do aconchego do carro, que está bem quente, diga-se de passagem. – Ela lamentou.

Camila: Vou pegar sua mala, aguarde aqui, por favor. – Desci do carro e busquei a bagagem que estava atrás. Uma mala com rodinhas, eu acho muito mais prático assim, uma pena que ainda uso mochilas para viajar. – Já pode sair do carro.

Alana: Unfh... – Ouvi um gemido de desgosto. Soltei uma leve risada após ouvir.

Camila: Relaxa, daqui 5 minutos a gente chega lá. – Hahaha... Alana estava toda encolhida, mal se movimentava direito. – É mais fácil você apertar o passo e chegar mais rápido, do que ficar aquecida e demorar mais tempo para entrar.

Alana: Eu juro que estou tentando. – Me aproximei da garota, colocando a mão por trás do seu ombro. – A intenção é me aquecer? Falhou miseravelmente.

Camila: Pelo menos estou tentando. – Ela riu, depois passou sua mão em minha cintura. – Viu? Você concorda que a ideia não é tão ruim.

Alana: “Pelo menos estou tentando.” – Ela repetiu a frase que ouviu há segundos atrás. Nós duas soltamos uma gargalhada sincronizada.

Eu odeio a minha chefeOnde histórias criam vida. Descubra agora