Julho 1999
A minha mãe estava de volta. Aparentemente, os medicamentos novos estavam a ajudá-la bastante, a ela e ao pai. Aquilo fazia com que eles ficassem estranhamente relaxados e felizes e ajudava também a que eles nos dessem mais atenção. Ainda continuava sem perceber o que é que eu não podia descobrir, o que é que eles tinham medo que eu descobrisse. Mas a verdade estava próxima de ser revelada.
Abril 2003
Tinham-se passado quatro anos e a verdade acabou por vir ao de cima. Aquilo que a mãe e o pai andavam a tomar nos últimos anos, não eram medicamentos nenhuns, era droga. Aquela mentira permaneceu naquela casa durante dois anos. Durante dois anos, eu acreditei que aquilo eram simplesmente medicamentos que se tomavam de uma forma diferente. Durante dois anos, a minha mente inocente convenceu-se de que estava tudo bem, a mãe estava melhor. Diferente... mas melhor, e isso era tudo o que importava para mim. Estava longe de imaginar que a minha mãe se tinha transformado numa drogada, numa viciada, e que, por causa disso, começou a afastar-se de nós. Mas não foi só ela, o meu pai seguiu o mesmo caminho. Passado um tempo, a sensação de não ser amado por ninguém, de não ser digno da atenção de ninguém, apareceu. Mas eu sabia que não estava sozinho. Apesar de ainda ser pequeno, o Miguel também sofria com tudo isto. Podia ver-se nos olhos dele. Aliás, foi por causa dele que eu percebi realmente o que se estava a passar.
Na altura, o Miguel tinha acabado de fazer dois anos. Estava muito bem desenvolvido, mas ainda não falava muito bem, trocava muitas vezes as palavras. Mas nesse dia ele foi muito direto e disse com todas as letras, a palavra droga. No início, fiquei confuso porque fui completamente apanhado de surpresa, mas depois as peças juntaram-se na minha cabeça. Já tinha visto muitas notícias sobre o assunto, porque estava quase sempre ao colo do pai quando ele via notícias e sabia que não era uma coisa boa e que fazia com que as pessoas fossem presas.
- O que disseste, Miguel? - perguntei eu, queria ter a certeza.
- Droga - repetiu ele, e o meu corpo estremeceu.
- Miguel? O que disseste? - eu não queria acreditar.
- Droga - voltou a dizer e apontou para o canto da sala onde estava um saco castanho que continha a medicação da minha mãe - Mamã... Disse...
- A mamã disse que era droga? A quem?
- Papá.
- Tens a certeza? Ouviste mais alguma coisa? - mas ele não respondeu, foi brincar e eu também não o chateei mais. Já tinha toda a informação de que precisava para confrontar os meus pais. Eu podia ainda ser uma criança, mas não era estúpido e não ia permitir que eles destruíssem a minha vida. Mas, apesar dos meus esforços, isso foi o que acabou por acontecer.
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Recomeçar
RomanceNádia tinha treze anos quando viu o seu pai assassinar a sua mãe. A violência doméstica durava há demasiado tempo naquela casa, e a morte de Amélia foi o culminar daquela vida e daquela família. Marco tinha catorze anos quando testemunhou a detenç...