Fevereiro 2013
Era ela. A Nádia. O destino teve a excelente ideia de fazer com que as nossas vidas se voltassem a encontrar e não foi pelos melhores motivos. Eu estava desesperado por dinheiro e assaltei-a. Só percebi que tinha sido ela a minha primeira vítima, quando cheguei a casa e lhe vasculhei a mala. Não havia nada de muito interessante lá dentro: uma carteira, um porta-moedas, uma bolsinha com tampões, lenços de papel, batom, máscara de pestanas, dois molhos de chaves, desodorizante, uma barra de cereais e muitos talões e papéis aleatórios. Por respeito a ela, não roubei nada, deixei tudo como estava. Provavelmente, se fosse outra pessoa, não teria feito o mesmo.
Ela ontem foi ao bar do Xavier e eu servi-lhe um café. Não sei se ela me reconheceu nem sei o que é que ela estava lá a fazer, mas aparentemente conhece o meu patrão e tem uma certa afinidade e confiança nele. Ela estava com o tal de Fred, aquele que me atacou na escola, tenho a certeza de que ele não me reconheceu também. Mas eu, felizmente ou não, tenho uma memória muito boa.
- Sabes onde mora aquela rapariga que veio cá falar contigo ontem? - perguntei eu ao Xavier.
- Quem? A Nádia? Claro que sei! Ela está a morar num apartamento que era meu! Mas porquê? De onde é que a conheces?
- Não a conheço de lado nenhum, é só que... eu encontrei a mala dela... - tentei parecer convincente.
- A sério!? Ela foi assaltada, sabias? Veio cá ontem pedir-me ajuda para resolver as coisas com os cartões. Mas sendo assim, eu dou-te a morada e tu vais lá devolver aquilo que encontraste!
- Sim, claro! - disse eu.
Agora precisava de ganhar coragem para ir bater à porta dela e devolver aquilo que lhe roubei. Pela primeira vez na vida, arrependi-me de alguma coisa.
Quando acabei o meu turno, fui a casa dela. Sei que era uma péssima ideia, mas tinha de me redimir. Eu sentia-me mesmo mal. Já tinha arruinado a vida e a sanidade mental à Jéssica, não podia fazer com que isso acontecesse outra vez. Não podia fazer isso à Nádia! Respirei fundo e bati à porta. Não demorou muito até ela abrir. A sua expressão mudou imediatamente quando bateu com os olhos em mim.
- O que é que tu queres? Já não me deste problemas suficientes?
- Eu... Eu só quero que me ouças... pode ser? - ela ficou calada, com uma cara muito séria - Eu sei que não resolve nada, mas... - mostrei-lhe a mala – queria mesmo pedir desculpa... é que...
Ela tirou-me a mala das mãos e interrompeu-me:
- Vai-te embora. Já ouvi o suficiente!
E fecha-me a porta na cara, sem me dar oportunidade de explicar.
Sinceramente, não sei do que estava à espera. Não podia esperar que ela me recebesse com um sorriso na cara, sendo que quase lhe estraguei a vida.
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Recomeçar
RomanceNádia tinha treze anos quando viu o seu pai assassinar a sua mãe. A violência doméstica durava há demasiado tempo naquela casa, e a morte de Amélia foi o culminar daquela vida e daquela família. Marco tinha catorze anos quando testemunhou a detenç...