Capítulo 56-Fazendo as pazes com o passado I

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-Oh sim, ele era meu professor de matemática do ensino médio-Clarisse sorriu amarelo
-Sério?-Fábio olha surpreso para a filha e dirigindo-se ao esposo-2 anos de namoro e 10 anos de casamento, por que você não me contou que já foi professor da minha filha?
-Meu mel, porque...-Élis fala com carinho ao marido enquanto tentava achar uma resposta convincente-Porque eu não vi momento para falar simplesmente
Quando escutou "meu mel", Marcelo sentiu um grande ímpeto de rir, conseguiu imaginar Élis cantando a música de mesmo nome de Marquinhos Moura, grande sucesso dos anos 80 e achou isso muito engraçado, mas conteve-se, expressando apenas um sorriso sarcástico para esboçar suas emoções.
Já para Clarisse, isso passou batido, porque, apesar de ela ter dado graças a Deus pela intervenção de Marcelo, ainda não se sentia segura o suficiente para rir de qualquer coisa.
-Está bem, Élis, depois conversamos-responde Fábio secamente e voltando-se para Clarisse muda o tom para um mais amigável-Agora que você já está inserida na família, eu quero conversar com você a sós
Dessa forma, dirigindo-se aos outros presentes na sala:
-Se vocês me dão licença...
Assim, Vargas e Élis se preparavam para sair do cômodo:
-Com licença-fala Vargas levantando-se e saindo
-Vem, filho, papai nº1 precisa conversar com sua irmã-Élis chama Michael e ele obedece, segurando na sua mão
Entretanto, Marcelo não saiu, então, Fábio um pouco incomodado, mas tentando parecer calmo, diz:
-Você também, Marcelo
Ele lança um olhar questionador para Clarisse, perguntando se, de fato, deveria ir:
-Por favor, meu amor-responde Clarisse
-Desculpe, eu estava distraído-ele disfarça saindo da sala
-Vamos nos sentar, filha
-Ah, claro-fala Clarisse sentando-se em um sofá cor de pêssego que havia na sala
-Então, você deve ter muitas perguntas, não é?
-Não muitas, algumas só-Clarisse fala se sentindo mais segura por estar na presença do pai-Por que você não lutou por mim quando a mãe disse que não queria você por perto?
-Clarisse-ele respira fundo-Eu tinha uns 20 e poucos anos, não sabia nem o que eu queria para minha vida, tinha muitos problemas, minha família me pressionava para terminar o casamento e fazer faculdade de Direito, e ainda tinham os problemas emocionais, eu conheci o Élis e comecei a me apaixonar por ele, me descobrindo bissexual e eu demorei pra me aceitar, sair do armário foi bem difícil pra mim, você entende, né? Mas me desculpe por deixar esses problemas tomarem conta de mim
-Não, tudo bem, isso é passado, eu sou mãe, uma coisa que você não sobre mim...
-Não, tudo bem, isso é passado, eu sou mãe, uma coisa que você não sabe sobre mim
-Meu Deus, eu já sou avô!-exclama Fábio
-Sim, então, continuando, eu entendo que, como mãe, às vezes posso tomar uma decisão para minha vida que não agrade meus filhos e tá tudo bem, porque eu não sou perfeita-Clarisse fala chorosa e depois sorri-Então, eu te perdoo, vamos tentar recuperar o tempo perdido
-Oh, meu Deus, Clarisse, você é tão fofa-Fábio abraça a filha, emocionado com as palavras dela
-Meu Deus, você tá chorando-Clarisse sorri enquanto as lágrimas desciam em seu rosto
-Você também-ele ri
-Nós estamos chorando-Clarisse sorri enquanto enxugava as lágrimas-Oh, meu Deus, chega, eu não quero chorar
-Ok, então, não vamos chorar-ele também enxuga as suas lágrimas-Então, vamos mudar de assunto, tem algo mais que você queira me perguntar?
-Tem-fala Clarisse pensativa-Eu quero que você me fale sobre a minha mãe, como você conheceu ela, o que você achava dela...
-Bom, eu conheci a Virgínia em uma tertúlia que tava acontecendo numa casa de uma amiga dela, nós tínhamos amigos em comum e foi aí que começou. Estava na minha roda de amigos e aí ela chegou com a dona da casa, ela tinha um rosto lindo e os cabelos ondulados e castanhos escuros como você
Clarisse sorri.
-Me conta mais. Como vocês começaram a namorar?-ela fica animada de uma maneira pueril
-Hum-ele hesita-Posso ser honesto com você? Você não vai me julgar?
-Claro, prometo, seja honesto
-Então...o meu interesse na sua mãe sempre foi amizade, nessa época, eu saía com várias mulheres, mas a minha intenção não era fazer isso com a Virgínia, ela parecia tão angelical que nem passava fazer isso pela minha cabeça
-Sim e aí?
-Aí ela começou a se aproximar de mim, a gente fez amizade, mesmo ela sabendo que eu era um mulherengo e aí a gente começou a se encontrar num riacho que tinha fora de Massapê, lá a gente contava os problemas um para o outro e descobrimos um gosto em comum, o fascínio pela moda e alta costura, era tão bom poder conversar com alguém sem te julgar, sem tentar usar a sexualidade como ofensa, porque, com certeza se eu fosse contar para algum cara amigo meu naquela época, provavelmente, iriam me chamar de boiolinha, florzinha e quando a gente é jovem a gente fica com vergonha de algumas coisas, principalmente, eu que tinha masculinidade frágil naquela época
-Deve ter sido horrível, pai-Clarisse coloca a mão no ombro dele
-Foi, mas graças a Deus hoje eu não tenho mais vergonha de ser quem eu sou, uma florzinha mesmo-ele brinca
Clarisse sorri.
-Então, continuando à medida que nós encontrávamos, eu notava que a Virgínia estava cada vez mais apaixonada por mim e eu sei que fui um idiota, não deveria ter me aproveitado dos sentimentos dela, mas o lado bom disso foi que você nasceu-fala Fábio com nostalgia
-E o que aconteceu depois?-Clarisse estava curiosa
-Ela descobriu que estava grávida de você e a família dela, muito tradicional, começou a me acochar para casar e ela também ficou muito triste, porque tinha muito medo de ficar mal falada na cidade, porque sabe como é, você nasceu lá, cidade pequena, todo mundo se conhece e aí dá abertura para falar da vida dos outros-ele faz uma pausa-Aí nós casamos e eu te juro que meus planos eram ficar lá, trabalhar em Massapê, ficar casado, realmente, até que a morte nos separe, me dedicando só a você e a ela. Só que os problemas começaram a vir, meu pai querendo que eu fizesse faculdade, minha mãe morreu e eu tava muito infeliz com tudo, aí qualquer discussãozinha com a sua mãe, era motivo para eu sair para beber e foi nessas saídas para beber que eu conheci o Élis e me apaixonei loucamente por ele, foi tudo tão intenso que eu achei que estava ficando louco...-Fábio é interrompido por Clarisse
-Chega!-fala Clarisse irritada-Eu não quero saber do seu relacionamento com o Élis, eu não tenho nada a ver com ele, vim saber da minha mãe
-Desculpa, Clarisse, eu não sei o que deu em mim-Fábio estava sinceramente arrependido
A filha respira fundo se acalmando.
-Me desculpa, eu não sei o que deu em mim, eu tô na sua casa, não sei onde estão os meus modo?
-Tudo bem, eu entendo, não falo mais dele então-Fábio sorri compreensivamente-Mais alguma coisa para me perguntar?
-Não-Clarisse faz uma pausa-Na verdade, eu trouxe uns álbuns e um pen drive que eu restaurei de quando eu era criança, eu queria que você visse comigo para a gente relembrar o passado
-Eu adoraria, filha
Assim, Clarisse foi buscar esses objetos nostálgicos no carro de Marcelo e mostra para o pai. Os dois se divertindo tanto, choraram tanto com as emoções provocadas pelas lembranças do passado, um clima agridoce se instalou na sala. Até que chegou em um momento que que eles pararam em uma foto, rara, de Clarisse com sua mãe, porque Virgínia não gostava de tirar fotos.
-Sua mãe parece tão...diferente de quando eu a conheci, tem um olhar tão triste, apesar de estar sorrindo-disse Fábio com melancolia
-Sim, esse era o olhar com que eu sempre a via, ela nunca superou o fato de você ter abandonado ela, nunca se permitiu amar de novo, sempre querendo se dedicar só a mim. Acho que, por isso, ela se tornou uma pessoa um pouco amarga
-Isso é tão triste-fala Fábio ainda com mais taciturnidade na voz-Quem me dera poder fazer escolhas sem magoar ninguém, mas nem Jesus agradou a todo mundo
-Verdade, eu não te culpo, você simplesmente fez sua escolha, eu te culpava por não ter sido um pai presente, mas eu já te perdoei, levando em conta os seus problemas do passado
-Que bom, filha-comenta Fábio e continua dizendo-Já que nós estávamos falando da sua mãe, ela ainda mora em Massapê?
-Não, ele deve estar morando no Céu com certeza-fala Clarisse com certa tristeza
-O quê?-pergunta Fábio sem acreditar no que estava ouvindo
-Ela morreu quando eu tinha 17 anos e, indiretamente, foi minha culpa-lágrimas caem do rosto de Clarisse
-Como assim?
-Desculpa, pai, eu não quero falar sobre isso-Clarisse começa a chorar e Fábio à abraça
De repente, a governanta entra na sala, de forma servil, informando que o almoço já estava pronto.
-Você quer almoçar, filha?-pergunta Fábio com brandura
-Por favor
A mesa estava farta, de entrada, havia canapés, caviar e nozes. O prato principal era lagosta à francesa. De guarnições, havia arroz à valenciana e vários tipos de sala, tudo estava muito silencioso.
Ao finalizarem a refeição, Clarisse e Marcelo ficaram mais um pouco para conversarem trivialidades, depois, despedindo-se para irem embora.
Ao entrarem no carro, Marcelo dava a marcha, enquanto comentava o quão estranho tinha sido a chegada deles naquela casa.
-Clarisse, que mundo pequeno, inacreditável que seu pai esteja atualmente casado com o chato do Élis
-Nem me fale!-exclama a namorada-Se fosse uma novela, eu diria que foi um excelente plot twist.
Sem pensar muito na fala, pela intimidade que tinha com Marcelo, ela fala:
-Agora, eu entendo porque minha mãe, naquela época, às vezes, se referia ao meu pai como "macho tabaco"
-Ok, isso é muito estranho-comenta Marcelo
-Eu sei, mas minha mãe não tinha estudo, era como ela entendia a situação-Clarisse se justifica
-Sabe de outra coisa estranha, você viu como o Élis chamou seu pai, de meu mel, é quase impensável pensar no Élis que eu conheci sendo todo meloso desse jeito
-Eu penso igual, o que será que aconteceu para ele mudar desse jeito? Tomara que o amor tenha mudado o caráter dele também

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