Capítulo 37 - Inês

15 2 0
                                    

Pensei que os dias fossem ser longos, lentos e vazios. Afinal não. Os dias passaram rápido e sempre preenchidos. Pela manhã cedo ia na clínica de fisioterapia. Mariana me acompanhava feliz nas sessões. Como eu estava em casa, ela também não ia na creche.

As terapeutas eram uns amores com a pipoquinha. De brincadeira, faziam com ela os mesmos tratamentos que faziam comigo. Também mergulhavam o pezinho dela no banho de parafina morninha ou nos banhos alternados de água gelada e água quentinha. Mariana dava gritinhos de excitação, muito divertida com as sensações extremas de calor e frio. Delirava extasiada quando a parafina solidificava no pé, formando uma película fina. Ria muito alto com as coceguinhas que faziam quando massageavam o pezinho dela. Minha filhota adorava as sessões de fisioterapia.

Eu nem tanto. A parte do relaxamento era uma delícia mas depois o negócio virava sessão de tortura, quando a sádica da fisioterapeuta botava as mãos assassinas em meu pé. Nunca senti tanta dor na vida. Nem na hora do parto que quis ao natural. Para não gritar nem chorar de dor em frente a Mariana, eu cantava. Cantava, não. Me esganiçava toda desafinada, quando a dor mordia mais intolerável. A pipoquinha pensando que era brincadeira também cantava, se esganiçando alto comigo, para delírio de todo mundo.

Após a fisioterapia íamos sempre tomar sorvete ou comer crepe de chocolate na orla da praia, entre o Leme e o Leblon ou na Barra. Às vezes íamos na Fazendinha Novo Leblon. Mariana adorava dar de comer aos cabritinhos, ficar perto dos patos, galinhas e coelhinhos, matando saudade dos animas da fazenda.

As duas sempre grudadas, desfrutando a companhia uma da outra. Em casa ou na rua. Sozinhas ou acompanhadas. Até mesmo quando eu ficava trabalhando no laptop, terminando meu projeto, Mariana ficava junto. Entretida com joguinhos no tablet ou adormecida a meu lado, no sofá.

Tinha sempre alguém nos visitando. Beatriz e Camila, quase todos os dias. Marina e os filhos também vieram passar algumas tardes com a gente. Pedrinho, o filhote mais velho de Marina adorava nos visitar. O que ele adorava mesmo era brincar na piscina, assistir os desenhos animados na televisão gigantesca. Camila adorava a companhia deles. Apaixonada pelo lindo garotinho loiro, encantada com o bebezinho. Mal chegava cá em casa, perguntava logo por eles. Ficava tristinha quando eles não vinham. Mas logo se animava com a pipoquinha.

De quando em vez, meu irmão Thiago vinha almoçar com a gente, depois das aulas na faculdade. Acabava nos levando até à praia da Barra ou da Reserva. Me carregava nas costas pelo areal fora, onde era difícil para mim usar as muletas, enquanto Sílvia levava Mariana. Alex nos seguindo atrás, feito cão de guarda.

Saía sempre atrelada com um dos seguranças. Normalmente Alex. De motorista eu precisava porque não dava para dirigir com meu pé machucado. Mas ter um cão de guarda me seguindo para todo lado, farejando tudo quanto eu fazia me irritava solenemente. Claro que estavam cumprindo ordens. Mesmo assim eu não perdoava.

Castigava eles. Fazia eles deambular durante horas pelo shopping, carregados de embrulhos, sacolas e sacolinhas de compras. Correndo atrapalhados atrás da pipoquinha sempre irrequieta, enquanto eu provava a roupa toda que existia na loja. Ou quando largava ela no parquinho do shopping e escapulia mesmo debaixo do nariz deles. Ficavam aflitos, querendo correr atrás de mim mas sem poderem deixar a pipoquinha sozinha. Eu ria descarada na cara deles enquanto me afastava, regressando apenas quando eu própria ficava cansada de tédio ou das muletas. Nenhum nunca se queixou mas eu percebia a sua amolação. Deviam tirar à sorte entre eles para ver quem tinha o azar de me acompanhar.

Ora! Fossem refilar com o patrão.

Caminhar de muletas até que era divertido. Me acostumei rápido. Ao fim de dois dias já era uma profissional. Até fazia corridas loucas pela casa, jogando ao pega-pega com a pipoquinha. Subia e descia as escadas na pirisca, para susto de Celeste e Denise que ficavam com o coração na boca, temendo que eu me esbardalhasse e me espatifasse toda.

Quer pagar pra ver? Volume IIOnde histórias criam vida. Descubra agora