Então o impensável aconteceu. Durante a nossa viagem a Lisboa, aquela garota de cabelo curtinho, amiga da noiva do meu irmão, foi brutalmente agredida e estuprada. Um acontecimento horrendo e lamentável que, de um momento para o outro, se tornou numa hecatombe de sofrimento para minha família, em especial para meu irmão David.
A moça acusou injustamente meu irmão de ter pago aos bandidos para a surrarem e estuprarem, ameaçando ela para ficar longe dele e de Diana, desaparecer da vida deles. Uma acusação falsa e absurda, sem sentido. Uma mentira sórdida. Até a polícia percebeu rápido que David era inocente. Só que o mal já estava feito. Diana acreditou na amiga. No final, quem desapareceu foi ela. Simplesmente se eclipsou, desvanecendo-se da face da terra, fugindo de meu irmão como se ele fosse um criminoso perigoso.
David quase enlouqueceu de desespero. Raiva e revolta também. Ela estava grávida, carregando um filho dele. Exasperado, meu irmão quase perdeu o rumo.
Todos nós ficámos abalados, consternados, com um sentimento angustiante de total impotência, sem saber o que fazer, como ajudar. Ninguém entendendo os motivos da moça estar mentindo, acusando meu irmão. Ninguém entendendo os motivos de Diana desaparecer, fugindo daquele jeito.
- Parece história tirada de filme. - Beatriz falou chocada, com uma expressão de assombro na cara.
- Surreal ... - César concordou.
Estávamos todos em casa de meus pais, menos David. Meu irmão provavelmente estava se encharcando em uísque, sozinho em casa. Passámos a noite debatendo os acontecimentos. Todos menos Inês. Estranhamente, ela manteve-se calada o tempo inteiro. Devia estar abalada demais. Ainda não se refizera por completo daquela patifaria rocambolesca do colega. Agora era mais uma sacanagem sacudindo nossas vidas.
- Estou tão preocupada! - minha mãe não conseguiu disfarçar as lágrimas - David está mal. Nunca vi meu filho nesse estado.
A minha mãe estava de rastos, afligida de preocupação com meu irmão, com toda a situação.
- E essa menina? Sozinha por aí! - falou apoquentada - Ela não tem família. Meu Deus, que vai ser dela? E o bebê?
- Quando o dinheiro acabar, talvez apareça ... - foi o comentário cáustico de meu pai, enquanto se servia de outro uísque, todo tenso, o corpo todo rígido.
Senti a revolta e raiva de meu pai, tenso de preocupação ao ver o estado de aflição de minha mãe. Eu também me sentia furioso, vendo a apoquentação e desalento de todo mundo, o sofrimento e aflição da minha mãe, o tormento de meu irmão. A sensação de impotência me sufocando.
- Não entendo o que deu nessa menina ... - ouvi Beatriz suspirar, num desabafo desanimado - Desaparecer assim?
Ninguém entendia.
- Eu entendo Diana. - Inês finalmente se manifestou, mal entrámos no carro, de regresso a casa.
Olhei perplexo para ela. Raivoso.
- Concorda com o que ela está fazendo com meu irmão?
- Não falei que concordo. - olhou-me de relance, afastando da cara uma madeixa de cabelo rebelde - Falei que entendo.
- Entende?!
Pois eu não conseguia entender tamanha cobardia. Ir embora sem uma palavra, como uma fugitiva se escondendo e se protegendo de um mafioso. Punindo meu irmão por um crime que ele não cometeu, sem dar uma oportunidade a ele para se defender. Desaparecendo grávida dele? Foda-se! Que porra entendia Inês que eu não conseguia enxergar?
- David foi violento com ela. - justificou com cautela - Bateu nela. Acho normal Diana acreditar na acusação da amiga.
- Ela perdoou ele! - redargui azedo - Aceitou casar com meu irmão, porra! Aceita casar e não tem confiança nele? Como é que pode?
- Ela pode ter perdoado mas ... está na cara que não esqueceu o que aconteceu. - fitou-me de novo, os dedos enrolando nervosos a mesma madeixa de cabelo - Agora com esta acusação de Nanda, deve estar pensando o pior de seu irmão.
- Mesmo assim, o que ela está fazendo é imperdoável!
- David também tem culpa.
- Meu irmão tem culpa?! - questionei zangado, não acreditando no que escutava - Você acredita mesmo nessa merda que ele mandou surrar essa Nanda?
- Não! Claro que não! - exclamou veemente - Diana também não acreditaria nessa mentira se seu irmão não tivesse batido nela, não entende?
- Não! Não entendo! - declarei exaltado - Não entendo como uma mulher pode fazer uma sacanagem dessas a um homem!
- Ela deve estar com medo de David.
- Medo?!
- É ... que outro motivo tinha para desaparecer?
- Ela carrega o filho dele na barriga! - me indignei - Com medo ou sem medo, tinha que estar aqui! Não confia mais nele? Tudo bem. Bastava romper com ele. Desistir do casamento. Agora, ela não tem o direito de desaparecer. Negar a ele o direito de conhecer o filho.
- Neste momento, ela pensa que seu irmão é um homem perigoso. Acredita que ao ficar longe está se protegendo a ela e ao bebê dela.
- Não fala merda! - bradei revoltado.
- Ah! ... Esquece! - redarguiu baixinho - Não vale a pena continuar conversando.
- Não vale a pena mesmo! - concordei furioso - Se é pra falar merda mais vale ficar de bico fechado!
Não falámos mais uma palavra até casa. Não falámos mais uma palavra durante a noite. Nessa noite, adormecemos de costas viradas um para o outro. Afastados, cada um numa ponta da cama.
Foi a nossa primeira briga de silêncio.
Inês ficou magoada comigo. Ofendida com minhas palavras.
Eu me senti profundamente traído com sua atitude, sua tentativa de desculpar o que era indesculpável. O que estava acontecendo com meu irmão era uma injustiça sem explicação. Como Inês podia tentar justificar o injustificável?
Eu até entendia que a garota pudesse estar duvidando de meu irmão, com medo dele. Querendo desistir do casamento. Mas fugir? Grávida dele?
Caralho! Isso eu não ia entender nunca.
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Quer pagar pra ver? Volume II
Chick-LitPara Inês, descobrir que Simão sempre a amou é um sonho tornado realidade. Para Simão, descobrir quem anda assediando Inês com as mensagens anônimas torna-se a grande prioridade. A verdade é desvendada e eles finalmente podem viver em paz. Mas nem t...