Marcelo

1.8K 222 342
                                    


Rafaella estava com um péssimo pressentimento no início da semana. O cuidado com os filhos estava redobrado. Não deixou Lua sair em nenhum dia, e cuidou de todos os passos de Anthony. Por conta do gesso, o garoto estava cada vez mais incomodado, e com o incômodo veio as artes feitas pelo filho.

Normalmente, Lua conseguia ocupar o irmão com sessões de filmes e jogos que não precisassem das duas mãos. Mas o que deixou a família em choque foi quando o pequeno pegou um lápis e fez todo o dever de casa com a mão não dominante. Anthony era ambidestro e ninguém fazia ideia. Aquilo deixou Bianca incrédula, teve que se segurar para não soltar um comentário típico sobre a futura profissão do filho.

Até Rafaella estava esperando por um dos comentários idiotas da morena, mas ele não veio. Se dissesse que não estava surpresa com aquela atitude da mulher, Rafaella estaria mentindo. Mas somente aquilo não era o suficiente.

— Eu sinto falta de ter que fazer esse tipo de dever de casa. Eu odeio física mecânica. É um saco.

Bianca riu do comentário da filha. Também odiava exatas na época da escola, mas não tinha muito para onde correr porque precisava ir bem em todas as matérias.

— Eu também sinto falta de você fazer esse tipo de dever de casa. Ao menos eu conseguia te ajudar igual eu ajudo o seu irmão.

— A mamãe tem me ajudado com alguns cálculos. A mulher é uma calculadora científica. É até lindo de se ver.

— Mamãe, quando eu tirar o gesso, você me leva na piscina da vovó?

— Levo, claro que levo. O que você quiser, meu amor.

— Olha, mãe! Eles estão falando da contratação do Marcelo.

Os olhos castanhos antes focados no filho fazendo o dever de casa, foram para a grande TV da sala onde passava um programa esportivo qualquer. Era sábado à tarde, Bianca estava na casa da ex-mulher na companhia dos filhos em mais uma das incontáveis visitas que estava fazendo. Rafaella estava na cozinha preparando alguma coisa para os filhos comerem enquanto Bianca ficava de olho em Anthony.

— Esse cara é uma piada! Saiu do Brasil lá em 2007 e foi pra Europa jogar em time gringo. Agora que ninguém quer contratar ele porque tá velho, o Flamengo faz uma palhaçada dessas.

— Eu gosto dele.

Lua deu de ombros buscando o celular para fazer uma pesquisa. Gostava de conversar com Bianca sobre o time do coração, e discordar da opinião da morena sempre que divergia da sua. A verdade era que a adolescente tinha muito mais conhecimento de futebol do que a mãe, por conta das diversas conversas que tivera com o avô materno.

Ver Bianca ser contrariada era um dos seus hobbies favoritos.

— Eu também gosto. Só acho que ele devia se aposentar logo. O cara é mais velho que eu, rico pra uma porra porque passou anos jogando no Oriente Médio. O que mais ele quer? Tá vindo pro Flamengo pra fazer graça.

— Olha aqui o que ele postou no Insta. Ele é carioca, mãe, tá voltando porque sentiu falta de casa.

— Depois de esnobar o país por quase quinze anos, é fácil dizer isso. Engraçado, ele tem um rosto familiar, né? — Lua encarou a foto que mostrava a mãe, tentando achar alguma coisa que lembrasse alguém, mas só deu de ombros — Vamos ver se o Ceni aproveita ele.

— O Ceni é um imbecil.

— Quem não acha isso é só a família dele mesmo, porque o resto do mundo...

A conversa entre as duas rendeu alguns comentários divergentes, mas antes que a discussão evoluísse para uma briga calorosa, Rafaella entrou na sala com um copo de água na mão derrubando-o sobre o chão assim que viu a imagem do homem com a camisa do time em uma coletiva. O barulho do objeto se quebrando em mil pedaços chamou a atenção dos três que encararam a loira pálida e parada no mesmo lugar.

A escolha de Andrade - RabiaOnde histórias criam vida. Descubra agora