Vinte e nove

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Pela visão de Temrys:

Eu estava estirado na floresta quando meu coração tremeu. Não uma tremida normal, que acontece quando você corre ou coisa parecida. Uma tremida mágica. Eu sabia que não poderia ter deixado Dianna avançar sozinha mas... meus olhos caíram sobre minha coxa, onde um buraco fazia sangue jorrar sem parar. A terra estava manchada de azul, minha magia não era o suficiente para me curar. E quem quer que fosse o responsável por aquilo, não fez questão de seguir a caça. Depois de alguns minutos inquieto mesmo com a ferida, a magia dentro de mim estremeceu. Eu sabia que Dianna estava em perigo, e precisava sair dali. Estiquei um dedo na direção da barreira, mas seja lá quanta magia Danna tinha colocado, era o suficiente para me manter longe. Tudo bem. Encarei a terra debaixo de mim, e decidi que mesmo com uma enorme ferida aberta, teria que ir por baixo. Afinal, manipular matéria tinha que ter suas vantagens.

Com meu poder, afastei o barro das minhas narinas conforme conduzia a terra, para que me engolisse e transportasse até a cidade. Mais rápido do que eu estava acostumado, porque a ferida ardia demais para eu conseguir manter aquilo por muito tempo. Eu sentia ela se aproximando, ou melhor, eu me aproximando dela. Nossas magias já se cumprimentavam em silêncio quando eu comecei a emergir da terra. Para cima, e para cima até que... meu rosto saiu completamente. Meus olhos ardiam. Tive que piscar várias vezes para me acostumar com a claridade. E então... eu estava bem diante dela quando aconteceu.

Não deu tempo de registrar tudo ao mesmo tempo, foi rápido demais. Só me lembro da mão de Mullian estendida na direção de Dianna, seu rosto tomado pelo pavor, Kelly completamente pálida... então agi. Não sei de onde tirei força e velocidade, só sei que quando dei por mim, tinha empurrado Danna para longe, de forma que o que quer que Mullian tivesse planejado para ela... me atingiu. Forte e brutal, sua magia se encontrou com minhas costas e braço, arrancando um urro profundo de dor. Era fogo.

— Temrys!

Darknid correu em minha direção, mas eu ignorei para ver onde Dianna estava. Estirada no chão com olhos fechados, sua mãe acima dela tentando a acordar. O rei me envolveu com sua magia, me fazendo acordar do transe.

— Só posso curar um dos dois. Precisa de muito repouso, se eu curar as duas feridas você vai desmaiar.

Encarei a coxa perfurada, e depois o braço carbonizado. Não dava pra continuar sangrando.

— Cure a coxa.

Eu desmaiaria de qualquer forma se ele não a curasse. Com uma rapidez de um verdadeiro rei, Darknid fechou minha ferida e me ajudou a levantar. Encaramos o trio em nossa frente, Kamine agora lutava contra o próprio filho. Ele tentava em vão afastá-la sem machucar. Mas estavam mortos, e a única coisa que nos impedia de vencer, era o amor profundo que todos sentiam por eles.

Era isso.

Me virei para Darknid, tão atônito que ele mesmo sentiu o peso do que estava por vir.

— Laenia e Laerte querem nos punir por sermos amados apesar de tudo. Essa é a punição. Nunca vamos acabar com isso a não ser que a família deles resolva deixar isso de lado.

Porque Kelly, Velorn, Kennan, Kushter e Dianna, eram membros da mesma família dos mortos em questão. E ao mesmo tempo... os únicos poderosos o suficiente para retalhar com fogo total. Precisava ser eles. Não pelo poder em si, mas pelo sentimento.

— Na floresta, quando Diannaa começou a matar os mortos... — Darknid começou.

— Eles começaram a fugir.

— Podem sentir medo. — Kushter surgiu atrás de mim, quase me matando de susto no meio daquilo tudo. — Precisamos acordar Dianna, ela é a única que poderia acabar com tudo.

Não eram os pais dela ali. E apesar de entender a dor da mãe, não podia sentir profundamente como ela. Precisávamos de Dianna.

Me ajoelhei ao lado de onde Kelly a segurava em seus braços, seu rosto manchado pelo sangue que saía por trás da cabeça. Havia uma solução, mas provavelmente custaria muito. Ergui os olhos para minha melhor amiga, aquela pela qual eu quase dei toda a minha energia vital, só para diminuir sua dor.

— Kelly... preciso que mantenha o foco dela quando acordar. — Os olhos dela se estreitaram. — Eu não estarei aqui. Mas diga que ela pode me acordar, se derrotar os três. Eu acredito nela.

O que eu estava prestes a fazer, era algo que se contava em contos e lendas antigas. Uma coisa tão mortal, que apesar do poder absurdo ninguém ousava tentar. Entrelacei meus dedos nos dedos de Dianna, depois de retirar as luvas de suas mãos. E ali eu tentaria, algo jamais visto por nenhum deles ali. Mesmo com os séculos de vida de Darknid, a extrema experiência de Velorn que se aproximava, e os conhecimentos de Enolan... era algo arriscado. E provavelmente eu pagaria o preço. Mas Dianna precisava acordar.

Fechei os olhos para me concentrar, tão profundamente que nada mais existia. Meus ouvidos só escutavam sua respiração fraca, minhas mãos só sentiam ela e mais nada. Limpei a mente e liberei poder, em um impulso mágico para entrar nela. Ondas de energia, cargas que acordariam a sua. Como imaginei, a magia dela respondeu depois da terceira carga, com uma fraca onda. Meu coração tremulou. O que quer que Mullian tivesse feito a ela, assustou sua magia. Ela se recolheu tão para dentro de si, que não conseguia voltar. Então eu teria que puxa-la.

Danna.

Tentei me concentrar em enviar a voz para dentro de sua mente.

Preciso que acorde. Faça o que fez desde que despertou seu poder, mostre a todos como não pode ser derrotada.

Aquilo despertou alguma coisa nela. Quando dei o próximo impulso com minha magia, ela pareceu querer tentar. Por mais difícil que fosse, usei toda a conexão de nossos laços, o feito pela natureza e o forjado por nós mesmos. Todas as memórias que tivemos juntos passaram por nossas mentes, o motivo de eu amar aquela garota. Nem mesmo a magia mais profunda seria capaz de nos separar, nem que eu tivesse que forjar mil laços através do fogo por ela.

Eu estou aqui pra você. Estou e sempre vou estar, agora se levante, e mostre para esses cadáveres sobre quem é essa história.

Mais um impulso, e estávamos mais conectados do que eu pensei que fosse possível. Nossas mentes e almas se entrelaçavam, eu sentia ela. Empurrei minha magia mais fundo, até que não me restasse quase nada e então... puxei. E ela veio. Emergindo das sombras como a mulher vitoriosa que sempre foi, Dianna abriu os olhos logo depois de mim. Nosso olhar caiu sobre nossas mãos unidas e vimos... estávamos brilhando.

— Vou mostrar a eles.

Aquela frase poderia ser o suficiente para me destruir.

Magia proibidaOnde histórias criam vida. Descubra agora