XVIII - A PRESENÇA

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Dois garotos corriam pelo pasto, um segurando um pedaço de madeira lixada usada para construções, e o outro carregava uma pedra, do tamanho do seu punho. Pareciam serem filhos ou netos dos trabalhadores daquele campo. A vila não era muito longe dali.

As crianças olhavam com atenção para o chão, abrindo o capim e verificando por trás de cada rocha e buraco. Estavam em busca de algo.

— Ele devia estar por aqui — disse um dos meninos.

— Estou ouvindo o miado dele. Aquele ladrãozinho ainda está vivo! — o outro garoto exaltou, não deixando transparecer a raiva.

— Eu vou matar ele direito dessa vez!

O outro sorriu.

— Não! Eu vou! Meu pai disse que se eu conseguisse iria deixar eu comer bolo essa noite!

— Você é patético!

Um garoto empurrou o outro e continuavam a discutir quem iria terminar o trabalho de assassinar o pobre animal.

Haiko ainda estava atordoado, sentado no chão com as pernas dobradas enquanto Berilo dormia em seu colo, ronronando. Ele acariciava a orelha do animal e tentava descansar um pouco a sua mente dos últimos acontecimentos. Meditava, queria ter certeza que a visita de seu pai não foi exatamente um sonho, que não havia sido uma alucinação. Isso mexia com ele, pois, se realmente aquele gato fosse Luciano Antunes, então... o feiticeiro estaria bem vivo e escondido em algum lugar entre os planos.

Algumas vozes o despertaram de seus devaneios. Ele abriu os olhos imediatamente.

Ele pensou em sumir dali e ir para um lugar mais calmo, tudo o que menos queria era deparar com humanos no restante do seu dia, porém, a conversação estava nítida aos seus ouvidos e por mais que quisesse ignorar, um pico de ódio invadiu a sua mente.

Berilo havia sobrevivido graças ao seu poder, se não fosse isso, o pobre felino estaria morto. E pelo visto, os responsáveis por todo aquele sofrimento eram duas crianças aliciadas por seus pais.

O semideus estava furioso, tanto pela visita de seu pai, tanto pela lembrança deplorável que o antigo feiticeiro lhe trazia quanto pela atrocidade que aquelas crianças fizeram ao pobre gato e ainda insistiam em concluir.

Aquele mundo estava podre, como ele sempre deduziu desde a matança dos elfos. Nada havia mudado no decorrer dos anos. A inocência era lavada com sangue, autoridades cruzavam os braços e em busca de poder e glória manchavam suas bandeiras com desonestidades. Os deuses? Karen? Ela Estava mais preocupada em caçar feiticeiros do que organizar os mundos que governava.

Haiko se pós de pé, se revelando às crianças. O seu semblante, pele e cabelos alvos, roupas brancas, se estacava ao entardecer. Ele seguia em passo lentos, segurando contra o peito o gato que salvara. O elfo olhava para as crianças que agora estava paralisada pelo medo. Mas que medo? Não era um elfo que eles viam, era uma imagem apavorante. A face demoníaca que ele mostrava, a face do ódio que ele transparecia ser.

Antunes estava enganado, Haiko não poderia ter compaixão pela humanidade. Eles, a humanidade, não mereciam isso. Ninguém era inocente, ninguém merecia viver. Ele nunca mais deixaria sentimentos bobos lhe confundirem. Seria uma promessa.

As crianças tentavam correr, fugir daquela criatura pálida que se aproximava. Porém, estavam inertes. Não conseguiam mover um dedo sequer, apenas as lágrimas caíam dos olhos involuntariamente que tremiam, que fitavam um demônio branco.

Haiko chegou perto o suficiente para olhar bem aquelas caras chorosas. O medo estava estampado.

— Então vocês querem viver?

Legend - O Mago Infernal (Livro 3)Onde histórias criam vida. Descubra agora