XXIV - A REVELAÇÃO

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Náidius olhava da janela do seu vagão as águas correntes de um rio. O trem passava por uma ponte ao entardecer. O sol poente sumia no horizonte de onde as águas fluíam, refletindo as nuvens rosadas da alvorada. O jovem se sentia atravessando o oceano pela largura do rio, nunca viu tanta água doce em sua vida. As margens eram dominadas por uma floresta verde fechada, onde a brisa que tocava a sua face lhe trazia um frescor.

Seu grupo e ele já tinham deixado Itakiã há algumas horas. Seguiam em viagem rumo à Gnowa, na esperança de encontrar uma embarcação para Ufazar. Infelizmente, Náidius contou com a ajuda de Sônia para pagar sua passagem de trem, já que ele não tinha o suficiente. Inarê também pagou caro, já que precisaria transportar a sua égua em um vagão próprio destinado a cavalos.

O elfo escondia as suas orelhas com um lenço. Havia muitas pessoas no vagão e geralmente um elfo em ambientes fechados e lotados era alvo de comentários e olhares. Náidius estava ao seu lado, tentando não prestar atenção em Sônia em sua frente. A maga estava em silêncio desde Itakiã, já nem conversava mais com ele e o ignorava quando lhe perguntava algo. Ela pagou a sua passagem sem ao menos lhe perguntar se ele aceitaria. Afinal, ele precisaria aceitar.

Náidius era muito imaturo para perceber o real valor do dinheiro. Ele estava em uma viagem longa, deveria saber que se poupasse todas as suas moedas, poderia pagar uma viagem de trem ao menos. Se estivesse sozinho na viagem, talvez, nem mesmo estaria vivo. Não saberia nem mesmo chegar nessas cidades, mesmo se guiando com o mapa de Sônia.

O barulho da locomotiva era abafado pelas conversas paralelas dos outros viajantes. Sônia segurava o vaso de sua planta com mais firmeza, olhava para sana com certa emoção, já que no broto havia crescido um par de folhas compridas como lâminas afiadas de um verde claro, meio amarelado.

— Está crescendo — Inarê falou, ao lado dela.

— Sim — ela assentiu, sorridente. — Mal vejo a hora de levar para casa. Quero plantar no túmulo de minha mãe.

— É uma linda homenagem. Eu gosto dessa filosofia. Os meus antepassados eram enterrados em um jardim. Sempre escolhíamos uma planta, qualquer uma de longa vida e plantávamos no túmulo. É uma forma da vida sempre se prevalecer. Ainda sigo essa tradição.

— Eu acho lindo. Havia lido sobre e isso me inspirou. — ela suspirou. — É um absurdo o desprezo que a humanidade construiu a respeito dos elfos. Nunca entendi a tamanha descriminação.

— Nem tente entender. Foi algo que aconteceu há muito tempo, e mesmo que soubéssemos os motivos das guerras entre os dois povos, nada nunca justificaria essa repreensão.

— E é isso que me fatiga. — ela franziu as sobrancelhas. — Depois de tanto tempo, vocês mais mereceriam respeito e não ser tratados dessa forma.

— Por sorte, nós sobreviventes, não tivemos o mesmo destino de nossos pais.

Sônia olhou para o seu vaso. O passado dos elfos e o presente era algo que lhe entristecia de certa maneira. Apesar de que não havia sido o seu povo que quase extinguiu toda aquela raça, mesmo assim lhe fazia se sentir mal. Os coimbranos passou os últimos tempos vivendo reclusos em um lugar escondido. De todo modo ela até entendia isso. Aquele lado do mundo era muito cruel para aceitar o que era diferente para ele. O seu avô sempre lhe dizia que os mundanos — assim era tratado os que viviam fora da barreira — eram gananciosos demais para sentirem compaixão e amor ao próximo. A humanidade élfica pagou caro por serem quem são e ainda pagam por isso.

Por outro lado, a maga nunca concordou que os coimbranos, principalmente os magos Cosmos fossem diferentes dos mundanos. O seu pai era narcisista e autoritário, assim como todos os líderes passados. Se algum coimbrano saíssem sem permissão da barreira, seria preso, se fugisse, seria morto. Se algum mundano invadisse a terra dos magos, seria morto sem julgamento.

Legend - O Mago Infernal (Livro 3)Onde histórias criam vida. Descubra agora