Erradores - pensando nossa condição

Confiança

Cheguei ao salão e, após contar meus desejos e expectativas, a cabeleireira perguntou:

- Você confia em mim?

Eu nunca a tinha visto, não tinha nenhuma referência, mas diante de tanta autoconfiança eu instintivamente disse:

- Confio.

Ela virou a cadeira de costas para o espelho e fez o que bem quis, e eu sequer tinha noção do que estava acontecendo em mim; só via tufos de cabelo caindo para todo lado. Até brinquei durante o processo:

- Se isso não é confiança eu não sei mais o que é.

Somente ao final ela me deu um espelho e eu pude ver o resultado. E não é que ela sabia o que estava fazendo? Gostei! Ah, se fôssemos assim com o Autor da Vida! Ele pergunta:

- Você confia em mim?

Eu já lutei muito com Deus. Questionei, esbravejei, quase blasfemei, até notar que Ele não estava brigando de volta; estava pacientemente me vendo fazer birra no chão do supermercado. Eu era um bebê que mal começara a engatinhar, achando que entendia de física quântica avançada e vomitando isso em minhas orações.

Porém minha carne não para de lutar contra o meu espírito. Quando ela vence, eu não faço o que ele quer. Quando ele vence, eu não faço o que ela quer. Sempre haverá uma parte de mim frustrada. Só me resta escolher qual e pagar o preço. Quem ama a Deus e a Ele é sensível, percebe quando O entristece e se arrepende, se envergonha, se constrange. Trata-se de uma relação não baseada em medo, mas em amor. Ainda que não houvesse céu para ir, nem inferno para fugir, a comunhão se manteria porque Ele é impressionante, apaixonante, amigo, santo, e Sua companhia faz a vida muito melhor. Mesmo sem vantagens humanas, recompensas ou milagres, ainda que nenhuma oração fosse respondida, Sua presença continuaria sendo o melhor lugar, não só para visitar, mas para permanecer, para morar.

Quando não é vontade de Deus eu fico no quase, por pouco, na trave, segundo lugar. Inúmeras vezes chego pertíssimo, mas não alcanço, não é meu. Mas quando Deus quer eu posso ser a última, esquecida, rejeitada e escondida e Ele chama, concede, faz até o improvável ou impossível. Essa dinâmica já aconteceu tantas vezes que eu seria louca se não reconhecesse o padrão. Basicamente, a vontade de Deus prevalece e controla a minha vida. E glórias a Ele por isso, porque mesmo quando me entristeço ou me revolto, sei que ela é boa, agradável e perfeita.

Quando a gente entende o que Deus sempre soube, que a raça humana é toda corrompida e falha, a gente começa a não se surpreender com os pecados alheios e os nossos, e passa a perdoar mais fácil a nós mesmos e aos outros. Mas só, e somente só, quando a gente compreende de verdade, do fundo do coração, que somos todos iguais e estamos juntos no mesmíssimo barco da natureza carnal humana.

Imagine nossa alma como um salão onde músicas ou outros sons são tocados. Quando encontramos pessoas, por vezes podemos ouvir o que ecoa naquele ser, e nem sempre é algo bom. Esse ruído, por vezes tão terrível, que incomoda só por respingar um pouco em nós, toma conta daquele espírito 24h por dia e o mantém cativo na escuridão e na dor. Há vários tipos de trevas no mundo, fora e dentro de nós. É muito fácil ser atraído e engolido por elas, difícil de sair e frequentemente comum voltar. Já a luz é algo a ser caçado como um tesouro, conquistado diariamente e mantido com muito esforço. Então tenha paciência com quem nem se dá conta de estar na escuridão, em conflitos existenciais ou carente de confiança no Criador.