Ver Thiago se referir a Bernardo usando a palavra aleijado me transformou em uma fera. Eu queria ter virado aquela mesa em cima dele, mas não fiz isso porque arrumar confusões é outra coisa incompatível com a minha nova versão. Minha tentativa de me distrair um pouco essa noite foi um desastre. Apenas me estressei e voltei para casa um pouco bêbada. Por ter chegado antes do planejado, acabei tendo que encarar minha mãe e Hélio novamente, mas só por alguns minutos, já que fiz meu prato e trouxe a comida para o quarto, onde planejo ter pelo menos um pouco de paz na minha solidão. Mas digamos que paz e solidão não se encaixam bem na mesma frase. A solidão faz as vozes dos nossos problemas ficarem audíveis, em um volume que impossibilita que a paz se faça presente.
Nessas horas eu começo a me perguntar por qual razão não foi Betina que veio atrás de mim, principalmente porque todos à mesa viram que Thiago falou uma série de merdas e que estava prestes a falar mais se eu continuasse dentro do bar. Provavelmente ela tem o mesmo pensamento que Thiago e não achou aquela cena ridícula o suficiente para me dar um apoio. Que amizades são essas? O único que pareceu realmente chocado com o que Thiago disse, foi Victor, mas tudo bem ele não ter vindo atrás, pois não temos tanta intimidade para isso. De repente, me sinto um pouco enjoada pelo do ciclo de amizades. Não sinto mais que eu faço parte dele. Aliás, sinto que não faço mais parte dessa família, dessa casa, dessa cidade. Sinto que não faço parte de mais nada.
— Diandra! — ouço a voz da minha mãe me chamando enquanto ela bate à porta. Me ajeito na cama e esfrego os olhos na tentativa de melhorar minha aparência. — Diandra! Eu sei que você tá acordada.
Eu sei que ela tem perguntas para me fazer. O problema é que eu pensei que teria a noite toda para planejar o que contar ou quais palavras usar para explicar que eu não quero dividir com ela o que aconteceu.
— Tô indo — aviso.
Me levanto e abro a porta evitando contato visual com ela. Encará-la é um sacrifício, mas por mais que eu queira, não posso fugir disso.
— Me fala tudo — pede ela. — Quero saber cada detalhe dos últimos dias.
Não sei bem se é porque eu já estou muito irritada, ou se é pelo álcool que ainda não evaporou, mas a forma com que ela me faz essas perguntas só faz meu sangue esquentar ainda mais.
— Você não tem o direito de querer saber.
A expressão dela muda. Ela franze o cenho e se mostra surpresa com o que eu disse. Talvez eu tenha sido rude demais, mas não consigo aceitar a intromissão dela. Não desse jeito.
— Mas eu sou sua mãe. É claro que eu tenho o direito de querer saber. — nada muda com esse argumento absurdo. — Não prometemos contar tudo uma pra outra?
— Eu era uma criança quando a gente fez essa promessa ridícula, que inclusive você foi a primeira a quebrar quando trouxe Hélio pra cá!
— Shhhh! Ele tá na sala e vai ouvir você falar assim dele. — ligeiramente, meu corpo começa a formigar. Segundos depois estou tremendo. Minhas mãos suam. Meu coração dispara. O oxigênio começa a faltar. — Diandra! — A voz dela está distante. Tudo o que consigo sentir é que algo está entalado na minha garganta. Estranhamente, meu quarto começa a girar. Já não ouço a voz da minha mãe com tanta clareza. O que ouço agora são passos pesados se aproximando da porta.
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Entre erros e acertos
ChickLitSer mandada embora de um emprego meia boca em um dia e começar a trabalhar em um novo local no outro, vai virar a vida de Diandra Mello do avesso. Aos vinte e cinco anos, ela vai enfrentar inúmeros obstáculos tendo Vallentina e Maurício Galzerano co...