XVIII

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O dia da visita à casa dos Martins chegou. Clara estava empolgadíssima em poder rever a amiga. Analice e Clara se davam tão bem que pareciam se conhecer há anos. Analice dizia que era um encontro de almas. Carlos estava tão feliz com a gravidez da esposa que não falava em outra coisa a não ser do herdeiro. 

- Patrão? - uma mulher negra, trabalhadora da fazenda adentrou na sala. Carlos também não possuía escravos.

- Diga, Sebastiana.

- O sinhô tem visita. - Carlos franziu o cenho, não estava esperando ninguém. - Ele disse que se chama sinhô Abdias Macêdo.

Carlos revirou os olhos, mas mandou a empregada conduzir a visita indesejada à sala de visitas. Gabriel percebeu o desagrado do amigo.

- Quem é Abdias Macêdo?

- Um escravocrata irritante. Ele é de Santos, mas está aqui em São Paulo tentando arrebanhar fazendeiros para a sua causa.

- Contra a abolição suponho. - Carlos assentiu. - Você o conhece?

- Pessoalmente não, mas meu pai já me falou a respeito. Com certeza sua fazenda será a próxima parada. - ele se levantou. - Vamos até a sala ver o que esse senhor quer.

Gabriel também se levantou e os dois amigos saíram do gabinete de Carlos e seguiram para a sala de visitas. Abdias de Macêdo se encontrava de pé à espera do dono da casa.

- Senhor Macêdo. - cumprimentou Carlos. - Eu sou Carlos Martins. - estendeu a mão e o homem cumprimentou de volta.

- Muito prazer, senhor Martins. Desculpe aparecer sem aviso prévio ou convite.

- Não se incomode, senhor Macêdo. - disse, simpático. - Esse é meu amigo Gabriel Braga. - Gabriel acenou com um leve movimento de cabeça.

- Mas vejam como sou sortudo. - riu ele. - Sua fazenda era a minha próxima parada, senhor Braga.

- Por favor, sente-se, senhor Macêdo. - o homem fez e Carlos também. Gabriel preferiu ficar em pé. - A que devo a honra da sua visita? 

- Gosto de pessoas que vão direto ao ponto, senhor Martins. - sorriu, mas Carlos permaneceu sério. - Como os senhores bem sabem, há cinco anos foi promulgada essa lei do ventre livre. - riu sem de maneira irônica. - Como pode uma princesa assinar uma lei considerando livre todos os filhos de mulheres escravas nascidos a partir da data do decreto? - Carlos assentiu e olhou para o amigo, depois voltou-se para Abdias. - Se nós, donos de terras e de escravos, não dermos um basta, essa princesa abolicionista vai libertar todos os escravos desse país. Essa maldita lei foi só o início, acreditem no que estou falando. - ira contida  sobrepujava todo o seu ser. - E há um delegadinho em Santos que simplesmente se recusa em perseguir e prender escravos  fugidos das nossas fazendas e, mais grave ainda, o fato de brancos, aristocratas como nós, esconderem alguns deles debaixo de seu próprio teto. 

- Entendo, pelo seu tom, que o senhor é contra tudo isso. - afirmou Carlos.

- Pois claro que sim. Por isso estou pedindo ajuda dos fazendeiros de São Paulo. Não podemos permitir que nossas posses sejam libertas. Isso não é justo. Pagamos por escravos e agora querem que fiquemos no prejuízo. Vocês conhecem os Cintra, não? 

Era uma vez... a Bela que Salvou a Fera (em FINALIZADO)Onde histórias criam vida. Descubra agora