• Capítulo 30 - Reta Final.

238 22 8
                                    

Kah on·
Acordei suando frio depois de um pesadelo e embora não conseguisse me lembrar dele com clareza sei que envolvia Ruggero e Candelária nus. Foi tão perturbador que não consegui voltar a dormir.
Os poucos carros que passavam pela rua projetavam lampejos de luz no quarto escuro onde eu era dominada pelo mesmo sentimento horrível de dúvida que me causava insônia quase todas as noites desde o fiasco com Ruggero e Marco.
Eu fiz a coisa certa?
E se ele não ficasse com Candelária?
E se tivesse sido tudo em vão?
Esses pensamentos giravam em minha cabeça e eu também sempre me perguntava onde ele estava e o que estava fazendo, mais especificamente se estava fazendo com ela. Ruggero tinha ido embora muito ferido e não me surpreenderia nem um pouco se Candelária tirasse proveito da situação assim que soubesse o que havia acontecido.
As últimas palavras dele continuavam me assombrando.
Olha para mim.
Sentia o peito apertado. Ou eu era a mulher mais egoísta da Terra ou a mais burra. De qualquer maneira a dor de perder Ruggero não cedia. Acho que nunca deixaria de chorar por ele, mas algum dia isso perderia a força? Até agora o tempo não havia ajudado. Se estava ou não afogando as mágoas com alguém Ruggero estava por aí em algum lugar arrasado, ele realmente me amava. De algum jeito tinha certeza de que ele ainda me amava mesmo decepcionado comigo. O amor que chega para ficar não desaparece tão depressa. Sentia que o nosso teria resistido ao teste do tempo se eu não tivesse posto um fim em tudo.
Quando o primeiro raio de sol entrou no quarto peguei o telefone. Lina sempre acordava muito cedo. Precisando sempre me assegurar de que havia tomado a decisão certa liguei para ela na primeira oportunidade que tive e ela atendeu.
Lina: não dormiu de novo?
Kah: eu sei, alguma coisa tem que acontecer. Estou péssima e não tenho energia nem para pintar as pontas do cabelo de vermelho.
Lina: bom, é assim que eu sei que a coisa é séria.
Kah: é sério, não é? Meu mundo virou de cabeça para baixo e continuo com o mesmo azul.
Lina: olha só Rainbow Brite, conversei com Agus ontem à noite e ele também acha que a gente precisa sair daqui.
Kah: você e Agus?- entrei em pânico- Não podem me deixar sozinha agora!
Lina: não... você e eu! Tipo uma viagem de amigas. Você precisa sair da cidade, tudo aqui lembra Ruggero.
Kah: para onde vamos?
Lina: bom, como você não tem mais um namorado bilionário é claro que vamos pensar no custo, mas acho que tenho a solução perfeita para isso.
Kah: ok...
Lina: já contei que meu irmão Abe trabalha na Japanimation? Ele agora está no Japão na verdade- grogue fui à cozinha fazer café e bocejei.
Kah: quer ir para o Japão?
Lina: não. Abe tem um apartamento perto da praia na Califórnia, Hermosa Beach e está vazio. Podemos ficar lá de graça. Olhei o preço das passagens ontem à noite e está razoável, mais ou menos trezentos dólares, o que acha?- qualquer coisa seria melhor que permanecer em Nova York e não conseguia lembrar a última vez que tirei férias. A decisão era fácil.
Kah: sabe de uma coisa? Sim, vamos nessa. Vamos para a Califórnia.
·
·
·
Kah on·
Cresci no Brooklyn e sempre sonhei em conhecer a Califórnia, um cenário glorificado em muitas séries que eu via na adolescência. Embora eu fosse o oposto do estereótipo da garota californiana queria ver o Oceano Pacífico e sentir o clima mais livre que sempre associei à Costa Leste e sempre me pareceu o polo aposto ao Brooklyn.
O apartamento de Abe, irmão de Lina ficava na praia. Sentada na areia e ouvindo o barulho das ondas eu não parava de pensar em Ruggero. Minha amiga estava dormindo em casa e eu aproveitava o tempo sozinha para apreciar a praia vazia antes que lotasse.
Olhei para o lado, para as únicas outras duas pessoas ali. Uma mulher e uma menininha sentadas lado a lado com as pernas cruzadas, uma posição que eu reconhecia da única aula de ioga que tinha feito.
Elas estavam de olhos fechados, inspirando e expirando e ouvindo os sons do mar. Desesperada para acalmar a mente fiz uma coisa que normalmente jamais faria. Eu me aproximei delas e perguntei:

Kah: posso participar?
Xx: é claro.- respondeu a mulher- Mas estamos quase acabando a meditação do aquecimento. Senta na areia e faz o que estamos fazendo- fechei os olhos e afastei da mente os pensamentos aflitivos sobre Ruggero e Candelária e tentei prestar atenção somente à minha respiração e aos sons à minha volta. Durante a meia hora seguinte acompanhei os movimentos perfeitamente sincronizados da mãe e filha aprendendo posições como a do cachorro baixo. Tentei não pensar que elas me lembravam um pouco Candelária e Chloe. Essa menina era só um pouco mais velha que a filha de Ruggero.
Me sentia muito mais calma quando terminamos e a mulher me ofereceu uma água que levava na bolsa.
Xx: você é daqui?
Kah: não, sou de Nova York, só vim passar uma semana.
Yy: sempre quis ir a Nova York!- a menininha falou olhando para mãe.
Xx: talvez seu pai e eu possamos te levar no ano que vem- vi a empolgação invadir os olhos da garota.
Yy: sério?
Kah: vocês fazem muitas viagens em família?- perguntei.
Xx: nos fins de semana sim. Meu marido e eu compartilhamos a guarda da Chloe com a mãe dela- quase engasguei com a água.
Kah: você disse Chloe?- olhei para a menina- Seu nome é Chloe?
Chloe: aham- ela sorriu.
Kah: é um lindo nome.
Chloe: obrigada- perguntei para a mulher:
Kah: então... você é a madrasta dela?
Xx: isso.
Kah: uau, pensei que...
Xx: que ela fosse minha filha? Por que nos damos bem?
Kah: sim.
Xx: bem, você está certa, ela é minha filha. Não a considero menos que uma filha de verdade por não termos laços sanguíneos.
Chloe: é muita sorte ter duas mães- disse Chloe e concordei balançando a cabeça.
Kah: é verdade.
Xx: bom, temos que ir. Chloe tem aula de balé.- ela estendeu a mão- Aliás, meu nome é Natasha- apertei a mão dela.
Kah: Karol.
Natasha: foi muito bom te conhecer Karol. Espero que goste de Hermosa Beach.
Chloe: talvez a gente se veja em Nova York no ano que vem!- disse Chloe dando uns pulinhos e sorri.
Kah: talvez, obrigada pela aula de ioga- sozinha de novo na areia pensei no significado desse encontro. Nos dias que antecederam com o rompimento com Ruggero procurava sinais que confirmassem como certa minha decisão de deixá-lo e hoje não estava procurando sinal nenhum, mas um deles me acertou na cara com a força de uma tonelada de tijolos.
Chloe.
Não podia ser coincidência.
Nunca pensei que uma criança pudesse considerar a chegada de uma madrasta como ganhar mais uma mãe em vez de perder o pai para outra pessoa. Minhas experiências haviam guiado minhas decisões. Theresa nunca tentou me conhecer, muito menos agir como uma segunda mãe, nunca se esforçou para me incluir em nada que meu pai e as filhas dela faziam. Não teria sido assim comigo e Chloe. Por que nunca pensei na situação desse jeito? Medo, estresse e culpa me cegaram e agora via as coisas pela primeira vez de uma perspectiva totalmente diferente. Agora que era tarde demais.
·
·
·
Kah on·
Mais tarde Lina e eu relaxávamos na sala com ar-condicionado depois de uma tarde na praia.
Num impulso peguei o celular e abri a sequência de mensagens que havia trocado com Ruggero relendo tudo desde o começo. A última mensagem dele era da manhã anterior àquela noite em que ele me viu com Marco, dizia apenas: te amo.
Lina não sabia o que estava fazendo, devia imaginar que eu estava só na internet. Quando percebeu as lágrimas transbordando dos meus olhos ela se aproximou e arrancou o celular da minha mão.

Lina: lendo mensagens antigas? Chega! Vou desligar essa coisa, não foi para isso que te trouxe aqui.
Kah: não pode confiscar meu telefone!
Lina: quer apostar?- ela desligou o aparelho- Devolvo quando a gente voltar pra Nova York.

An Unforgettable Love [CONCLUÍDA]Onde histórias criam vida. Descubra agora