Se algum dia escrevessem uma biografia com os acontecimentos da minha vida, o voo de volta para São Francisco após aquela visita à minha antiga cidade para que meu noivo conhecesse minha mãe certamente estaria entre os dez melhores momentos.
Outro momento digno de estar entre melhores foi aquela noite, quando voltamos para casa depois de ter apresentado Nikolai à minha mãe e tomado chá com ela. Isso porque meu noivo passou quase a noite inteira debaixo dos lençóis, entre as minhas pernas, me ajudando a relaxar — mas aquela era uma história para outro dia.
Quando voltamos para São Francisco, eu tinha muito tempo livre. Como Nikolai e minha melhor amiga, Naira Patel, tinham seus empregos para cuidar, e eu fora recentemente demitida, não tinha muito o que fazer a não ser passar meu tempo sozinha, ocasionalmente tentando pintar ou tocar algum instrumento. Mas nada de produtivo saía. E como eu estava dormindo menos para evitar pesadelos com Michael... Tinha tempo de sobra. Então, decidi arranjar outro emprego. Nikolai dissera que eu não precisava trabalhar, mas, honestamente, quem era ele para me dizer o que fazer?
Me dediquei totalmente naquilo. Melhorei meu currículo, cacei vagas de emprego nos jornais de Nikolai, e liguei para diversos lugares. Em uma semana, eu fui a tantas reuniões que havia perdido a conta. Tentei me candidatar para ser professora de artes, para trabalhar em museus ou outras galerias de arte, e até distribui panfletos me oferecendo a dar aula particular de teoria musical ou de algum instrumento que eu soubesse tocar — contudo, apenas recebi duas respostas. Como todos os outros lugares me recusaram, resolvi aceitar aqueles trabalhos de dar aula particular. O primeiro era de um menininho iniciante no piano, cuja mãe começou a chorar de emoção quando ele pressionou a primeira tecla.
O segundo... Aquele foi bem mais interessante. Era num dormitório de faculdade, e a moça queria ajuda para impressionar o namorado, pois ele era dono de um bar-restaurante e precisava de alguém para tocar violão ao vivo nas sextas-feiras; e essa moça desesperadamente queria ser esse alguém. Eles terminaram o relacionamento antes que eu pudesse lhe dar uma segunda aula, e seu namorado me convidou para tocar no seu barzinho.
Era lá que eu estava naquela sexta-feira. Inspirando e expirando. Tentando controlar meus nervos antes do lugar abrir e eu ter que começar meu primeiro dia trabalhando lá. O bar-restaurante era um lugarzinho pitoresco, iluminado à meia-luz com lâmpadas amarelas feitas de bambu. Havia algumas mesas ao ar livre, mas eu tocaria na parte de dentro, que era climatizada e tinha até alguns sofás aconchegantes. Para me adaptar ao clima despojado do local, eu usava apenas calças jeans básica e uma blusinha de manga longa branca cheia de flores cor de roxa. Às minhas costas, estava pendurado um violão marrom, decorado com pequenos adesivos coloridos.
O dono do bar-restaurante me disse o horário que eu deveria começar a tocar. Um pouco antes, eu subi no palco, minhas mãos tremendo, para organizar tudo antes de começar. Quando finalmente me sentei num banquinho alto de madeira com o violão no meu colo, olhei para aquela multidão de rostos, desejando o do meu noivo ou o da minha amiga estivessem ali. Eu sabia que eles estavam ocupados, porém. Eu entendia. Mas era inegável que a presença deles me deixaria menos nervosa.
Então, comecei a tocar. Deixei que a música me embalasse e me envolvesse por completo, levando meus anseios para longe. Toquei algumas que estavam na lista do dono do bar, e toquei alguns pedidos da plateia. Felizmente, eles pareceram gostar, o que me motivou e colocou um sorriso no rosto. Pelo menos para algo eu servia. O jeito que os clientes aproveitavam a música não era bem um elogio, mas era muito mais do que Michael jamais fizera. Ele nunca me elogiava, só reclamava. Após anos sendo subestimada e colocada para baixo, era estranho ver pessoas gostando do meu trabalho, cheguei até a pensar que faziam aquilo por pena.
Os clientes do bar iam e viam por horas a fio, e eu continuava tocando, fazendo menos pausas do que deveria. Era um costume adquirido na galeria de artes de Michael, onde eu trabalhava a mais, e sempre ficando exausta no final. Continuei tocando até mais ou menos três da tarde, quando o local começou a esvaziar. O horário de pico era na hora do almoço e à noite, então eu teria uma pausa de algumas horas e voltaria mais tarde para tocar durante o happy hour. Então, parei para beber água e o dono do barzinho me chamou:
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Beautiful Stranger
RomanceNa sua juventude, durante as férias de verão, Elaine Róson e Dimitri Tarasova se apaixonaram perdidamente um pelo outro. Porém, os trágicos caminhos do destino separaram os dois por oito anos, até que eles se reencontram para o casamento de Elaine c...