capítulo trinta

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Então, foi isso que eu fiz.

Na manhã seguinte, eu pedi para Amara me levar a alguma papelaria próxima. Ela perguntou se algo faltava no meu material de pintura, mas eu a assegurei que estava perfeito, o que eu realmente queria era comprar algo para Dimitri. Amara me lançou aquele seu típico sorriso discreto que dizia "eu sei que você está aprontando e eu vou fingir não ver". Então, nós caminhamos juntas pela cidade — sem seguranças, porque Amara os detestava — até uma pitoresca papelaria com atendentes gentis que pareciam conhecer muito bem a minha acompanhante.

Diferente do passeio com Dimitri, ao qual fomos devagar e conversando, Amara era mais prática, e caminhava rapidamente em direção ao seu objetivo. Contudo, ela era uma companhia igualmente agradável. Inteligente. Amara era muito inteligente. Gostava de falar rápido e fazer críticas construtivas a tudo que víamos. Me falou orgulhosa sobre seus filhos, e sobre o quanto batalhara para chegar onde estava. Outro aspecto que certamente me deixou admirada foi a forma confiante como ela andava, com cabeça erguida e peito estufado. Confiante. Elegante. Poderosa. Como uma rainha. Amara agia como uma verdadeira rainha, e todos a tratavam como tal. Uma rainha gentil, porém.

Comprei um caderno com capa preta, muito parecido com o outro caderno que Dimitri tinha. Quando cheguei, ele estava em seu quarto, resolvendo algo em sua escrivaninha. Para minha surpresa, ele estava apenas usando calças, sem camisa — tentei não olhar muito para seus músculos expostos, marcados por aquela tinta preta.

— Para você a porta está sempre aberta. — disse ele, no seu habitual tom brincalhão quando eu entrei no local. Daquela vez, pude reparar em mais uma diferença do meu quarto para o dele: a grande estante de livros. — O que a traz ao meu quarto, senhorita Róson? — indagou num tom formal, enquanto eu me sentava na escrivaninha, de frente para ele, que estava na cadeira.

— Bem, senhor Tarasova... — comecei, com um sorriso. — Eu ainda queria te agradecer, então... comprei isso.

Dimitri arqueou uma sobrancelha no minuto em que lhe mostrei o caderno.

— Isso é muito legal da sua parte, Elaine, eu sempre quis ter dois cadernos iguais para brincar que eles são irmãos gêmeos. — disse ele, em tom de zombaria. Revirei os olhos. — Não, desculpe. Obrigado.

— Não é o caderno, Dimitri. É... a ideia por trás dele. — disse eu, como se fosse óbvio. Os belos olhos azuis de Dimitri continuaram me encarando, esperando que eu explicasse. — Você tem um caderno para lembrá-lo das pessoas que não conseguiu salvar. E eu entendo que isso é importante para você. Te motiva. Mas eu também acho... Acho que se passar sua vida toda se culpando pelas pessoas naquele caderno, você vai enlouquecer. Acho que às vezes você precisa de um lembrete de que não é todo amaldiçoado. De que você é bom. — dito isso, entreguei a ele o caderno novo. — Então, neste aqui... ponha os nomes das pessoas você conseguiu salvar.

Havia surpresa no seu olhar quando terminei de falar — até arriscaria dizer... um certo brilho. Sem dizer nada, ele abriu o caderno, e um sorriso emocionado se formou nos seus lábios imediatamente quando ele viu o primeiro e único nome ali.

— Você colocou seu nome aqui. — ponderou ele, olhando em meus olhos. Assenti.

— Não posso negar que você me salvou. Sete anos atrás. — falei com um sorriso tímido. E, pela primeira vez, pude jurar que deixei Dimitri sem palavras. Ele intercalava o olhar entre mim e o caderno, como se buscasse a coisa certa a se dizer.

— Obrigado, Elaine. — disse ele, por fim. Me agradecia... Genuinamente. Nenhum sarcasmo, brincadeira ou diversão apenas Dimitri... O Dimitri mais vulnerável que já vira desde aquele verão. — Você não faz ideia do quanto isso significa para mim.

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