Tecnicamente era para eu estar dormindo. Mas estou no computador. É uma droga não conseguir regular meu sono quando quero, mas eu podia aproveitar que, além de sem sono, eu estava com disposição, duas coisas que raramente ficavam juntas.
Além disso, não posso me mexer agora já que uma das gatas de tia Helena resolveu que minhas pernas é uma boa cama no momento. Ela está ronronando e esse é o único som no meu quarto. Me acalma um pouco. Certo. Acabo deixando o jogo de lado e vou ao Google, mas não faço nada demais, na verdade, estou ficando com dor de cabeça e isso é horrível já que tenho que participar da primeira reunião na biblioteca com Maria e os outros. Convencer Breno a ir foi a tarefa mais difícil que já tive que passar com ele, tive que apelar a prometer que lavaria a louça dele por cinco dias. Não tive coragem de chamar mais ninguém do que as pessoas próximas de mim, ou seja, Larissa e Adriano também. Eu estava me permitindo ser um pouco mais discreto na escola e até agora isso está dando certo, é uma coisa boa demais para estragar chegando em alguém no corredor e pedindo para ir à biblioteca comigo, ler um livro. Não. Com certeza não.
De surpresa, recebo uma mensagem de Maria.
"Viu isso?"
E anexado à mensagem, uma foto.
Uma simples foto de Samir e Enzo mostrando às alianças.
"Que fofo" — Digito.
"Eu quem escolhi, mas não conte isso a Samir. Enzo pediu minha ajuda. E você?"
"Eu o quê?"
"Quando vai comprar as alianças para Benja? Ou ele vai fazer isso? Desculpa dizer, mas ele parece ter vergonha demais para fazer isso"
Maria não conhecia o lado sem vergonha de Benja como eu, ou Marina e Lucas. Não sei se ele teria mesmo coragem de me pedir em namoro na frente da nossa escola e por Deus, eu não quero isso também. Mas acho, sinceramente, que ele armaria alguma coisa sim. Algo que só ele pensaria.
Acabo digitando que não sei para pôr um ponto final na conversa. A verdade é que apesar de gostar intensamente de Benja — e de gostar quando ele me chama de namorado —, eu estava hesitante com o namoro em si. Com o pedido, com a resposta, com o começo, o desenvolver. Acho que primeiro eu tinha que me ajustar, não era nada sobre o mundo, sobre a escola ou minha reputação que está sendo reconstruída. É algo sobre mim e ia além dessas coisas.
Vou à cozinha na ponta dos pés para beber água e procurar um comprimido para dor de cabeça. Dipirona, talvez. O latejar estava se intensificando. Quando voltei ao quarto, vejo a gata olhando feio para mim porque me levantei e estraguei seu sono.
— Você quer voltar?
Ela me dá as costas e vai embora.
Melhor para mim, de qualquer jeito.
Acabo jogando The Sims até o despertador tocar e eu ter que ir me arrumar para mais um dia de aula.
***
— Ei, Alison, você quer saber um segredo?
— Uh, cara, não faz isso... ele pode publicar depois.
Reviro os olhos. Já estava ficando chato. E as piadinhas perderam a cor, não doía mais, era apenas um leve incômodo como minha dor de cabeça. Eu não via a necessidade de retrucar. Na verdade, não via a necessidade sequer de falar com pessoas que até poucos dias atrás me chamaram de veado. Eu ignorava porque foi esse o caminho que escolhi.
Passo as três primeiras aulas sem falar com ninguém. Tento me esforçar. Na quarta aula, depois do intervalo, as coisas ficam ruins.
O professor de física pediu que formássemos um grupo de seis para que ninguém ficasse de fora. E meu grupo se formou assim: Eu, Enzo, Maria, Samir, Larissa e por último, Joyce. Fomos o único grupo que ficou faltando um integrante e ela, por pura sorte — ou azar —estava livre.