TRINTA E SEIS

68 6 0
                                    

— Eu vi pela janela. Quem era ele? — Minha tia grita assim que cruzo a porta.

Contenho meu susto com um sorriso forçado. É bom ver que ela está animada com o fato de eu ter ficado beijando um garoto por quase vinte minutos em frente de casa. Parecia algo que a maioria das pessoas julgaria como ruim e pecaminosa. Não minha tia Helena, ao visto.

A alegria dela é contagiante e logo estou contando o nome dele e nossa pequena caminhada até aqui. Minha tia fica animada.

— Ele é lindo! Vocês já namoram?

— Não! Claro que não! — Rio sem graça. Não sei o que mais responder, negar parece insuficiente para ela.

— Sei... Lembrei do que aconteceu com seu irmão, coitado, a namorada dele pareceu ser tão legal.

— Carol é legal. Mas ela não merece Breno. Agora vou tomar banho. Tia?

— O quê? — Ela se vira de novo para mim, interrompendo seus passos até à cozinha.

— Pode não contar a Breno? Eu acho que eu quem deveria contar.

— Como você quiser. Ah, a louça do almoço é sua.

Sorrio para minha tia antes de correr para o banheiro.

— Você está mais com mais cara de idiota hoje do que ontem — é o que Breno diz ao entrar no meu quarto.

Deixo o jogo de lado e arrasto minha cadeira até minha cama, onde ele se jogou sem tirar os tênis.

— Tia Helena disse que tinha algo pra me dizer. Fala logo, odeio segredos.

— Não era para ser contado hoje. — Bufo — Eu e Benja... ele é da sua sala...

— Ah, eu sei. Ele é legal. Me ajudou no trabalho de matemática. Ouvi pela boca dos outros o que vocês fizeram. Porque não me disse que não gostava de Dan?

— Eu gostava de Dan, Breno. Mas eu gosto de Benja, gosto mais dele. Eu não conto nada a ninguém, isso é um problema que tenho que tratar. Mas é meio impossível com toda essa droga acontecendo.

— Você está machucado. — Ele diz e aposto que está se sentindo um sábio ao dizer isso, lentamente, profundamente, olhando para o teto.

Claro que eu estou machucado, porra, eu contei onde eram minhas feridas.

Mas isso não é o mais importante, o importante é que não tenho meus pais, nem minha melhor amiga e agora estou me sentindo afundando na minha própria merda. Confiar até em você é difícil, Breno, mas aqui estou eu.

— Espera, vocês estão namorando? — Breno grita como a nossa tia.

— Não! A gente só se beijou.

— Ah, menos mal.

Jogo um travesseiro nele e acerto no seu rosto. Breno o pega e o agarra. Ele começa a rir.

— Você está estudando para as provas?

— Ah, um pouco. Participei do CCB hoje.

— Sério? — Breno franze o cenho — E como foi?

Menti. Mas não totalmente.

— Mais ou menos. Agora que eu já te contei o que era você pode sair do meu quarto.

— Ah, qual é, você não quer rever o clipe da Katy Perry na selva?

— Para você — estendo o dedo do meio para ele.

— Você sabe muito bem onde coloca-lo. Bocó. — Ele pula da minha cama e quando saí, fecha a porta.

Uso o computador para estudar um pouco, mas quando se passam menos que meia hora e não consigo me concentrar mais e pego meu celular. Ligo para Benja.

Quando me atende, ele parece confuso.

— Sou eu, Alison.

— Ah, oi — ele amansa a voz —, escuta... meu pai está aqui.

— Merda. Desculpa.

— Não, tudo bem. Ele só está querendo conversar dessa vez. Algum conselho?

— Pense duas vezes, é o que me disse uma vez — digo e consigo escutar sua risada do outro lado.

Também escuto uma fala feminina. Benja geme de raiva.

— Minha madrasta — explica —, ela também resolveu dar as caras. Tenho que ir. Um beijo.

— Tchau — é apenas o que digo ao desligar.

Tento me concentrar de novo nos estudos mas acabo fracassando miseravelmente. Meia hora se passa e fico me coçando para mandar uma mensagem perguntando se está tudo bem com ele, se aconteceu algo, eu estava me sentindo elétrico e preocupado. Então me lembro de outra coisa que Benja me disse por mensagem: ele escuta música e ajuda.

Coloco os fones e deito na cama com o celular sobre a barriga. Aperto o play no Spotify e fecho os olhos.

Te beijar é incrível.

Sorrio no escuro. Sorrio para o nada e fico pensando nele por um tempo. Depois tiro os fones e vou jantar.

Passo pelo quarto dos meus pais e abro a porta para Sálvia entrar lá. Ela gosta de se deitar na cama deles por um tempo, assim como de se deitar na minha. Fica esticada nos lençóis.

— Eu também, sua gata chata. — Digo quando ela fica confortável nos lençóis. Depois a tiro de lá antes que minha tia veja.

Ela se junta as outras gatas ao redor da cozinha.

Ao fechar a porta do quarto dos meus pais eu percebo o quanto ali é cheio de história. Sinto-me bem em fechar a porta sem hesitar como fazia antes.

Agora ou Nunca (Romance Gay)Onde histórias criam vida. Descubra agora