Dez

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Meus olhos estavam extremamente pesados. Eu sabia que precisa levantar, mas meu corpo se recusava. Eu precisava abrir os olhos, mas parecia ser um ato doloroso demais.

– Vejo que acordou. – Reconheço a voz da mulher que me ajudou. Isso é minha deixa para abrir os olhos. – Cheguei muito tarde e te cobri com esse lençol. Você poderia ter ido para a cama.

– Já abusei demais da sua hospitalidade. – Afasto o lençol e me sento. – Qual seu nome?

– Natalie. – Diz de boca cheia. – Venha comer comigo.

Antes de acompanhá-la, vou até o banheiro rapidinho. Sempre acordo com a bexiga cheia. É incrível isso. Aproveito e escovo os dentes. Percebo que estou de roupão e não tenho roupa nenhuma a não ser a fantasia suja.

– Não tenho roupa nenhuma. – Falo ao sentar na cadeira. – Como vou sair daqui?

– Ele mandou roupas para você. – Ela aponta para uma sacola encostada no sofá. – Ele viu pelas câmeras que trouxe você para a ala dos empregados. Permitiu que você ficasse aqui até a hora do almoço. Depois ordenou que te levasse para o restaurante do hotel.

– Queria muito que tudo não tivesse passado de um pesadelo infeliz. – Resmungo fechando os olhos como se estivesse sentindo dor. – Mas não há como fugir dele. Sou sua cadelinha, afinal.

Ela me encara com uma expressão muito triste e pra desconversar me serve de café e comida.

Gestos assim que me fazem acreditar que o mundo ainda tem pessoas boas. É difícil acreditar, mas vale a pena. É algo que vale a pena se apegar de todo coração.

No exato momento que você desacredita da existência de anjos disfarçados, você acaba morrendo um pouco. Viver desconfiado é cansativo. Espero não perder a esperança.

Deon me faz querer duvidar da existência de pessoas boas, mas acabo encontrando Natalie e seus pequenos gestos me aquecem o coração.

– Você dormiu bastante. Já é quase a hora do almoço. – Ela hora no relógio. – Fique a vontade para tomar um banho ou trocar de roupa. Meu experiente começa daqui a pouco e eu preciso levar você.

Assinto sentido o peito apertar. Precisarei encarar Deon e sei lá mais quem. Tomo um banho bem gelado, troco de roupa e penteio os cabelos. Vejo a fantasia de cadelinha e sinto uma raiva se apoderar de mim. Pego as peças e enfio no lixo.

– Estou pronta. – Falo assim que saio do banheiro. – Podemos ir, Natalie.

Ela assente e me guia pelo corredor cheio de portas. Essa ala dos funcionários é de fato imensa. Qual real tamanho desse hotel?

Pegamos o primeiro elevador e depois ela me colocou em outro. Esse ela disse não poder ir comigo, mas me indicou o botão que eu devo apertar.

– Obrigada, Natalie. Você foi um anjo para mim.

– Você fica me devendo esse favor. –  Ela pisca e sorri. – Mas cuidado. Você está cercada de pessoas perigosas. Aprenda a se proteger, Melina. Se cuida!

Assinto e aperto o botão vendo a porta se fechar. Engulo em seco quando me vejo sozinha dentro desse cubículo.

Será que aquele imbecil vai dizer toda a verdade de uma vez ou ficar me dando enigmas?

Assim que a porta se abre dou de cara com a entrada de um restaurante. Não sei o que fazer. Caminho até um homem que está parado anotando algo.

– Senhor, preciso encontrar Deon Castilho.

– Ah, sim. – Ele rapidamente tira os olhos do seu bloco para me dar atenção. – Siga-me, por gentileza.

Sigo o tal homem e de longe vejo Deon sentado em uma mesa para dois. Ele ergue o rosto para me olhar e parece satisfeito ao me ver. Prendo o riso ao vê-lo de óculos escuros.

Sádico!

O funcionário puxa a cadeira e me permite sentar. Deon o dispensa apenas com um gesto de mão.

Mal educado!

– Espero que tenha dormido bem, Melina. – Ele olha o cardápio. – Pensei muito se deveria ou não deixá-la com a Natalie, mas sua nova amiguinha intercedeu por você. Ainda estou pensando se demito a insolentezinha.

– Não desconte nela suas frustrações, Deon. Sua festa ontem foi incrível. Por que o mal humor? Você deveria estar estourando fogos. – Ele me olha por cima do cardápio. – Cumpri com tudo que me pediu. Quero falar com meus pais.

– E esse olho roxo, franguinha? – Ele abaixa o óculos e de fato está bem ruim. Sorrio em deboche. – Você se saiu um belo animal selvagem ao fazer isso. Apenas confirmou o que eu já sabia sobre você.

– Então é melhor parar de me chamar de franguinha. – Cruzo os braços. – Esse soco serviu pra te mostrar que não tenho nada de acuada. – Ele bufa e chama o garçom com a mão. –  Quero contato com meus pais, Deon.

Ele me ignora e faz os pedidos. Ressalto que não me deixou escolher nada. Nem a sobremesa.

– Depois desse seu gesto ridículo de me esmurrar você vai ter que me tratar muito melhor para conseguir alguma notícia sobre seus pais. – A petulância que ele fala me faz querer esmurrar seu outro olho. – Em breve levarei você para vê-los. Mas para isso você terá que ser bem colaborativa.

– Acho melhor você parar de tantos mistérios e falar exatamente qual minha serventia nesse circo todo. Você já revelou o nome do meu pai, fez vídeo engraçadinho e tudo. Mas eu não sei quem é minha família biológica. Por que você quer destruí-lo? Ele merece tal coisa? Esclarece as coisas, Deon. Eu só quero poder encerrar isso logo e voltar para os meus pais adotivos. Eu não ligo para nada e nem ninguém além deles.

A minha fala parece que faz o pensamento dele ir longe. Seus olhos fixados nos meus demonstra claramente que seu consciente não está aqui. Aguardo ele retornar do seu mini transe.

– Você realmente não liga se for rica, herdeira de várias coisas importantes que podem transformar sua vida? Dinheiro não te atrai? – Sua voz muda, parece sombria. – Por que seus pais adotivos são mais atrativos do que sua verdadeira origem? Você é burra, afinal?

– Tem certeza que eu sou burra, Deon? Burra por preferir amor do que dinheiro? Burra por preferir o contato quentinho e verdadeiro dos meus pais adotivos do que a frieza de várias cédulas? – Sorrio em descrença. – Estou perdendo nada. Se meu pai verdadeiro nunca me achou, tendo muito dinheiro, é porque realmente não queria me encontrar. Por que eu o preferiria, então? Não me chame de burra, por favor, apenas aceite minha opinião. – Ele dá de ombros e assente. – Agora me diga a verdade. Eu preciso saber no que estou me metendo.

Fragmentada (DISPONÍVEL POR TEMPO LIMITADO)Onde histórias criam vida. Descubra agora