Quarenta e nove

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Cristine Morris ( Bônus )

Eu tinha quase 30 anos, um hábito terrível de fumar e um mal humor incomparável. O que eu tinha a perder?

Se eu morresse, poderiam me jogar em qualquer vala ou queimar o meu corpo. Ninguém procuraria por mim. Ninguém iria atrás de Cristine Morris.

Porque Cristine Morris é ninguém.

Mas eu, fragilizada, não pensei bem quando aceitei. Eu queria grana e não estava me importando com o que iria acontecer comigo. Eu só aceitei.

Quem dera se eu tivesse colocado a mão na consciência por alguns segundos e ter recusado a proposta de Rael. Eu não teria manchado tanto a minha vida.

Eu sabia da existência de Melina, sabia que uma hora eu teria que ser babá dela, mas fiz várias outras coisas antes disso.

Rael não era pau mandado de um só homem. Ele tinha chegado a Deon através de outra pessoa, a quem ele prestava grandes serviços. Era para esse outro cara que mais trabalhávamos.

Já dormi com caras perigosos para deixá-los vulneráveis e outro vim e acabar com eles. Já transportei dr0gas, arriscando minha liberdade. São várias coisas que eu fiz. Várias.

E isso hoje me causa um peso. Eu sinto que sufoco quando lembro de tudo. Aos 33 anos, me vejo perdida em memórias dolorosas e arrependimentos tardios.

Melina foi um presente no meio dessas burradas todas. Eu não imaginei que iria me apegar a ela da forma como me apeguei. Tenho certeza que Deon permitiu que eu tivesse mais contato com ela justamente pela nossa boa afinidade.

Existia um limite, mas as vezes eu esquecia dele quando conversávamos. Melina é uma pessoa que me trouxe muita luz. Eu, toda mergulhada em escuridão, e ela sempre foi um sol gigante na minha vida.

Que sorte a minha tê-la encontrado. Foi justamente após nossa aproximação que comecei a não me sentir tão sozinha. Eu via nela uma amiga, mas não podia chegar e dizer isso.

Eu estava sendo paga para estar ali com ela. Eu sabia de coisas que ela não sabia e nem podia saber. Como firmar amizade no meio dessa sujeirada toda?

Eu precisava do dinheiro, mas também precisava de uma amiga. E foi assim até o fim. Bombeando nesses dois pensamentos.

Quando chegou o dia do grande plano de Deon entrar em ação, eu sabia que ela não morreria. Alguém assim deve ser protegida por uma operação especial de anjos. Mas, por garantia, eu iria me juntar a esses anjos. Era minha forma de tentar me redimir. Se eu morresse, Deus veria que foi protegendo uma amiga. Será que sua misericórdia me alcançaria?

Uma pena eu ter sido apagada tão cedo e não ter lutado mais. Mas eu sabia que ela não morreria. Ela ficaria bem. Ela merecia ficar. Era um direito dela sobreviver a isso tudo.

Ela tinha perdido os pais e a mãe biológica de forma brutal, teve que ser obrigada a fazer tudo que Deon queria, foi humilhada... E mesmo assim ela parecia muito mais forte do que eu.

Mas Melina sempre foi mais forte do que eu. Era nítido.

Quando eu soube onde ela estava morando, após toda repercussão da mídia e desenrolar daquele dia, eu tinha que procurá-la. Eu queria ser sua amiga. Só que dessa vez do jeito certo. Jamais abandonando-a.

Eu sabia que ela iria sumir em breve e eu também teria que sumir. A polícia provavelmente chegaria em mim em breve. Eu não queria me envolver com eles.

Eu queria mesmo era recomeçar. Ao lado de alguém que estivesse na mesma vibe.

Quem melhor que ela?

E recomeçamos. Mas não era só nós duas. Eram nós três. Melina estava grávida.

Fragmentada (DISPONÍVEL POR TEMPO LIMITADO)Onde histórias criam vida. Descubra agora