Melina Martins
Estar dentro de uma peça de roupa em que seu valor daria para comprar uma casa gera um pouco de inveja.
Inveja porque eu não tenho esse dinheiro. E se o tivesse jamais gastaria em apenas uma peça de roupa, por mais nobre e exclusiva que fosse.
Assim que me vi no espelho do provador, vestindo a peça mais simples de todas que a moça trouxe, senti que era aquela. Ela se encaixou tão bem em mim que facilmente diria que era minha segunda pele.
A funcionária me incentivou a ir até Deon para perguntar o que ele achava da peça. Um pouco tímida, fui. Ele estava sentado, parecia mergulhado em pensamentos.
Quando seu olhar bateu em mim, novamente aquele frio na barriga se apoderou do meu corpo. Seus olhos pousados em mim causam a sensação de que estou despida em sua frente. Não de roupas, mas de qualquer sentimento que mascare o que realmente estou sentindo.
Ouvi-lo render elogios à mim deixou-me ainda mais esquisita. Estar sentindo alguma afeição por Deon me deixa extremamente estranha.
Não quero esse sentimento em mim. Deon não merece que eu sinta algo tão bom e puro por ele.
– Ok, então é esse que escolhi. – Digo voltando ao provador.
A moça tinha me dado uma sacola para que eu colocasse minhas roupas. Após arrumar tudo, volto para a parte da recepção da loja. Deon estava com uma caixa nas mãos.
– Não podemos esquecer dos sapatos. Ganhamos esses de cortesia. Veja se dão em você.
Pego a caixa, sento em uma cadeira e removo meus tênis. Realmente tênis não combina muito com esse modelo de vestido. Os saltos couberam como uma luva em mim. Guardei o tênis na sacola junto com as roupas.
– Não são muito altos. – Caminho adquirindo ainda mais segurança para calçá-los. – Amei a cor. Agradeça por mim a cortesia.
– Já fiz. Agora vamos. Estamos atrasados.
De volta ao carro, o silêncio tinha retomado. Eu não tinha o que falar. Também não sei se queria dizer algo. Era tão difícil e tóxico isso tudo. Que grande bosta!
– Chegamos, Melina. – Ele estaciona e tira o cinto. – Vamos antes que o juiz desista de nós.
– Seria errado torcer por isso?
Ele não responde. Apenas abre a porta para que eu saia. Agradeço aos céus mentalmente por não ter nenhum fotógrafo ou coisa do tipo aqui. Não sei o nível da fama de Deon, porém não deve ser pouca.
– Aguardaremos sermos chamados aqui. Vai ser rápido. Meus advogados cuidaram de tudo e eu pedi que focasse apenas na assinatura.
Assinto em concordância. Que bom! Também não quero que isso seja demorado. Na ficção, o casamento é cheio de tanta ladainha e protocolo. Sinto-me feliz por saber que não terá isso.
Fomos chamados dez minutos depois. O juiz era amigável e gentil. Ainda nos falou palavras bonitas e amorosas. Aquilo mexeu comigo. Queria poder dizer que era tudo mentira e que ele poderia poupar suas lindas palavras para outro casal perdidamente apaixonados.
Mas isso seria como colocar uma corda no meu pescoço. Não tenho autonomia para tal coisa. Apenas assenti agradecendo.
Depois de assinarmos e trocarmos alianças, ouvimos mais algumas palavras e depois fomos dispensados.
Olhei de relance para meu dedo anelar da mão esquerda e uma vontade de chorar subiu à garganta.
Mas que porcaria eu tenho hein?
– Quero levar você para comermos fora do hotel. Podemos?
– Tudo bem.
O restaurante estava quase vazio. Estávamos no meio da tarde, provavelmente devia estar cheio no horário do almoço.
Não ouvi o que Deon pediu, estava alheia. O reluzir do obejto em meu dedo me levava a um estado de transe que era difícil tornar.
Repetidas vezes eu me questionava onde foi que eu fui me meter. E para isso não havia apenas uma resposta.
– Não vai comer, Melina? Você gosta tanto de comer. – Desvio a atenção do objeto para ele. – Não gostou do anel?
– Maximilian já está entre nós?
– Melina, não foi sobre isso que falei. – Ele descansa a taça com água com calma e elegância sobre mesa. – Eu quero saber de você.
– Desde quando você quer saber de mim? – Olho dentro dos seus olhos. – Não finja essas coisas, Deon, está me confundindo. Não pode ser gentil e depois me jogar no fogo. Isso... Isso fere.
Ele parece ter tomado um soco, pois parece desnorteado. Seus olhos vagam por ai, tentando desencontrar os meus a todo custo. Mas não dá certo. Logo seu olhar pousa em mim.
– Eu não tinha ideia de que... De que iria gostar tanto assim de você. – Agora sou eu que devo aparentar ter tomado um soco. – Eu só quero que minha vingança termine, Melina. E eu prometo que...
– Não. Por favor, não continue. – Engulo em seco enquanto balanço minha cabeça em negação. – Não há espaço para sentimentos nobres entre essa nojeira toda que se formou entre nós. Posso ser caipira aos seus olhos e de quem mais for, mas tenho inteligência pra saber que existem lugares que eu não posso entrar. Um deles é... É seu coração, Deon.
– Compreendo. – Ele bebe mais um pouco de água. – Eu sempre me achei indigno de algo bonito como o amor mesmo. Sei que não o mereço por isso não posso insistir. Apenas prosseguir. Desculpe, Melina.
– Sim, apenas prossiga. É melhor.
O que acabou de acontecer aqui?
Sim, falamos sobre sentimentos sem ressalvas. Era notório que algo estava crescendo entre nós. Mesmo que as atitudes sejam secas, nossos olhares nos entregam. Somos adultos. Brincar de esconde-esconde com sentimentos não é saudável para a saúde mental. Li isso em uma revista.
Se tivéssemos nos conhecido em outras circunstâncias, poderia até acontecer. Mas somos praticamente inimigos. Isso nunca seria saudável.
Como viver com alguém que matou meu pai? Mesmo sendo o biológico, que nunca me criou e se pudesse me mataria também. Parece tão errado.
Deon almeja vingar-se de Maximilian tirando sua vida. Eu não quero estar envolvida nessa sujeira.
Sem contar que contra a minha vontade eu fui colocada como isca nisso tudo. E meus pais também foram colocados em risco.
Tudo isso por quem?
Deon Castilho. Ele é o causador de toda minha dor atual. Deve ser algum efeito colateral louco da minha mente estar sentindo algo bom em relação a ele.
Deon, como ele mesmo disse, não é digno de algo tão puro e bonito como o amor. Ele já sabe. Eu também não posso esquecer disso.
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Fragmentada (DISPONÍVEL POR TEMPO LIMITADO)
RomanceSem luxo ou qualquer dinheiro sobrando, Melina Martins leva uma vida simples, morando no campo e cuidando dos pais. Nunca teve maldade em seu coração ou ambição em nada que não fosse seu. Contentava-se com a realidade que vivia; tirando leite da vac...