Trinta e cinco

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Melina Martins

Eu conseguia ouvir vozes ao meu redor, mas quem disse que eu conseguia abrir meus olhos e falar alguma coisa?

Meu corpo estava tão pesado que só de cogitar mexer um único dedo já sinto vontade de voltar a dormir, mas não posso. Não posso mesmo.

Aos poucos consigo ir abrindo os olhos. Olho em volta procurando reconhecer o ambiente, mas de fato não sei onde estou. Parece um hospital.

Por que estou aqui?

Vejo que estou com fios de uma máquina conectados em mim. Em meu dedo algo também está preso; parece um pegador de roupa gigante. Meu ombro direito dói e está enfaixado.

Meu couro cabeludo e meu pescoço também estão doloridos. Tudo em mim dói. Difícil dizer o que não está doendo.

Um homem com jaleco branco e estetoscópio no pescoço adentra o quarto. Ele sorri para mim e se aproxima.

– Olá, Melina. Tudo bem? – Assinto. – Eu sou o doutor Rodrigo e estou aqui para avaliar seu estado geral. Você lembra o motivo de estar aqui ou alguma coisa? – Nego. – Tudo bem. Não precisa se preocupar. Vou te fazer algumas perguntas e farei também alguns procedimentos.

Doutor Rodrigo foi muito gentil comigo. Perguntou sobre como estou me sentindo, me pediu para dar nota de 0 a 10 em relação a dor no meu corpo, avaliou meus sinais vitais, fez exame físico...

Aos poucos fui me soltando e respondendo verbalmente suas perguntas sem tantas ressalvas. Seus olhos escuros me lembram alguém, mas não sei quem é.

– Você está bem, Melina. Por sorte a bala que atingiu seu ombro atravessou e os machucados que você tem pelo corpo não são graves. – Diz enquanto anota algo. – Você dormiu por três dias. Acredito que ainda sinta um pouco de sono, mas é normal. Uma psicóloga muito boa da nossa unidade vai vir conversar com você.

– Sobre como eu tomei um tiro?

– Sobre isso e sobre várias outras coisas. Você também tem parentes querendo ver você. – Ele sorri. – Vou mandar trazerem algo para você comer. Chega de soro.

– Obrigada, doutor Rodrigo.

Ele se despede e vai embora. Não faço a mínima ideia de como fiquei tão machucada assim. Mas tenho certeza que minha mãe vai me contar essa história direitinho.

Um tiro? Meu Deus...
Onde eu me meti?

Era por volta da hora do almoço quando chegou minha comida. Não veio em grande quantidade do jeito que eu gostaria, mas deu para comer. Me admirei que não comi tudo. Acabei me sentindo cheia muito rápido.

Alguém bate na porta e segundos depois entra no quarto. Uma mulher bonita, por volta dos seus quarenta e cinco anos, surge com um sorriso simpático. Depois aparece Murilo e um homem ao lado dele. Um homem muito bonito. Engraçado que ele não me é estranho...

Seus olhos em mim causa uma coisa esquisita. Ele me olha como se estivesse implorando algo. Desvio meu olhar para Murilo. Esse idiota só aparece quando alguma coisa grave acontece. Vejo que ele quer chorar.

– Melina... – Ele segura nas minhas mãos. – Meu Deus! Por que você não disse tudo que estava acontecendo? Meu Deus...

– Sr. Murilo? – A mulher chama. – Vamos conversar juntos, tudo bem? – Ele se afasta e ela vira para mim. – Oi, Melina. Sou Karina, psicóloga dessa unidade hospitalar. Queremos conversar um pouquinho com você. Pode ser?

Não consigo tirar os olhos do homem ao canto do quarto. Ele também tem algumas escoriações em seu rosto e parece abatido.

– Melina? – Karina me chama mais uma vez e eu assinto tornando a prestar atenção nela. – Você lembrou quem é seu irmão, mas lembra quem é aquele homem?

Fragmentada (DISPONÍVEL POR TEMPO LIMITADO)Onde histórias criam vida. Descubra agora