PSICOLOGIA INDIVIDUAL E HOLISMO

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Filósofo: Você está parecendo um pouco melancólico hoje.

Jovem: Desde nosso último encontro, venho pensando com toda a calma e cuidado sobre a separação de tarefas e a liberdade. Esperei minhas emoções se assentarem para depois raciocinar. Mas a separação de tarefas não me parece realista.

Filósofo: Tudo bem. Por favor, prossiga.

Jovem: Separar tarefas é basicamente uma ideia que se resume em definir um limite e dizer: “Eu sou eu, e você é você.” Claro que com isso provavelmente existem menos problemas de relacionamento, mas você diria que é correto viver assim? Para mim, parece um individualismo extremamente autocentrado e equivocado. Quando vim aqui pela primeira vez, você me contou que a psicologia adleriana é também chamada de “psicologia individual”. Esse termo vem me incomodando faz algum tempo, mas afinal descobri por quê: o que você está chamando de psicologia adleriana, ou psicologia individual, é essencialmente o      estudo de    um individualismo que leva as pessoas ao isolamento.

Filósofo: O termo “psicologia individual”, criado por Adler, de fato tem certos aspectos que podem levar a uma compreensão errada. Explico: em primeiro lugar, etimologicamente falando, a palavra “individual” tem o sentido de “indivisível”.

Jovem: Indivisível?

Filósofo: Sim. Em outras palavras, é a menor unidade possível, portanto não pode ser decomposta. Ora, o que exatamente não pode ser dividido? Adler era contrário a qualquer tipo de sistema de valor dualista que tratasse a mente separada do corpo, a razão separada da emoção ou a mente consciente separada da inconsciente.

Jovem: Qual o objetivo disso?

Filósofo: Por exemplo, você se lembra da história da estudante que me procurou porque tinha medo de corar? Por que ela desenvolveu o medo de corar? Na psicologia adleriana, os sintomas físicos não são considerados de forma separada da mente (psique). Mente e corpo são vistos como uma coisa só, indivisível. Quando a tensão se instala na mente pode fazer braços e pernas tremerem ou o rosto enrubescer. Já o medo pode fazer o rosto empalidecer. E assim por diante.

Jovem: Bem, com certeza, partes da mente e do corpo estão ligadas.

Filósofo: O mesmo vale para razão e emoção, e para a mente consciente e a inconsciente. Uma pessoa normalmente controlada não espera surtar e começar a gritar com alguém. Não somos acometidos por emoções que existem independentemente de nós. Cada um de nós é um todo unificado.

Jovem: Não, não é verdade. É exatamente por termos a capacidade de ver mente e corpo, razão e emoção, mente consciente e inconsciente como coisas distintas que obtemos uma compreensão correta das pessoas. Isso não é um fato?

Filósofo: Claro que mente e corpo são coisas separadas, que razão e emoção são diferentes, e que tanto a mente consciente como a inconsciente existem. Mas, quando alguém tem um acesso e berra com outra pessoa, é o “eu como um todo” que está optando por berrar. Ninguém pensaria que emoções que existem
independentemente – ou seja, sem relação com as outras intenções – podem produzir a voz que berra. Quando separamos o “eu” da “emoção” e dizemos Foi a emoção que me fez fazer isto, ou A emoção tomou conta de mim e não pude evitar, esse pensamento rapidamente se torna uma mentira da vida.

Jovem: Você está se referindo à ocasião em que berrei com o garçom, não está?

Filósofo: Sim. A visão do ser humano como um “eu como um todo”, um ser indivisível que não pode ser decomposto, é chamada de “holismo”.

Jovem: Certo. Mas eu não estava pedindo uma teoria acadêmica para uma definição do “indivíduo”. Veja bem, se você levar a psicologia adleriana à sua conclusão lógica, ela consiste basicamente em dizer “Eu sou eu, e você é você”, levando as pessoas ao isolamento. A ideia é: “Eu não vou interferir nas suas coisas, portanto não interfira nas minhas, e vamos continuar vivendo como bem entendermos.” Por favor, diga sinceramente o que acha deste ponto.

Filósofo: Você compreende o princípio básico da psicologia adleriana que diz que “todos os problemas têm base nos relacionamentos interpessoais”, certo?

Jovem: Compreendo. A ideia da não interferência nos relacionamentos – ou seja, a separação de tarefas – provavelmente surgiu para resolver esses problemas.

Filósofo: No nosso último encontro, acho que falei que, para formar bons relacionamentos, é preciso manter certo grau de distanciamento. Embora as pessoas que se aproximam demais acabem sem conseguir sequer se falar, também não é bom se afastar muito. Não pense que a separação de tarefas pretende afastar as pessoas. Pelo contrário: enxergue como uma forma de pensar que permite desembaraçar os fios complexos dos nossos relacionamentos.

Jovem: Desembaraçar os fios?

Filósofo: Exatamente. Neste momento, nossos fios estão embaraçados nos de outras pessoas. Está uma confusão, e você está vendo o mundo nesta condição. Vermelho, azul, marrom, verde, etc.: todas as cores estão se misturando. Você acha que é “conexão”, mas não é.

Jovem: Então, para você, o que é conexão?

Filósofo: Da última vez, falei da separação de tarefas como uma receita para resolver os problemas de relacionamentos interpessoais. Mas eles não acabam só porque você separou as tarefas. A separação de tarefas é, na verdade, o ponto de partida para as relações. Hoje vamos aprofundar a discussão abordando como os relacionamentos interpessoais são vistos na psicologia adleriana e considerando que tipo de relacionamento devemos formar com os outros.

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