NÃO REPREENDA NEM ELOGIE

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Jovem: Tudo bem. Mas você não abordou o ponto essencial, que é a separação de tarefas levando à sensação de comunidade. Primeiro eu separo as tarefas. Penso que as minhas tarefas vão até certo ponto, e tudo além delas é de outras pessoas. Não intervenho nas tarefas alheias e traço um limite para que os outros não intervenham nas minhas. Mas como é possível desenvolver relacionamentos interpessoais com essa separação de tarefas e alcançar a sensação de comunidade de que “é bom estar aqui”? Como a psicologia adleriana nos aconselha a dominar as tarefas vitais do trabalho, da amizade e do amor? Parece que você está tentando me confundir com palavras abstratas, sem entrar em nenhuma explicação concreta.

Filósofo: Sim, você chegou a um ponto importante. Como a separação de tarefas está ligada aos bons relacionamentos? Ou seja, como se liga ao desenvolvimento do tipo de relacionamento em que cooperamos e agimos em harmonia uns com os outros? Isso nos leva ao conceito de “relacionamento horizontal”.

Jovem: Relacionamento horizontal?

Filósofo: Vamos começar com um exemplo fácil: o da relação entre pai e filho. Quer se trate da criação dos filhos ou do treinamento de novos funcionários no local de trabalho, por exemplo, em termos gerais existem duas abordagens: uma é o método de educar pela repreensão e a outra é o método de educar pelo elogio.

Jovem: Esta é uma questão muito debatida.

Filósofo: Qual das abordagens você considera melhor? Repreender ou elogiar?

Jovem: É melhor educar elogiando, é claro.

Filósofo: Por quê?

Jovem: Veja o adestramento de animais, por exemplo. Você pode usar o chicote para ensinar truques aos animais. Esta é a típica forma de “educar pela repreensão”. Por outro lado, também é possível ensinar truques dando comida como recompensa ou dizendo palavras gentis. Isso é “educar pelo elogio”. Ambas as formas podem levar aos mesmos resultados – o animal aprende os truques. Mas, quando ele aprende o truque para evitar a punição, sua motivação é completamente diferente de quando faz isso porque quer ser recompensado. No segundo caso, o aprendizado vem com uma sensação de alegria. Repreender faz o animal definhar, e educar pelo elogio naturalmente permite que ele cresça forte e saudável. Parece uma conclusão óbvia.

Filósofo: O adestramento de animais é um exemplo interessante. Agora vejamos isso do ponto de vista da psicologia adleriana. Segundo ela, na criação dos filhos e em todas as formas de comunicação com outras pessoas, não devemos elogiar.

Jovem: Não devemos elogiar?

Filósofo: A punição física está fora de cogitação, claro, e repreender também não é aceito. Não se deve elogiar e não se deve repreender. Este é o ponto de vista da psicologia adleriana.

Jovem: Mas como isso é possível?

Filósofo: Reflita sobre o ato de elogiar. Vamos supor que eu elogie uma afirmação sua dizendo: “Bom trabalho!” Não seria um tanto estranho?

Jovem: Sim, acho que me deixaria desconfortável.

Filósofo: Pode me explicar por quê?

Jovem: O que é desconfortável é a sensação de que, com as palavras “Bom trabalho!”, estou sendo tratado com complacência.

Filósofo: Exatamente. No elogio existe o aspecto do “julgamento de uma pessoa inábil por uma pessoa hábil”. Uma mãe elogia o filho que ajudou a preparar o jantar dizendo: “Você me deu uma boa ajuda!” Mas quando o marido faz a mesma coisa, pode ter certeza de que ela não vai dizer: “Você me deu uma boa ajuda!”

Jovem: Você tem razão.

Filósofo: Em outras palavras, a mãe que elogia o filho dizendo coisas como “Você me deu uma boa ajuda!”, ou “Bom trabalho!”, ou “Você é demais!” está inconscientemente criando um relacionamento hierárquico e vendo o filho como inferior. O exemplo do adestramento de animais também é emblemático do relacionamento hierárquico, ou vertical, por trás do elogio. Quando uma pessoa elogia outra, o objetivo é “manipular alguém menos hábil do que você”. O elogio não é feito por gratidão ou respeito.

Jovem: Então você está dizendo que elogiamos para manipular?

Filósofo: Isso. A única diferença entre elogiar ou repreender é o uso da cenoura e do porrete, e o objetivo por trás desses métodos é sempre a manipulação. A psicologia adleriana critica a educação por recompensa e punição porque a intenção desse tipo de educação é manipular as crianças.

Jovem: Negativo. Pense nisso do ponto de vista da criança. Para ela, ser elogiada pelos pais não é a maior alegria? Ela se dedica aos estudos exatamente porque quer receber elogios. Ela aprende a se comportar porque quer ser elogiada. Foi assim comigo quando eu era criança. Como eu ansiava por elogios dos meus pais! E isso não mudou mesmo depois de adulto. Quando você é elogiado pelo chefe, a sensação é boa. É assim para todo mundo. Não tem nada a ver com razão – é pura emoção instintiva!

Filósofo: Você quer ser elogiado. Ou alguém decide elogiar você. Isso prova que tanto você como o outro veem os relacionamentos interpessoais como “relacionamentos verticais”. Isso também vale para você: você deseja ser elogiado exatamente por estar vivendo em relacionamentos verticais. A psicologia adleriana rejeita todas as formas de relacionamentos verticais e propõe que os relacionamentos sejam horizontais. Em certo sentido, esse ponto pode ser considerado o princípio fundamental da psicologia adleriana.

Jovem: Isso é transmitido pelas palavras “igual, mas não idêntico”?

Filósofo: Sim. Igual, ou seja, horizontal. Por exemplo, existem homens que atacam verbalmente a mulher. Ela faz todo o trabalho doméstico e ouve comentários como: “Você não está trazendo dinheiro para casa, então cale a boca”, ou “Graças a mim temos comida na mesa”. E tenho certeza de que você já ouviu a seguinte frase: “Você tem tudo de que precisa, então por que está reclamando?” É extremamente vergonhoso. Esse tipo de frase que denota superioridade econômica não tem nenhuma relação com o valor humano. O funcionário de uma empresa e uma dona de casa simplesmente possuem locais de trabalho e papéis diferentes. São “iguais, mas não idênticos”.

Jovem: Concordo.

Filósofo: Provavelmente, eles têm medo de que as mulheres se conscientizem da situação, comecem a ganhar mais do que os homens e, com isso, venham a se impor. Eles veem os relacionamentos interpessoais como verticais e temem ser vistos pelas mulheres como inferiores. Ou seja, têm um forte sentimento de inferioridade oculto.

Jovem: Então, em certo sentido, estão adquirindo um complexo de superioridade e tentando ostentar suas habilidades?

Filósofo: É o que parece. Em primeiro lugar, o sentimento de inferioridade é uma percepção que surge em relacionamentos verticais. Se alguém consegue desenvolver relacionamentos horizontais que sejam “iguais, mas não idênticos” para todos, não há lugar para complexo de inferioridade.

Jovem: Talvez eu tenha consciência dessa manipulação em minha psique quando começo a elogiar outras pessoas. Recorrer à bajulação para cair nas graças do meu chefe – isso certamente é manipulação, não é? E o inverso também acontece. Eu tenho sido manipulado ao ser elogiado por outros. Que engraçado... Acho que sou exatamente esse tipo de pessoa!

Filósofo: Como você não conseguiu romper com os relacionamentos verticais, é o que me parece.

Jovem: Isso está ficando interessante. Por favor, prossiga.

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