CEGONHA ROSA

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Eu sempre fui péssimo em guardar segredos.

Mas Jade era o meu.

As nossas memórias silenciosas. Os olhares sempre distantes. A energia caótica que emanávamos era radiação pura.

Ela se sentia da mesma forma que um cãozinho que caiu da mudança, sempre procurando amor em lugares errados. E porra, eu e meu pai éramos fodidos demais para dar o que ela precisava. Bruce proporcionava uma falsa sensação de segurança, enquanto eu a lembrava da realidade que ela escolheu ignorar.

Jade não quis ficar e, honestamente, eu achei melhor assim. Não queria a sua presença. Era um dia comemorativo. Os meus amigos me receberam como se eu tivesse saído da prisão.

Ao cair da noite, após o primeiro banho descente em dias, eu vesti algumas roupas que Isaac me emprestou. Não me senti desconfortável porque compartilhávamos quase as mesmas medidas e tínhamos o mesmo estilo.

— Você fica bem de calça cargo e moletom. — Dude comentou, sentada na cama e por incrível que pareça, vestida.

Olhei para a loira pelo reflexo do espelho a minha frente.

Dude estava com roupa de festa, porque íamos sair com a galera. Ela não usava muita maquiagem, apenas gloss e rímel. Ainda assim a garota conseguia ser incrivelmente atraente.

— Que milagre você me elogiar. — Eu murmurei, penteando o cabelo para trás. Ele estava maior do que o habitual e a franja que caía sobre os olhos me incomodava. — Na verdade, que milagre você iniciar uma conversa.

— Eu sei. — Ela riu baixo, mexeu na barra do vestido e riu outra vez. — Levi, eu nunca pensei que algum dia diria isso, mas... eu senti sua falta.

— Eu sempre soube que você ainda gostava de mim. — Falei em tom de brincadeira, e em resposta Dude jogou uma almoçada na minha cabeça, bagunçando todo o meu cabelo outra vez. — Ei! — Repreendi.

— Para de ficar se namorando no espelho e vamos logo para a festa! — Dude se levantou e saiu andando em direção a porta.

Estávamos no quarto do Isaac que, apesar de ser minúsculo, permanecia muito aconchegante. As paredes eram de madeira envernizada. Havia poucos móveis, apenas uma cama, criado-mudo o guarda-roupas e uma penteadeira. O cheiro da madeira era muito bom. Eu amaria dormir ali todas as noites. A atmosfera era muito diferente da minha casa.

Noah e Liam entraram no quarto um tempo depois de Dude sair. Eu estava sentado na borda da cama amarrando os cadarços do All Star, porque ao contrário da senhorita Jade Stoorn, eu não usava Jordan.

Noah se aproximou da janela aberta e olhou para a ruazinha pacata do bairro. A luz amarelada do poste de energia refletia no seu cabelo ruivo e o tornava ainda mais laranja.

O clima durante o dia era quente, no entanto a noite a umidade aumentava. Por essa razão a brisa suave se tornava forte o suficiente para impedir que Noah conseguisse acender com isqueiro o baseado que ele tinha entre os lábios.

— Você ainda vai usar? — Liam perguntou de repente. Olhei por cima do ombro. Ele estava de pé ao lado do criado mudo a direita da cama.

— Não sei... — Torci a boca. — Acho que sim. — Dei de ombros.

Liam assentiu com a cabeça loira e após isso tirou um saquinho transparente do bolso com...

Neve. — Eu disse quase em um pensamento alto.

Meus olhos estavam fixos na cocaína e eu sabia que deveria manter distância de problemas pelos próximos noventa dias. Eu poderia morrer se usasse novamente! Pensar nisso fazia o meu estômago revirar. Porém ao mesmo tempo que eu tinha uma sensação de repulsa, havia um desejo incontrolável de usar um pouco e depois um pouquinho mais.

J∆DE (+18)Onde histórias criam vida. Descubra agora