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JJ

  É estranho como você pode sentir a dor física no peito e no estômago quando algo realmente magoa seus sentimentos.
  Sua boca formulando as frases, essas malditas que afirmam, narram e enfatizam um acontecimento o qual nunca fui informado mas me destroçou na mesma ferocidade que a de um vulcão em erupção.
  Ambas pupilas tão vermelhadas, derramam incensáveis lágrimas (as quais eu acredito, talvez sejam verdadeiras) enquanto nem ao mesmo consegue sustentar o contato visual, sempre desvia e encaram o chão.
  Todas as minhas esperanças foram enterradas em um cemitério sem fim, muito provavelmente o meu coração esteja lá também.
  O meu peito já não suporta tamanho sufoco; Estou morrendo gradativamente por dentro e não há nada para ser feito.
  Fiz as pazes com o diabo, apesar dele afirmar que eu jamais veria os portões do céu, ele ainda parece ser a única opção para assumir o posto de melhor amigo que tenho agora.
  Temos muitas pendências, principalmente muito o que conversar, mas não sei fingir que não significou nada.
  Fomos muito, S/n foi essencial para mim.

- Então o Pope... — Tento formular uma frase mas não consigo, é demais para ser verbalizado.
- A Sarah, Gabriella e Sabrina também. — S/n responde por nós.
- Eu... — Sua língua embola-se mediante as lágrimas, o nó na garganta impossibilita sua fala e a compaixão estende-se em meu peito.
  E então, como em um ato de bandeira branca, me permito que por alguns segundos o meu coração aja por nós no exato momento em que entrelaço meus braços em sua cintura, seco suas bochechas molhadas, sussurro em seu ouvido, torcendo para que os cacos espalhados do seu coração partido, se reconstruam; Apesar de tudo, eu ainda desejo o seu bem.
- Você é muito forte. — Aperto-a um pouco mais forte, contra meu peito.
- É a mulher mais forte que eu conheço. — Seco seus olhinhos quase fechados, enquanto aparo seu corpo inquieto que treme descontroladamente, devido ao choro.
- Olha para mim... — S/n soluça tão alto que nem ao menos consegue concluir a frase.
- Eu estou destruída, J.
- Eu sei... — Retribuo o sussurro.
- Mas não serei eu a lhe reconstruir. — Minha frase, apesar de pesada, vem carregada de veracidade.
  Estou sempre acreditando de que todo mundo tem uma parte boa mas esqueço de que eu também tenho.
  Se tem alguém capaz de fazer escolhas, por mais difíceis que elas sejam, esta pessoa sou eu.
  Preciso deixá-la, ir embora da pessoa mais importante da minha vida, justamente para priorizar o mais necessário de todos: o amor próprio.
  A indiferença reina em meio ao caos e cacos de um coração partido.
- Odeio mentiras. — Afirmo, enquanto desvinculo seu corpo dos meus braços e afasto-a para olhar em seus olhos.
- Prefiro saber a verdade e esperar décadas para curar a ferida, do que dormir tranquilo e ser enganado, traído, apunhalado pelas costas.
  S/n compreende perfeitamente, sua cabeça assente de forma que me impulsiona a extravasar tudo o que resguardo aqui dentro; Tenho muito a dizer.
- Você não quebrou somente as promessas, você também me quebrou. — O eco alto vem de dentro, dentro de mim; Sou capaz de escutar os meus pedaços sendo estraçalhados.
- Teve o meu coração na palma das suas mãos e brincou com ele; Não se importou com as sequelas, até porque serão minhas e eu precisarei cicatriza-las sozinho.
- As coisas frias são as que mais queimam por dentro... Eu já devia saber disto. — Desvencilho nosso aperto de mão e levanto-me do sofá.
  Agora, algo tão triste nos domina que a respiração escapa e não somos capazes nem ao menos de chorar.
  Agacho-me a sua frente, ergo seu queixo para fazê-la encarar os meus olhos que de tão tristes tornaram-se tão vazios quanto os dela, entrelaço meu dedo mindinho ao seu tão trêmulo que nem ao menos reage ao toque e sussurro com nossos lábios quase colados.
- Não chore, princesa. — Seco suas lágrimas.
- Não é o fim do mundo. — Sorrio fraco e fingir só faz o meu coração implorar por descanso; Sangrar é tão doloroso quanto bombear sangue.
- Não se apavore, o amor é assim mesmo. Às vezes morre, muitas das vezes mata.
- Eu te perdoo. — Grudo nossas testas.
- Do fundo do meu coração, perdoo você e todos aqueles que mesmo indiretamente, compactuaram com esse jogo sujo de mentira.
- Então nós... — Interrompo sua fala antes mesmo que as expectativas sejam formadas.
- Acabou. — Meu tom de voz sai um pouco mais grave do que o esperado e estou quase me desculpando pela grosseria até me dá conta de que estou sendo pacífico demais para não machucá-la (isso sempre será contra tudo o que eu prezo para nós) e não tenho motivos plausíveis para me redimir.
- Eu desejei você como uma criança aguarda um presente de Natal e cuidei de você como se fosse algo extremamente frágil, porque aprendi desde criança que o amor nasce pelos pequenos detalhes e se perde por qualquer bobeira e eu não queria perder o seu. — Meus olhos ardem freneticamente mas tento a todo custo controlar-me para não desmoronar.
- Mas você não teve a mesma compaixão comigo antes de me ferir brutalmente, com a mesma intensidade que está fazendo agora.
- Mas o meu erro não foi te amar, o problema foi ir embora muito tarde. Eu deveria ter ido na primeira dor.
- Você costumava ser a pessoa que me ajudava a me recompor e agora é a razão pela qual estou desmoronando.
Meu mundo está em chamas e a única pessoa que pode me salvar, é a mesma que ateou fogo em mim.
S/n arde aqui dentro, juntamente com suas mentiras e passado temoroso; Ambos me matam um pouco mais a cada segundo.
Solto o ar e só então, ao sentir a gotícula de lágrima formigando a minha pele, eu finalmente entendi; A nossa infância acaba no exato momento em que choramos com razão pela primeira vez.
Afasto delicadamente os cabelos que grudaram em seu rosto molhado e aprecio minuciosamente seus detalhes, rezando para que mesmo que eu precise lobotomizar o cérebro para esquecê-la, eu não perca seus lindos traços.
- Você sabe que preciso ir embora com a mesma certeza de que sabe que priorizarei você caso insista para eu ficar.
- Então para que eu possa ir em paz, me prometa que ficará bem.
Deslizo a ponta do meu polegar sob seus lábios carnudos e nunca desejei beija-los tanto quanto quero neste exato momento.
Mas não posso, um mísero toque seu será o suficiente para me fazer permanecer em algo que eu sei, irá me adoecer.
- Ficaremos bem. — S/n sussurra tão baixo que quase me pego pedindo para repetir, somente para ouvir o seu tom de voz que serve como música para os meus ouvidos.
- Eu te amo. — Quase como lendo meus pensamentos, S/n não só fala como também verbaliza uma das minhas frases favoritas.
Não sou capaz de retribuir, não faço idéia do que sinto agora.
- Seu coração é de ouro, J... — Seu indicador acaricia lentamente minhas bochechas, em um movimento "sobe e desce", capaz de arrepiar a espinha.
- Mesmo que o mundo tente destruí-lo e às pessoas tentem a todo custo se aproveitarem da sua bondade, entregue o seu melhor. — S/n gruda nossas testas e sussurra com um sorriso cativante nos lábios.
- A humanidade é a sua mulher arma. Você é um ser humano incrível, JJ Maybank.
- E caso algum dia você se senta capaz de amar alguém novamente... — Ela prende não só a respiração, como também resguarda o choro entalado na garganta.
- Se apaixone por mim...
O adeus não é uma despedida e sim uma entrega.
A pior morte é aquela que não nos tira a vida e hoje, eu infelizmente compreendo isso.
O meu falecido filho levou junto com ele uma relação tão forte quanto o luto que queima e despedaça o meu coração em cacos tão bem distribuídos que nem ao menos sou capaz de cata-lós.
S/n tentou ao máximo evitar, mas o momento de ruptura infelizmente chegou para nós.
O nosso amor nasceu na mesmíssima velocidade que a bala perfura a vítima após o atirador apertar o gatilho e morreu da mesma forma.
Beijo suas bochechas rosadas, molhadas e entrelaço seu corpo cuidadosamente.
S/n me enlaçou em um abraço apertado e mentiu pela última vez.
Futuco o bolso, estico seus dedos e repouso a chave de casa na palma da sua mão.
- Passo aqui para buscar as coisas quando você não estiver. — Falo com a voz fanha, tentando ao máximo manter-me forte.
- Construímos, crescemos e edificamos muito juntos, sou o pai do seu filho, tudo que sei e sou hoje é graças ao que você me ensinou, eu lhe devo tudo, uma vida inteira para ser mais exato.
- Estou aqui caso precise de qualquer coisa em relação a gestação, mas fora isso... — Prendo a respiração, dizer é mais doloroso do que sentir.
- Esqueça que eu existo e de uma vez por todas, aprenda que a gente cresce diminuindo o ego e não as pessoas.
Caminho em direção ao topo da escada e olho para trás e digo, talvez, a coisa mais importante dita esta noite.
- Não importa o quanto tentem te desfragmentar, você sempre se refaz nos próprios cacos. — Seus olhos invadem os meus e por um segundo, desejo nunca mais perdê-los de vistas.
- Você não precisa temer a depressão, S/n. No dia que a sua fúria bater de frente com essa doença maldita, ela recuará.
- Não há ninguém tão forte quanto você, é uma pena que não seja capaz de enxergar isso.
Desço os degraus e o som do seu soluço escapado, parte o meu coração mas ainda assim não sou capaz de retornar.
A sabedoria em desistir, foi tudo o que nos restou.

Me ame ou me odeie- JJ Maybank Onde histórias criam vida. Descubra agora