CAPÍTULO 6

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Era domingo e Leo se levantou bem cedo, pois era dia de visitação. O zoológico não abria todos os dias da semana, só no domingo, por questões de segurança. A maioria das pessoas ia no zoológico para ver Novas Espécies, poucas se interessavam pelos animais. Todavia, se frustravam, pois como era apenas um dia, não havia a necessidade de estarem no meio das pessoas. E ainda havia uma equipe de trabalhadores humanos que davam suporte.
Leo gostava de deixar todas as coisas prontas, para quando Dick e seus funcionários chegassem.
Não foi uma surpresa, porém, tudo estar pronto, em seus devidos lugares e Hush e os três leãozinhos já estarem tomando café da manhã.
"Pensei que o castigo era para os separarem." Leo disse pegando um prato e se servindo.
"O castigo já acabou a muito tempo, Leo." Honest, que era Simple, ou... Leo estava entendendo por que quem sabia do rodízio de personalidades deles acabava por aceitar e não contestá-los: era cansativo.
"Então, estão aqui trabalhando, pelo mesmo motivo que foram castigados, as prostitutas."
Eles sorriram e assentiram com as cabeças.
"Devo presumir que elas virão hoje." Dessa vez, quem fez que sim com um imenso sorriso no rosto foi Hush.
"E não iremos pagar." Honest completou.
"Só espero que não causem comoção no meio das pessoas." Leo disse, mas ficava feliz por Hush. Ele estava mais animado e até mais falante, se isso era possível.
"Leo, onde está a chave da jaula daquele urso que morreu?" Leo indicou o painel. As palavras de Dusky o atormentavam. "Vá atrás dela!" Sua mente porém rechaçava a idéia. "Ela me enganou, ela me expôs, ela zombou de mim." Esse era seu mantra agora. Maldito Dusky!
"Já olhamos no painel, não está lá." Honest replicou.
Hush o olhava muito sério. Ele e Leo se comunicavam silenciosamente por olhares a muito tempo e ele dizia "não" com o olhar.
"Por que querem a chave de uma jaula vazia?" Eles aprontavam, Leo sabia disso, mas sua cabeça confusa quase esqueceu disso.
"Então, você escondeu a chave, né, Hush? Você está esquecendo que o dia em que conheceu Lynn, foi o dia em que Daisy quase colocou tudo a perder? Temos que cumprir com nossa palavra." Honest disse.
Hush coçou sua barba, que agora estava bem aparada, cortesia de Candid, e saiu para buscar a dita chave.
" Vou perguntar de novo. Pra quê querem uma jaula vazia?" Leo perguntou, já imaginando que não gostaria da resposta.
"Talvez seja melhor você não saber." Candid disse, encerrando a questão.
Leo se calou. Era melhor não saber, embora se eles fossem fazer o que ele suspeitava, haveria uma confusão. Florest não era um macho que tinha senso de humor. Ele tinha puxado à sua mãe, era sério, comprometido, dedicado. Afável, mas nem tanto. Trisha comandava o hospital com mão de ferro, e Florest, quando tomasse o lugar dela, faria igual.
"Florest não é um macho que aceitaria bem suas travessuras, leãozinhos." Ele se sentiu na obrigação de avisar.
"E é por isso que estamos fazendo isso." Honest disse, um sorriso malvado no rosto.
Eles prepararam uma cesta com guloseimas, separaram um cooler com bebidas, uma pequena churrasqueira e colocaram num jipe.
"Piquenique?" Leo perguntou.
"Sim, vamos levá-las para a colina, perto da cabana do doutor. No alto, há uma clareira bem bonita. Se quiser vir, ainda dá tempo de chamarmos Susan. James estará estudando e Noble não vai." Honest disse.
"Acho que Noble desistiu de prostitutas, pelo que entendi." Leo tomou um gole de café. Quando Candid fosse embora, Leo sentiria falta do café delicioso que ele preparava.
Simple bufou
"Ele é um idiota. Se eu quisesse uma fêmea, não me importaria com a idade dela. E Sara já tem quinze anos . Pelo que entendo de mulheres, ela já tem tudo o que se precisa." Leo pensou nas palavras dele.
Sarah era uma das que apareciam bastante ali, no zoológico. Ela era pequena e magra. Leo nunca a olhou com olhos de macho, ela era uma criança na visão dele.
A equipe de humanos chegou e pôs fim a conversa deles. Leo foi vistoriar as jaulas, as áreas abertas onde os animais ficavam soltos e as baias. Era um trabalho que ele adorava.
E a manhã foi passando devagar. Leo sempre ficava disfarçado no meio das pessoas. Ele passou muitos anos tentando controlar sua calda, para que pudesse colocá-la dentro de uma das pernas de uma calça bem larga. Agora, depois de anos, ele se sentia confortável em até ir em alguma das cidades do entorno. Não que ele fosse, ele não gostava do barulho, nem do cheiro das cidades.
Ele estava encostado em uma baia, observando uma criança que fazia pirraça para não descer do cavalo. Era um filhote macho de uns quatro anos que segurava a crina do cavalo e gritava que não queria descer. Os pais prometiam mundos e fundos para o filhote se ele descesse, mas não estavam conseguindo convencer o garoto.
"Leo." Candid apareceu ao seu lado. Leo estava tão distraído que não o sentiu.
"Ainda não foram?" Ele perguntou.
"Estamos esperando Lynn. E é sobre ela que eu queria falar com você. Acha que Hush está apaixonado?"
Hush apaixonado? Novas Espécies se vinculavam até onde ele sabia. Apaixonar-se era coisa de humanos.
"Na entendi, Simple. Apaixonado? Como um humano? Ou você quis dizer vinculado?" Como não estavam sozinhos, ele o chamava de Simple.
Seria trágico Hush se vincular a uma prostituta. Não por ela ser prostituta, mas porque muitas vezes havia um motivo para ela ser prostituta, pois pelo menos na visão de Leo essa não era uma profissão considerada honrada pelos humanos. E esse motivo poderia ser um cafetão, ou uma família que dependia dela, ou pior ainda: para manter um vício em drogas. Todos esses motivos trariam sofrimento ao seu amigo.
Candid suspirou. Ele ficou em silêncio como que pensando muito bem no que ia dizer. Leo estava aprendendo muito sobre a forma de pensar dele. Candid era um manipulador nato, e manipulação dependia de informação. Informações que ninguém sabia. Coisas que ele pegava no ar, devido ao seu super faro.
"Não acho que ele esteja vinculado. Aprendemos que alguns de nós não se vincula. Mas ele está encantado com Lynn, e ela não é uma prostituta."
Leo ficou esperando Candid se explicar, seu coração disparado. Ele odiava humanos por várias razões, mas a mais forte delas era que não eram confiáveis. E fêmeas humanas eram menos ainda.
"Ela usou o sabonete, mas o sabonete não é páreo para nosso faro. Uma das razões pela qual pagamos Kat e as outras fêmeas muito bem é para que elas fiquem uns dois dias sem trabalhar, mas mesmo assim, se quiséssemos, ainda poderíamos identificar com quem elas compartilharam sexo naquela semana. E como Lynn veio de surpresa, no lugar de Sally, eu dei uma boa examinada no cheiro dela. Ela não esteve com um macho em muito tempo. Estou falando de anos, Leo."
Leo não acreditou.
"Anos? Eu sei que o faro de vocês é bom, mas anos? Me desculpa, Simple, mas você deve estar equivocado."
O leãozinho sorriu condescendente. Leo odiava quando ele se fazia de superior.
"Eu sei que parece demais pra você acreditar, mas estou seguro. Aquela fêmea é quase tão celibatária quanto você. E não foi só isso que senti na pele dela." Candid respirou fundo e olhou em volta.
"O que foi?" Leo perguntou.
Candid estreitou os olhos.
"Acho que devemos conversar sobre isso mais tarde. Só queremos que Hush não saia machucado nessa história, pois nós nos sentiríamos culpados." Ele saiu. Leo queria ir atrás dele, mas sua calda estava inquieta, refletindo seu estado mental, então ele se forçou a acalmar as batidas do seu coração, respirando fundo.
Lynn não era prostituta. Isso só podia significar uma coisa: ela queria entrar na Reserva. Seus motivos não poderiam ser bons, ainda que fosse só por curiosidade. Leo só a viu de relance e seus olhos se fixaram nas pernas dela naquele microvestido que ela usava.
Hush disse que ela tinha lido para ele e que não compartilharam sexo, mas o amigo estava resolvido a não perder a oportunidade na próxima vez.
Leo se certificou de que ninguém olhava para ele e se dirigiu a administração. Se eles ainda não tivessem ido, iria conversar com Hush.
Ele ia andando devagar, quando sentiu algo diferente no ar. Valeriana.
Leo diminuiu seu ritmo e passou os olhos pela redondeza da forma mais discreta que conseguiu. E os viu.
Bem no meio de um monte de visitantes, usando os humanos como escudo entre Leo e eles. E estavam armados. Passaram valeriana nas pistolas, mas Leo podia sentir o cheiro da pólvora.
Leo acenou mostrando que não tinha interesse numa luta ali. O outro Nova Espécie sorriu, cruel, e Leo entendeu que ele queria que Leo o visse, queria que Leo soubesse da existência dele.

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