Leo não conseguia dormir. Sua cabana, um lugar que o fazia se sentir seguro e bem acomodado, não lhe despertava essa sensação mais. Ele devia voltar a sua caverna, talvez lá fosse longe o suficiente dela.
Ele andava de um lado a outro, tinha saltado para o telhado, tinha descido.
Suas mãos ainda sentiam a pele macia do rosto dela e isso tinha acontecido a três dias atrás. Os leãozinhos tinham ido para a casa do senhor Delacour e ele estava enlouquecendo.
Ela continuava no zoológico, tinha ligado para o ex-marido e ele a comunicou que não iria abrir mão da paternidade de Jonathan. Ele estava fora do país, o desgraçado! Jocelyn iria atrás de Jonathan no dia seguinte, mas ela achava que os clones não iriam deixá-la ver o filhote. E isso não ia acabar bem.
Peter veio e conversou com os dois. Não havia jurisprudência sobre esse caso. Nunca um filhote Nova Espécie tinha sido adotado por um humano. Ainda que fosse fácil provar a paternidade, Jonathan tinha um envolvimento emocional com o tal Hoffman. Isso pesaria na decisão do juiz. Fora o escândalo que a mídia faria. E durante todo esse tempo, talvez Jonathan ficasse com Andrew. As chances pendiam para ele uma vez que ele tinha uma situação financeira melhor que a dela, era rico e podia dar atenção integral a Jonathan, diferente dela, que dependia do emprego naquela fábrica de mentiras.
E ela engravidou quando ainda era casada com Hoffman, criou Jonathan escondido do pai de verdade. Um juiz mais conservador levaria tudo isso em conta.
Leo tinha olhado para ela ao ouvir todos esses argumentos de Peter. Ela segurou bem, agradeceu e entrou no quarto que deram a ela. Peter apertou a mão de Leo sorriu para Hush e saiu. E quando o jipe fez o barulho da ignição, ela chorou. Tentando usar o barulho do jipe para esconder o som. O coração de Leo doeu. Ela podia ter feito ele de idiota, mas nenhuma mãe merecia perder seu filhote e ela estava com medo disso acontecer.
Leo só podia imaginar o que ela estava passando. A ligação foi um erro, mas ela se desesperou. Leo só queria dizer que tudo ficaria bem, mas ele tinha dúvidas.
Hush bateu em sua cabana, ele agradeceu aos céus por ter algo para fazer. Talvez tivesse chegado a hora do parto da leoa. Eles fizeram propaganda e agora muita gente queria apadrinhar os filhotes, haveria um sorteio. Um ou outro suborno até tinha sido sussurrado, mas Leo era justo. Se tinham divulgado que haveria um sorteio, seria um sorteio.
Hush sinalizou:
"A luz do telefone está piscando, Jocelyn está dormindo." Leo suspirou. Seu celular estava em algum lugar, provavelmente descarregado. Já estava amanhecendo, quem estaria ligando?
Ele acenou e saíram correndo. Ele já tinha corrido no início da noite, não tinha ajudado, mas ainda era algo bom de se fazer.
O telefone tinha um grande botão que se iluminava quando tocava e ainda estava tocando.
"Alô." Ele disse. Hush ficou observando curioso.
"Leo, que porra! Eu estou ligando a horas. Onde você enfiou o celular? Na bunda?" Era Simple. Ele parecia muito nervoso, então Leo não o repreendeu pela falta de respeito.
"O que foi?"
"Pegamos Jonathan. Mas nós tivemos problemas para trazê-lo, ele não quis vir numa boa, então, mentimos."
Leo rugiu. Deus! E ele pensando que seus problemas eram grandes! Eles acabaram de torna-los maiores!
"Simple, quem mandou vocês se intrometerem?" Agora ele estava sendo idiota. Ninguém mandava naqueles demônios.
"Não temos tempo. Onde você está? E Jocelyn?" Ele suspirou. Ia conversar com Tammy e Valiant e ia sugerir mandar aqueles pestinhas para Fuller! Talvez trabalhar lá, no meio dos bandidos humanos, seria um bom castigo.
"Eu estou no zoológico, ela também está aqui, está dormindo. Ela ligou no começo da tarde de hoje e disse que passaria para pegar Jonathan, o ex-marido disse não. Disse que sabia onde ela estava e que não abriria mão da guarda. Ela está arrasada. E como pegaram Jonathan?"
"Usamos John. Mas depois explicamos. Vá agora ao quarto dela e se deite com ela. Estamos no heliporto iremos para aí. Nós mentimos para ele, inventamos que você e Jocelyn estão vivendo juntos." Leo quase deixou o telefone cair, Hush se aproximou.
"Vocês fizeram o quê? Você mentiram para que ele viesse? Estão loucos?"
"Você vai entender quando o conhecer, foi preciso."
Leo odiava mentiras.
"Não vou mentir para o meu filhote." Simples assim.
"Tudo bem, estamos indo. Mas o spray que lançamos nos clones não vai demorar a evaporar. Quando contar para ele que você e a mãe dele se odeiam, ele vai querer voltar. E aquele lugar onde ele mora é uma fortaleza. Pense bem. Se ele pensar que estão juntos, pode querer ficar e dizer isso ao pai humano dele. Você escolhe." Leo bateu a cabeça na parede.
Jocelyn ressonava, o barulho do telefone não a acordou, por que talvez ela tivesse passado boa parte da noite em claro. Talvez devesse perguntar o que ela achava dessa história.
Leo resumiu para Hush em linguagem de sinais, mas ele não ligou muito para os detalhes quando Leo sinalizou que Jonathan estava vindo. Ele simplesmente correu para a cozinha, é claro que ele faria comida, ele estava feliz por conhecer Jonathan.
Leo não perdeu tempo batendo na porta, entrou e se deparou com ela dormindo seu corpo descoberto. Ela usava apenas uma cueca box, daquelas que o complexo distribuía. Os seios cheios subiam e desciam com sua respiração.
"Jocelyn?" Ele chamou. Ela se virou de costas e ele segurou um rosnado. Ela tinha um corpo atlético, um corpo de uma fêmea que se exercitava. Ela corria, ele se lembrou.
"Jocelyn?" Ele chamou e deu um passo para perto da cama.
"Jocelyn?" Ele tocou no rosto dela. Ela abriu os olhos e o olhou confusa. Depois parecendo se lembrar que estava quase nua, ela puxou o lençol e se sentou apoiada na cabeceira, se cobrindo.
"Leo? Aconteceu alguma coisa?" Ele esperava que ela gritasse, mas ela tinha uma boa reação de resposta, esperou calada.
Ele respirou fundo.
"Os leãozinhos raptaram Jonathan, estão vindo pra cá." Ela arregalou os olhos, mas não disse nada. Leo ficou observando ela fechar os olhos. Parecia aliviada. Será que Simple tinha feito certo?
"Como ele está? Eles o doparam? Como o convenceram a vir? Leo, se eles o machucaram..." Ela se levantou, se virou de costas e vestiu uma camiseta grande, das fornecidas pelo complexo. Ela estava vestindo o que eles forneciam, pois suas roupas ficaram no hotel, e ainda não tinham ido buscar.
"Eles mentiram para ele. Disseram que estamos juntos, que estamos..." Ela o olhou incrédula.
"E ele acreditou?" Ela perguntou, como se acasalar com ele fosse a última coisa que ela faria na vida.
Leo deu de ombros. O barulho do jipe encostando interrompeu a conversa. Ela ia saindo do quarto, mas ele a segurou pelo braço.
"Talvez, devêssemos..." Era difícil até dizer. Mas se Jonathan quisesse ir, talvez demorasse muito a voltar.
"Fingir? Mentir para nosso filho? Não é você quem odeia mentiras?"
"Seria só por hoje. Só dê um tempo a ele para se acostumar. Eu não tocarei em você, iremos só desviar se o assunto surgir, até ele se sentir bem aqui." Ela sorriu maldosa.
"Quem diria..." Leo concordou com ela. Mas era o seu filhote. E ela era muito hipócrita, se o julgasse, uma vez que criou Jonathan mentindo sobre a existência dele, Leo. Ela acenou e saíram para fora. A área de convivência estava uma bagunça com os leãozinhos, John e até Hush sinalizando sem parar. Jonathan estava de costas e ela segurou a mão de Leo com força.
"Eu não gosto de carne muito cozida também, eu já até comi carne crua! O vovô me deu." Ele dizia, parecia animado.
"Então, o papai te deu carne crua e você não me contou." Jocelyn fez cara de brava e pôs as mãos na cintura. Jonathan se virou e voou para ela a abraçando apertado.
"Mamãe! Eu senti a sua falta! Eu queria ir embora, mas o papai disse que você viajou!" Ele a soltou e a cheirou no pescoço, como Leo viu os filhotes fazerem com suas mães milhares de vezes, uma emoção estranha o tomou, sua garganta arranhou, seus olhos arderam.
"Eu senti muito a sua falta também. Estou tão feliz por você estar aqui, filho, tão feliz. Ela o abraçou apertado e fechou os olhos com força. Ficaram assim, se abraçando por um tempo e um silêncio se abateu na área de convivência.
Mas Jonathan a soltou, limpou o rosto, Leo nunca tinha visto um filhote chorar, e o encarou. Leo se viu refletido nos olhos dele. Olhos verdes como os seus, cabelos cheios e loiros como os seus, as mesmas feições. Ele não conseguiu falar.
"Você é o meu pai, não é?" Ele perguntou, seus olhos eram puros, inocentes.
Leo assentiu. Não tinha como falar. As lágrimas queriam descer, estavam inundando seus olhos, ele não podia piscar. O bolo na garganta estava o impedindo de respirar e se ele respirasse fundo, soltaria as lágrimas.
"Eu já comi carne crua." Parecia algo seguro pra se dizer.
"Nao..." Ele engoliu o bolo que estava em sua garganta com força.
"... Não faz mal. Quer dizer, nós podemos comer." Ele se respirou fundo, não fungou, ele respirou fundo.
"É verdade. Tio Harley já me deu carne crua. Eu comi, por que ele tinha combinado comigo, mas eu não gostei. Estava sem sal." John contou.
"Ele ganhou cinquenta pratas do tio Slade. Mas teve que pagar trinta pratas pro meu padrinho não contar pro meu pai, eu era bem pequeno. E teve que comprar um carrinho pra mim, então, acho que ele ficou com muito pouco." Leo agradeceu a sensibilidade de John. Enquanto olhavam para ele, Leo enxugou o rosto.
Jonathan o surpreendeu tocando na ponta de seu cabelo.
"É da mesma cor do meu." Leo sorriu e ele o imitou.
"É, e você é grande pra sua idade, talvez vai ficar maior que eu." Era verdade, Jonathan estava uma cabeça menor que ele só.
"Você acha?" Ele perguntou, uma sombra de sorriso em sua boca.
"Será que vou ficar do tamanho dele?" Ele apontou para Hush. Hush sorriu e se esticou, ele tinha mais de dois metros.
"Altura não significa muito aqui, Jonathan, ferocidade sim, e no quesito ferocidade, minha irmã Daisy ganha de Hush." Honest disse. Eles tinham trocado, estavam vestindo preto e usavam valeriana, Leo não sabia quem ele era.
"Daisy é mais feroz que vocês três juntos." Hush sinalizou. John riu.
"O que ele disse?" Jonathan perguntou.
Leo riu também.
"Ele disse que Daisy é mais feroz que os três juntos e eu tenho que concordar com ele." Jonathan nitidamente queria rir, mas segurou. Ele parecia mais a vontade com John, tanto que se sentou ao lado dele e voltou a comer.
Os leãozinhos se levantaram. Pareciam cansados, estavam até com olheiras. Apesar de tudo, desde que souberam da história de Leo, Jocelyn e Jonathan, tinham se desdobrado para ajudar. E Leo devia a eles. Muito.
Seu filhote estava ali.
"Honest, fique com John no quarto a direita do de Hush. Candid e eu ficaremos com o da esquerda. Com licença." Simple disse, seus irmãos e até John obedeceram sem piscar.
"Você acomoda Jonathan, Leo?" Era uma pergunta com cara de ordem, como só Honest podia fazer. Leo acenou, ele saiu.
"Você mora aqui?" Jonathan perguntou. Ele também parecia cansado.
"Não. Eu tenho uma cabana na zona Selvagem. Há vários quartos aqui, mas acho que você vai ficar com sua mãe, não é?"
"É claro que ele vai dormir comigo. Eu estou com tanta saudade!" Ela o abraçou e ele a beijou no rosto. Leo percebeu que ele a tratava do mesmo jeito que os filhotes pequenos tratavam suas mães. Ele era dependente dela.
"Eu também estou com saudade, mamãe, mas eu acho melhor não dormir com você, eu já estou grande."
Leo acenou.
"O quarto onde Honest e John foram dormir tem três camas, se você..." Ele bateu palmas animado.
"Isso! Vai ser legal dormir com eles! Nós já somos amigos, mãe!" O sorriso dele era contagiante, ela sorriu também.
"Vou pegar roupa de cama." Leo se afastou e foi a rouparia.
"Eu estou feliz, mamãe, por você. Eu sempre quis que você se casasse com o papai de novo, e tinha até raiva, por que você não queria ele mais. Mas era por causa dele, né?" Leo paralisou. O que Jocelyn responderia?
"Lembra que eu disse que quando você fosse grande, ia entender? Nós temos de conversar, filho." Ela desconversou. Leo entendia. Ela o odiava. Ele não sabia porque, uma vez que foi ela que o enganou, mentiu e escondeu seu filhote dele, mas ela queria distância dele. E ele devia querer distância dela também. Devia, mas como o idiota que era, não queria.
Ele pegou coberta, lençol, travesseiro, fronha e toalha nos braços e passou por eles. Chegou ao quarto, bateu e entrou. Honest (ou Candid?), sem camisa estava deitado com os braços atrás da cabeça, uma feia cicatriz cortava seu peito. Leo imaginou o quão terrível devia ser a luta deles pela liderança. Ele voltou os olhos para ele, mas não disse nada.
John já dormia.
"Ei posso ficar com vocês?" Jonathan perguntou e ele sorriu concordando. Candid, com certeza.
Leo começou a esticar o lençol, o filhote o ajudou e logo a cama estava pronta. Ele se deitou e Leo não conseguiu sair.
"Que tal uma história?" Candid zombou.
"Meu outro pai lê pra mim. Mas não precisa, eu estou cansado e..."
Leo olhou para Candid e sorriu maldoso.
"Acontece que eu tenho um livro incrível com uma história incrível e adoraria ler para você. Espere aí." Ele correu até o escritório. O livro que John e Flora lhe deram ainda estava lá. Ele o pegou e voltou ao quarto, sob o olhar curioso de Jocelyn. Quando ele arrastou uma cadeira para perto da cabeceira ela entrou no quarto.
Jonathan se ajeitou e ela se sentou na cama, segurando a mão dele.
"Veja, esse é o livro." Leo estendeu o livro e Jonathan o pegou e examinou.
"Nooossa! Que livro legal!" Ele abriu e leu a dedicatória:
"Para Leo, meu tio preferido, meu tio mais valente, meu tio mais querido, meu tio imponente. Te amo, Flora."
Ele levantou os olhos para Leo.
"A letra dela é muito bonita." Ele disse e leu a dedicatória de John:
"Tio Leo, você é um dos meus heróis." Ele olhou para John dormindo profundamente.
"Ela escreveu a história e ele ilustrou? Esses desenhos são dele?" Ele abriu o livro e correu o dedo pelas ilustrações. Ele suspirou.
"Eu estou cansado, pode ler amanhã?" Ele disse, e Leo não entendeu, mas acenou.
"Na verdade o dia amanheceu, meu amor. Durma, quando acordar, Leo vai te levar para conhecer o zoológico. Tem até um canguru aqui, sabia? O que você acha?"
Ele assentiu e fechou os olhos. Leo e Jocelyn saíram do quarto.
"Ele parecia animado." Leo disse.
Ela entrou no quarto em que estava dormindo e fechou a porta.
"Ele é assim mesmo, muito emocional. Ele fica ansioso a toa, e pode ficar apático e melancólico num instante. Ele parece gostar de John e Honest embora." Ela informou.
"Mas de Simple e Candid..." Leo não viu Jonathan interagir com eles.
"Eles são muito agressivos, ele corre de conflitos, não tem maturidade para lidar com disputas, nem mesmo verbais. Ele tende a ter fortes emoções, tanto as boas, quanto as más. Mas ele te tratará como você o tratar, se for carinhoso, ele será carinhoso."
Leo acenou, porém era muito para absorver.
Ela vestiu uma calça e se deitou. Ele ia saindo, quando ela bateu na cama ao seu lado.
"Só por enquanto." Ela sussurrou. Leo se deitou.
"Se quisermos que dê certo você precisa ter o meu cheiro."

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LEO
Fiksi PenggemarLeo sempre odiou os humanos. Tanto que viver na Reserva, bem na Zona Selvagem o fazia feliz, exatamente por não haver humanos ali. Ele tinha tudo o que precisava: amigos, trabalho duro e uma paisagem linda. Até o dia em que encontrou uma linda human...