O dia estava quente, tendo os raios de sol enfurecidos, fazendo a pele chegar a arder caso alguém ficasse mais do que dois minutos exposto a eles. No centro da cidade havia carro para todos os lados, pessoas transitando pelas faixas de pedestre; um ruído infernal de todas aquelas vozes; pessoas se esbarrando ocasionalmente. Marília, definitivamente, odiava cidade grande.
O calor fez a garota enxugar uma pequena camada de suor que havia em sua testa. Ela havia passado as duas últimas horas na fila do banco, unicamente para pagar o boleto da compra da peça de seu caminhão e lá dentro o ar condicionado à impediu de morrer frita.
Marília caminhou mais alguns passos e parou em um semáforo esperando o sinal ficar verde para os pedestres. Excomungou até os prédios, que não possuíam vida, ao sentir um tranco em seu corpo. Olhou para o lado apenas para ver um garoto engravatado, provavelmente atrasado para a rotina chata em algum escritório, mas seus olhos paralisaram em um ponto fixo antes de voltarem a olhar para a faixa.
Em um dos carros parados na rua vertical com aquela, consequência do sinal estar parado para eles, a figura pequena e delicada de Maraisa se encontrava. Não dentro do carro, senão limpando as vidraças do veículo.
Seu coração disparou e o sinal abriu para ela passar, abrindo também para o carro onde Maraisa estava, já que era do outro lado. A maior não se importou em atravesar faixa ou qualquer coisa semelhante, apenas assobiou alto, tendo vários rostos virando-se para ela, mas ela unicamente notava um: O da garota que virou o pescoço e estava prestes a voltar a olhar para a frente, mas a imagem de Marília a prendeu. Ela abriu o sorriso que mais iluminou o ano de Marília ao ver que realmente era ela. O olhar de Maraisa foi surpreso e ela ergueu seus olhos para o chapéu na cabeça de Marília, sorrindo maliciosamente, porém com um toque de doçura que fazia o coração de Marília duplicar a velocidade de batimentos por segundo.
A menor colocou o pequeno rodo, o borrifador e sua flanela em um cantinho ali, ao lado de Lua, que agora usava sua nova coleira, e se aproximou de Marília. Maraisa parecia meio abatida, como se tivesse dormido pouco e ainda usava a mesma roupa de dois dias atrás. Em seus olhos havia pequenas olheiras, mas isso não fez dela menos bonita, apenas mais cansada.
- Hey... - Ah, aquela voz! - Marília pensou que jamais voltaria a ouvir aquela doce melodia. - Você comprou um. - Ela disse apontando para o chapéu de Marília e a maior assentiu, ainda sem reação.
- Eu precisava de um novo. - Marília disse, vendo que Maraisa ainda usava o boné que ela lhe havia presenteado. - Você já almoçou? - Maraisa negou e Marília assentiu. - Gostaria de ir almoçar comigo?
- Eu, huh, não sei. - A garota disse e Marília suspirou.
- Certo. - A maior disse, mexendo inquieta em seu chapéu.
- Esta noite ainda estará aqui? Eu vou ficar aqui até umas seis horas, lá para esse horário eu já terei conseguido dinheiro para almoçar e então poderíamos ir jantar. - Marília franziu o cenho.
- Não vai almoçar comigo porque não tem o dinheiro? - Marília perguntou e Maraisa assentiu, olhando para Lua. - Não seja tola. Eu te convidei para almoçar, então eu pagarei.
- Eu não gosto de abusar. - Maraisa disse fitando as orbes castanhas. - Você já me bancou a viagem inteira...
- Mara, eu quero muito saber o que fez nesses dois dias e, hm, quero que almoce comigo. Por favor? - Maraisa piscou desconcertada antes de responder.
- Só se eu ganhar um abraço. - Ela queria pedir um beijo, mas as coisas haviam sido casuais, não? E se Marília não a quisesse mais?
- Essa não é uma missão impossível, eu acho. - Marília brincou sorrindo abertamente e Maraisa suspirou embasbacada.
- Gata, eu posso ter vindo no seu caminhão, mas foi no seu sorriso que eu viajei. - Marília gargalhou ao ouvir aquilo e logo envolveu Maraisa em seus braços, em um abraço apertado.
- Você tem sorte de ser bonita, porque suas cantadas são horríveis. - Marília disse, sentindo Maraisa inalar seu cheiro antes de se afastar.
- Não ofenda a minha cantada. Ela foi exclusivamente para você. - Maraisa brincou e Marília assentiu, rindo. A menor caminhou até onde estava e pegou suas coisas, indo até Marília novamente. - Lua, vem! - Ela gritou e a gata correu em sua direção. Marília estranhou Maraisa estar com o saquinho de lingeries ali e a ração de Lua também, mas optou por não dizer nada.
Não foram à um lugar muito longe, algumas quadras dali no máximo. Lua ficou parada do lado de fora, deitando-se na sombra de uma mesa vazia quando Maraisa disse que ela não poderia entrar. As garotas adentraram o lugar e se sentaram ao lado de uma grande janela, dali poderiam ver Lua. Fizeram seus pedidos e esperaram.
- Por que ainda está aqui? Não era para ter partido esta manhã? - Maraisa perguntou, virando-se para Marília. Ela havia se sentado ao lado da garota e não à sua frente como deveria.
- Não vai acreditar na minha sorte... - Marília disse, retirando o chapéu preto de sua cabeça exatamente como Maraisa fez e o colocando na cadeira da frente. Maraisa se virou para ficar de frente para Marília e a maior copiou seu gesto. - Meu caminhão quebrou. Encomendei uma peça, mas só vai chegar em dez dias. - Explicou. - E você, conseguiu visitar o túmulo da sua mãe? - Maraisa abaixou a cabeça no mesmo momento e assentiu. - Hey... desculpe tocar nesse assunto, Maraisa. Não fique triste. - Marília disse, tocando em seu queixo para que a garota lhe olhasse.
- Não se preocupe, estou bem. - Maraisa disse sorrindo fraco.
- Por que carrega as suas coisas consigo? - Marília finalmente perguntou. - Onde está ficando, Mara?
- Eu meio que não estou ficando em lugar nenhum. - Ela disse envergonhada.
- Por que me olhou desse jeito? - Marília perguntou ao ver Maraisa lhe fitar e fechar rapidamente os olhos, negando com a cabeça.
- Não te olhei de jeito nenhum.
- Olhou sim. Por quê? - Maraisa respirou fundo e, com olhos cansados, fitou Marília.
- Por que eu menti para você, Marília.
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Destino Incerto - Malila
FanfictionMarília Dias Mendonça é uma caminhoneira; levava a sua vida na tranquilidade das estradas de todo o país. Aos seus vinte e sete anos não se via fazendo outra coisa senão dirigir, exatamente como seu pai a ensinara. A garota possui mais duas irmās ad...