Só existem dois dias no ano

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Ainda na delegacia.

- Então agora já está liberada? - Bruna perguntou.
-Sim. - Taís sorriu e olhou para cima aliviada. Tornou a colocar os óculos escuros. Elas saíram da delegacia e foram em direção ao carro no estacionamento.
- Entra, vou te deixar lá no apartamento. - Bruna pegou as chaves do carro na bolsa.
- Não se preocupe, posso pegar um táxi. Já está tarde... - Taís falou preocupada, pois já passava das seis da noite.
- Não senhora, justamente por isso vou te levar em casa. Taís, você tem que evitar andar na rua sozinha enquanto não capturarem o Arthur. - Bruna argumentou.
- Tudo bem.... - Taís falou concordou, e logo entrou no carro.
Enquanto Bruna dirigia, elas conversavam:
- E sua família? Amigos? Você não pode conversar com eles? - Bruna perguntou.
- Meus pais... Morreram ja ha algum tempo. - Taís lamentou e continuou: - Eu tenho apenas uma irmã que mora em Londres. Ela é mais velha, tem diabetes e usa uma válvula no coração...Com certeza, do jeito que é preocupada, pegaria o primeiro vôo para cá, não queria passar essa preocupação para ela...
- Sinto muito pelos seus pais.... - Bruna lamentou com empatia: - Sobre sua irmã, acho que é válido você conversar com ela, que seja aos poucos, não solta tudo de uma vez...
- Vou pensar como posso fazer isso. Na verdade o que eu preciso é voltar a trabalhar, foi muito difícil conseguir a vaga no jornal, se eu continuar faltando assim, vão me substituir... - Taís estalou os dedos.
- Você vai trabalhar então, conheço uma pessoa que trabalha com maquiagem de efeitos especiais e que faz justamente em novelas, filmes, ela é ótima. Amanhã cedo ela vai te maquiar, vou pedir para ela te auxiliar todos os dias até sumir por total essa marca. - Bruna falou confiante enquanto dirigia.
- Bruna, realmente não sei como te agradecer por tanto. Quero manter sigilo sobre isso no trabalho, não me sinto confortável.
- Não se preocupe com isso, esse assunto está apenas entre a gente.
Elas conversaram mais um pouco intercalando com alguns momentos em silêncio. Não demoraram a chegar. Taís saiu do carro, Bruna continuou ao volante. Taís deu a volta e se posicionou frente a janela da Bruna.
- Sinto que pode nascer uma amizade muito especial entre a gente. - Taís, apoiou uma das mãos no batente da janela,com a outra abaixou o óculos e sorriu para a Bruna. Os olhos das duas se encontraram, eles se comunicavam sem palavras. Bruna sorriu e tornou a sentir frio na barriga. Aquilo deixava ela extremamente nervosa.
- Acho que já nasceu... - Bruna falou com timidez, mas muito segura.Taís se desconcertou com timidez.
-Preciso mesmo ir... - Bruna falou ao ver o avançar da hora no relógio do carro, deu então a partida, Taís subiu para o apartamento.

Já passavam das sete da noite quando Bruna entrou em casa.Tinha um tempo que não chegava tão tarde. Rodrigo estava no sofá da sala assistindo TV, estava sério.
- Boa noite... - Bruna falou colocando as chaves no aparador ao lado da porta.
- Boa noite. - Rodrigo respondeu seco.
- Nandinha já foi dormir.
- Não, ela está no quarto brincando. Mas já dei banho, janta e ajudei com o dever... - Rodrigo falou com tom ainda seco soando como uma  reclamação.
- Rodrigo? Algum problema? Quer dizer... Você não fez mais do que sua obrigação.
- Claro... - Rodigo respondeu em deboche.
- Você quer falar alguma coisa?
- Você sabe muito bem que não dividimos as coisas assim durante a semana.
- Então você quer ser pai só de final de semana? - Bruna respirou fundo, revirou os olhos, estava muito cansada e precisava se arrumar para dormir, acordava de madrugada para trabalhar.
- Não falei isso Bruna, mas onde você estava? Porque passou o dia inteiro fora?
- Quem é você para me cobrar? Ah sim!O professor que dá aulas até tarde da noite... - Bruna se exaltou. Fernanda ouvindo os pais, apareceu na sala.
- Oi querida... Está tudo bem? - Bruna pegou a menina no colo.
- Mamãe, me coloca para dormir? - menina pediu coçando os olhos.
- Claro meu amor. - Bruna levou a menina no colo para o quarto, porém antes de sair da sala, cerrou os olhos e encarou o Rodrigo com raiva, ele cruzou os braços e virou o rosto para o outro lado.
Bruna colocou Fernanda para dormir em seguida foi tomar banho. Logo após o banho, deitou na cama cansada, esparramada, colocou as mãos na barriga, respirou fundo e fechou os olhos para relaxar. Estava chateada com o comportamento do Ricardo, ele sempre fazia isso. Na verdade se sentia cansada naquele relacionamento, exausta. Ao mesmo tempo ela o amava, tinham construído uma história juntos. Tinham a Fernanda, fruto disso. Era tão complexo e tão cansativo. Bruna sabia claramente que o relacionamento estava estacionado e ela não sabia como reverter. Entraram para um grupo de casais na igreja há três semanas atrás, mas Bruna tinha a impressão de que Ricardo estava dando em cima da coordenadora do grupo. Resultado, eles estavam faltando às últimas reuniões. Ela se perguntava o porquê de tanta insegurança, "vamos voltar as reuniões ", pensou. Respirou fundo novamente e em meio aos seus pensamentos, acabou adormecendo atravessada na cama. Seu celular piscou, era mensagem da Taís...
Ricardo chegou no quarto e viu a esposa atravessada na cama apagada. Desconfiado, ele pegou o celular dela e mesmo com o bloqueio, ele conseguiu ver por alto a mensagem da Taís. Estava escrito: "Só existem dois dias no ano que nada pode ser feito..."
Ricardo franziu a testa e balançou a cabeça confuso, não conseguiu ler além daquilo, mas quem afinal seria a Taís? Conseguiu se encaixar na cama sem acordar Bruna.

Passaram três semanas, e as coisas foram caminhando. Taís continuava morando no apartamento da Bruna, ainda não haviam encontrado o Arthur. A amizade de Bruna e Taís se estreitou bastante, elas estavam sempre juntas, inclusive Bruna levava Taís para caminhar na praia algumas vezes com a Flávia que adorou a nova amiga da Bruna. Inclusive estava dando altos conselhos de mulher divorciada. Elas conversavam bastante. Bruna gostava de admirar a Taís que estava livre e assim ela ficava tão leve, divertida e também muito inteligente. Seus olhos já não são mais tristes e quase não  carregavam mais marcas. Ela se sentia orgulhosa de ter ajudado a Taís sair daquela situação.
As vezes Taís se sentia apreensiva com medo do Arthur, mas estava sempre acompanhada pela Bruna e se sentia segura por isso.
Apesar de tudo, as coisas em casa continuavam na mesma. Ela e  Ricardo continuavam sem se entender e isso a deixava sempre aflita.
Foi buscar Fernanda na escola e levar para a natação. Chegando na natação, Ricardo estava lá, Bruna se assustou, ele deveria estar dando aulas. Ela franziu a testa e a menina gritou feliz:
- Papaiiii! - correu em direção ao pai que a pegou no colo. Bruna se aproximou.
- Oi?! - perguntou confusa com os braços cruzados.
- Oi... Eu vim para ver Nandinha nadar e passar um tempo com vocês. - Rodrigo falou sorrindo e deu um selinho na Bruna que ainda estava confusa. A professora de natação se aproximou e falou:
- Opa Nandinha! Os papais vieram juntinhos hoje para ver a peixinha nadar. - a professora sorriu para o casal. Rodrigo estava sorridente, feliz, entretanto Bruna ainda estranhava aquela inciativa. Ele não era de fazer isso, pensou, deve estar querendo alguma coisa...
Enquanto Fernanda nadava com os ceguinhas, Bruna e Ricardo ficaram sentados juntos na arquibancada.
Bruna tomou a inciativa:
- O que te trouxe aqui, em plena quarta-feira, no meio do horário da aula?
- Amor, eu não posso ficar com minha família? Passar um tempo? - Rodrigo estava carinhoso e tentava quebrar um pouco o gelo com a Bruna. Ele acariciou os braços da esposa. Ela sorriu discretamente e olhou nos olhos negros do marido.
- Eu fico muito feliz com isso... Não sabe o quanto esperei por você com a gente.
- Então, apenas curta comigo. Olha a peixinha. - Ricardo acenou para a menina que nadava apoiada em uma pranchinha de criança e acompanhada pela professora. Bruna encostou a cabeça no ombro do marido e por um segundo sentiu aquele amor do passado. Seu telefone tocou, ela olhou no identificador da chamada, era a Taís. Ela sentiu seu corpo tremer por dentro, seu coração acelerar e não podia compreender porque sentia isso quando Taís ligava ou quando estava perto dela. Ricardo notou o nervosismo da mulher e perguntou:
- Não vai atender?
- É...Eu... É do trabalho, prefiro não atender. Quer dizer, não deve ser nada demais. - Bruna se enrolou para falar e guardou o telefone na bolsa. Ricardo ficou desconfiado, mas relevou. Ele falou:
- É nesse final de semana que vai ter aquela confraternização no resort?- todos os anos, próximo do final do ano, o grupo inteiro da área jornalística da emissora iam para um resort confraternizar. Era muito divertido, contudo já tinham pelo menos quatro anos que Bruna não ia, primeiro por conta da Nandinha, era muito pequenina, depois o Ricardo sempre tinha que dar aulão e simulado de pre vestibular.
- Sim... Mas normalmente a gente não vai... Quer dizer, você sempre tem o simuladão... - Bruna falou cabisbaixa.
- Esse ano eu quero ir, estamos precisando ficar juntos. Bruna, eu realmente quero tentar... - Ricardo falou olhando sinceramente nos olhos de Bruna. Ela sorriu feliz, mas pensativa ao mesmo tempo, seus olhos não tinham mais conexão com os do Ricardo. Talvez ela tivesse perdido o interesse...Aquilo fazia Bruna se sentir conflituosa, sofrer. Eles haviam se perdido como um casal, ela não duvidava disso. A princípio não tinha um culpado, simplesmente aconteceu. Ela respirou fundo algumas vezes, e no fin eles ficaram  conversando sobre a Fernanda, trabalho, enquanto observavam a filha nadar.

"Só existem dois dias no ano que nada pode ser feito. Um se chama ontem e o outro se chama amanhã. Hoje é o dia certo para amar, acreditar, fazer e principalmente viver."
Dalai Lama

A Previsão do AmorOnde histórias criam vida. Descubra agora