02

425 65 126
                                    

Um príncipe encantado. Sempre sonhei com um príncipe encantado, igual aquele da Cinderela, ou da Branca de Neve, algum que viesse para me amar, me proteger, que tivesse olhos para mim, que caminhasse comigo, lado a lado. Eu só queria me apaixonar perdidamente e ser correspondida, me guardei para aquele que fizesse meu coração bater descompassado, o futuro amor da minha vida. E em um piscar de olhos, tudo isso vai pelos ares.

Várias amigas riram de mim, me chamavam de boba por esse sonho louco, pela minha decisão, o que elas pensariam agora, se me vissem assim? Se soubessem que estavam certa, e de que tudo aquilo era mesmo uma grande bobagem?

Para que esperar tanto? Qual foi a recompensa de tudo aquilo? Um grande e imenso nada me domina, estou devastada, vazia, miseravelmente vazia, e ao mesmo tempo cheia. Cheia de dor, desespero, tristeza, desolação. Vazia de qualquer resquício de alegria, sonhos, esperança.

Ele levou tudo, e nem pediu desculpas, roubou a minha inocência, minha pureza, meus sonhos, e só me deu dor em troca, traumas, horror. Estou quebrada de tantas maneiras diferentes.

Por que comigo? São perguntas não respondidas, nunca vai haver uma resposta, eu só ia para a faculdade, era apenas uma garota passando em uma rua pouco movimentada, indo estudar, passo a passo chegando mais próxima do seu sonho, até tudo acabar, ser interrompido de maneira abrupta, cruel. Sim, acabou, eu não consigo mais me ver passando naquela rua, ou indo para aquele curso o qual foi o motivo de eu sair de casa.

Culpa sua, ele disse. Se não tivesse vestida assim, pedida para ser comida, nada disso estaria acontecendo, eu não teria olhado para essa bunda gostosa, meu pau não teria endurecido na calça pedindo para se enterrar no meio das suas pernas, se vestiu como uma vadia, vai ser tratada como uma. Eu chorei, esperneei, implorei por clemência, pedi desculpas pela minha roupa, mas nada disso adiantou. Todas as minhas lamúrias, minhas lamentações, pareciam aclamar ainda mais o monstro dentro dele, que avançava mais e mais contra o meu corpo já dolorido pelas surras.

— Você me ouviu, Catarina? — saio do meu torpor quando alguém dar uma batidinha no meu braço, chamando minha atenção.

Me assusto com o movimento e salto da cama, fazendo com que minha tia se assuste também. O movimento me causa uma ardência na vagina, a dor me lembrando de tudo que me aconteceu, marcando-me como mais um número nas estatísticas de estupro no nosso país.

— Catarina, se acalme! — alguém pede, viro para olhar e vejo outra mulher que não havia visto ainda, me encarando com ternura.

Afasto-me dela, por instinto, observo suas vestes, está de branco igual a outra médica, meus olhos a varrem de cima a baixo até parar nas palavras em seu peito, ali, escrito com letras elegantes está escrito Doutora Amanda Novais, psicóloga. Levanto meu olhar novamente, e vejo que está esperando que eu termine meu escrutínio silencioso, fico levemente envergonhada pela falta de discrição, mas não ouso abaixar a guarda.

Ela rir para mim, e da mais um passo em minha direção, abraço meus próprio corpo, procurando desesperadamente me proteger, mas proteger de que? Ela é só uma médica, e tudo já aconteceu mesmo.

Doutora Amanda começa a falar algumas coisas, um monte de palavras que não presto atenção, eu não quero falar com ela, não quero ter que contar tudo o que me aconteceu na frente da minha tia, eu vi como ela ficou quando viu os cacos em mim, ela não precisa saber detalhes, e eu não quero relembrar tudo novamente.

Ando depressa até tia Abgail, que está parada ao lado da cama a qual me levantei, encaro os seus olhos para que entenda que desejo ir para casa, vejo em seu olhar que não sabe o que fazer, então viro-lhe as costas e sigo para a porta. Quando saio do quarto privativo do hospital me assusto, dois policiais estão a postos na porta, ao perceber minha presença se aproximam.

Um Toque Para O Amor Onde histórias criam vida. Descubra agora