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Desço do carro para abrir a cancela da fazenda, a brisa suave da tarde beija o meu rosto, fazendo meus cabelos cor de ouro esvoaçarem, fecho os meus olhos e ergo a vista para o céu, agradecendo mentalmente ao criador, por nunca me abandonar, o cantar de um pássaro branco me faz rir, é como se o senhor estivesse respondendo minha oração silenciosa.

O zumbido do motor me faz voltar a realidade, abaixo a cabeça novamente e abro os meus olhos, me deparo com um par de olhos serenos me observando ao longe, fico parada no lugar, o observando me observar, ele parece enfeitiçado, sinto que uma descarga elétrica me atinge no peito, o pássaro volta a cantar, quebrando o encanto de nossos olhares, abro um sorriso tímido para ele, que devolve com um menear de cabeça.

Faço os meus pés correrem até a cancela, destravo a tranca e empurro a mesma, meu pai demora um pouco, franzo a testa para ele que balança a cabeça tentando organizar seus próprios pensamentos e acelera com a camionete. Assim que ele passa corro outra vez para dentro do carro, e ele me encara com um olhar diferente. Estranho sua reação, e meneio a cabeça, indagando com um gesto.

— Esse rapaz gosta mesmo de você! — Meu pai diz, me pegando de surpresa. — E você, dele. — Conclui, me deixando ainda mais surpreendida.

Balanço a cabeça em negativa, dizendo que não é nada disso que ele está pensando. Meu pai sorri, descrente, e volta a falar.

— Filha, eu já vivi bastante tempo para saber quando algo está acontecendo com duas pessoas que se sentem atraídas uma pela outra, você pode negar, mas seus olhos mudam quando olha para esse rapaz. E quando ele te olha, eu sinto que ele esperaria você por anos.

O encaro, sem palavras. Sempre considerei o meu pai um homem inteligente, sábio com as palavras, com a vida. Ele não seria um dos maiores fazendeiros da região se não tivesse toda uma sabedoria, mas dizer que o Eduardo me vê como algo além de uma garota problemática que se veste mal, e que estaria interessado em mim, nunca me pareceu tão louco.

Eu gosto da amizade do vaqueiro, gosto de me sentir bem com ele, de conversar, sorrir, gosto da liberdade de toca-lo e ser tocada, de como ele me faz companhia para que eu durma, sentado em uma poltrona, nunca chegando mais perto do que o suportável. Mas isso é ele tentando me ajudar, ele sendo uma pessoa de um bom coração, e não por sentir algo a mais por mim.

Abro a porta do carro já ouvindo latidos animados, e antes mesmo que os meus pés consigam tocar o chão, duas patas eufóricas estão tocando minhas pernas, sorrio para Pitoco que parece querer falar de tão animado que está. Agacho perto dele e me desequilibro quando o mesmo lambe o meu rosto, me fazendo sentar no chão para não cair.

— Esse cachorro só falta entrar em desespero quando você não está. — ouço a voz de minha mãe, e sorrio ainda mais para o meu companheiro de quatro patas

Após o momento de saudação entre eu e minha bolota amarela, levanto-me do chão e bato a terra da roupa, ando a passos curtos até mamãe, deposito um beijo em sua bochecha, ela se surpreende com o gesto, fazendo seus olhos marejarem, abro um sorriso ameno para ela e entro na casa.

Miguel está sentado em frente a televisão, assistindo o jogo do flamengo, nosso time do coração. Eu e ele sempre assistíamos os jogos juntos, torcendo e gritando animadamente, já chegamos até a comprar foguetes para quando tinha jogos mais importantes. Olho para ele que me encara sem emoção, abro um sorriso sem graça e faço menção de sentar no outro sofá, mas antes mesmo que eu me acomode ouço um bufar vindo dele, que ao mesmo tempo joga uma almofada de lado, se levanta e vai embora, me deixando apenas com o som da tv.

— Miguel? — mamãe chama, tentando repreendê-lo, mas ele parte, sem olhar para trás uma vez sequer.

Ergo-me do sofá, e vou para o quarto, trancando a porta com a chave, antes que minha mãe entre e veja o rio de lágrimas que banha o meu rosto.

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