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Corre, Catarina, corre.  É o que repito em minha mente, mas meus pés parecem estarem plantados no chão.

O homem também paralisou, me encarando, como se estivesse surpreso com a minha reação, com meu grito desesperado, sinto vontade de gritar com ele, de xingar, de ligar para a oficial que me prometeu que iria pega-lo e dizer, ele está aqui de novo sua filha da puta, na minha frente, prestes a repetir o que fez a dois anos atrás. Mas não faço isso, não posso fazer isso, não consigo.

Ele parece ter recuperado a sua razão, pois para alimento do meu desespero, da mais um passo em minha direção. Lembranças continuam me atingindo, eu usando a minha força, tentando lhe chutar, lhe morder, fazendo tudo que podia para me livrar daquele pesadelo, lá eu não consegui. Mas aqui eu posso ter uma chance, pois eu prefiro desser rolando por essa escada e quebrar o pescoço, do que passar por tudo aquilo novamente.

— O que você tem? — ouço sua voz, a mesma voz que falou comigo naquele dia, a mesma voz, só que sem a bebida.

Dou um passo para trás, um soluço escapa de meus lábios, assim como o tremor intensifica no meu corpo.

— Quem é você? — pergunta novamente, e é aí que compreendo, eu sei quem é ele, mas ele não sabe quem sou eu.

Como diz aquele ditado, quem bate esquece, quem apanha lembra.

Tenho vontade de gritar em sua cara e dizer que eu sou a menina que ele destruiu, mas isso não seria inteligente da minha parte, em contrapartida, não é porque ele não se lembra que não pode querer fazer novamente. Não estou com a saia rodada azul, mas coloquei uma calça um pouco justa, maldita calça justa, como pude fazer a besteira de vestir algo que chamasse atenção?

Odeio quando ele olha para o meu corpo, para a calça que estou vestida. Odeio pensar que ele está imaginando um jeito de arrancar a peça do meu corpo, odeio que eu esteja tão ferrada da cabeça a ponto de preferir escadas solitárias do que um elevador com gente dentro. Odeio pensar no porque de um estuprador fazer a mesma opção que a minha.

Será que ele sabe que ferrou tanto com a cabeça de suas vítimas a ponto de fazê-las preferir escadas? Será que ele costuma encontrar elas numa situação tão vulnerável quanto essa, e aí repetir o que fizera da outra vez?

— Vou perguntar só mais uma vez. Quem diabos é você e por que está agindo assim? — sua voz repugnante entra nos meus ouvidos, assim como suas duas mãos estão uma de cada lado dos meus ombros.

Um suor frio rola pelo meu pescoço, assim como o pavor que trava a minha garganta, me impedindo de respirar.

Ar.

Eu preciso de ar.

Puxo o fôlego com força, assim que sinto dedos ferirem a minha pele.

Reage, Catarina, reage.

Ouço meu cérebro gritando através do meu medo.

E num empulso encorajador, levanto minha perna até uma autura considerada ideal, e atinjo aquela parte que destruiu a minha inocência.

O homem larga meus ombros e se curva com a dor, aproveito a deixa e viro-me de costas, correndo, desesperada, como se a minha vida dependesse disso, e no final das contas, de fato depende.

Forço os meus pés a trilharem o caminho de volta, luto contra o barulho ensurdecedor da minha mente, do meu coração, tento não pensar em nada que me faça parar. O pânico ameaça me consumir a cada segundo, o engulo goela a baixo, dessa vez eu tenho uma chance de escapar, a agarrarei com unhas e dentes.

Ouço passos pesados atrás de mim, sei que ele se recuperou e vem vindo, continuo a correr, não ouso parar, muito menos olhar para trás. Preciso ser mais rápida, tenho que encontrar a saída. Meu pai está lá embaixo, ele vai me proteger, só preciso chegar até ele.

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