Sete

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Quando alguém está desempregado e desesperado por dinheiro, acho que aceita qualquer emprego, né? Engraxate, vendedor de jornal, cuidador de porcos, se brincar, até limpador de fossa. Acredito que qualquer um desses empregos serviria para mim, contanto que me pagassem. ME PAGASSEM. Eu não quero parecer mercenário, mas tinha pressa em tomar minhas terras de volta. Porém, lá estava eu, numa fazenda isolada no interior do Rio. Sozinho, junto somente do professor Tobias. E o principal, sem ganhar um tostão, um que seja. Isso há cinco meses.

 Eu não iria cobrá-lo, prometi a mim mesmo que faria isso só depois do teste final. Então tive que engolir aquela vida laboriosa.

“Somos espiões” disse-me ele na primeira vez em que pisei naquela fazenda. “Espiões! Ou seja, antes de aprender qualquer coisa sobre seu medo, precisa a aprender a ser invisível” Tobias costumava dizer que o propósito de nossa existência, era não existir. Eu não sabia que tipo de tarefa teria que executar como espião – sempre que perguntava, ele fugia do assunto como um verdadeiro político –, mas de todo modo, entendi que precisaria ser invisível, garantir que os outros não descobrissem o que eu fazia. A vida normal e tranquila delas dependia disso.

 Tobias me ensinou o ofício de ser um fantasma para as pessoas e, não só isso, tudo o que estava incluso no trabalho. Tive que aprender artes marciais. Nada profissional e exagerado a ponto de derrubar um gorila, só o suficiente para me defender caso ficasse em apuros, embora não levasse jeito para aquilo de maneira nenhuma – eu não era muito diferente de uma taquara se movendo. Além de meu medo, ele também mencionou que eu precisava de uma arma branca, para não depender completamente desse poder, por isso, também me instruiu a usar o saxo. Não queria ter que manchá-lo ou o acabar quebrando, afinal de contas, uma relíquia milenar dessas deveria ser guardada com cuidado. Mas ele me convenceu, quando disse que uma ferramenta que serve para ser guardada é uma ferramenta inútil.

Primeiro, aprendi como pegar no cabo da faca, até isso fazia errado. O resto não foi tão difícil. Segundo ele, tudo o que me ensinou seria apenas o básico. Estocada, ataque alto, baixo e rápido. Ele também me presenteou com adagas pequenas para que praticasse arremesso. Havia diferença de velocidade dependendo de qual golpe escolhesse usar.

Com a estocada, por exemplo, tinha de manter a mão firme no cabo e acelerar com precisão num único ponto do alvo. O professor Tobias disse-me que eu não tinha forças para estocar várias vezes seguidas, por isso, escolher o local certo da investida era crucial para a vitória contra o adversário e, se o fizesse numa parte não muito eficaz, correria o risco de sofrer um contragolpe fatal. O professor costumava chamar os locais certos de "Triângulo da Morte". Qualquer golpe num dos "pontos" deste triângulo traria uma morte eficaz e rápida ao inimigo. No topo do triângulo está o coração. A estocada no coração pode ser fatal instantaneamente, interrompendo o bombeamento do sangue. Um dos pontos da base, são os pulmões. Se um dos pulmões for perfurado por uma estocada, pode causar a perda da capacidade de respiração e levar à morte por asfixia. Por fim, no outro ponto da base estão as artérias principais. As estocadas em artérias principais, como a aorta ou a carótida, podem causar uma perda significativa de sangue e levar à morte por hemorragia.

Já em relação ao ataque alto, ele precisaria ser feito no pescoço, com uma abertura ampla. Em outros casos, apenas para ferir, havia locais ideais como a testa, ou mesmo o ombro. No final das contas, me dei conta que de básico, aquele treinamento não tinha nada. Sem dúvidas servia para matar alguém. Admito que aqueles foram um dos meses mais horripilantes de minha vida, na qual eu me perguntava diariamente no que diabos de lugar havia me metido.

Nesses treinos, também desenvolvi minhas articulações para ficar mais flexível, e os músculos. – nunca pensei que teria braços como os de Anthony, algum dia. Ok, não chegavam nem perto dos dele, mas já eram o suficiente para me gabar. Por fim, nas últimas lições, ele demonstrou algumas técnicas de investigação, improviso e espionagem. Tive até que fazer uma redaçãozinha oral disso e sempre levava varinhada se errasse alguma coisa. Aquela maldita varinha dos infernos.

Homens Também Sentem MedoOnde histórias criam vida. Descubra agora