Homens Também Sentem Medo

Treze

Sim, tinha um jeito de vencer aquelas criaturas e talvez contar isso a Nestor fosse o real objetivo daquele teste. Afinal de contas, por que a Rhodes diria que éramos uma família se cada um deveria lutar por si mesmo?

 — Na verdade não tem muito segredo. Quanto mais próximo a cabeça — eu disse —, mais tempo leva para o ferimento se regenerar. Ou seja...

— Se concentrarmos nossos ataques por lá, vencemos. — ele completou.

 — Basicamente isso.

 — É, mas não vai ser fácil.

 — Não. — Escutei os passos das bestas se aproximando. — Está na hora. Você tá pronto?

 — Eu nunca estou. — ele forçou um sorriso.

Saímos detrás das árvores e corremos até eles. Não pude mais ver Nestor. O barbarian com a cor da minha bandeira segurava uma pedra lascada, afiada por sinal. Se aquilo me atingisse seria despedaçado. A criatura me viu e se preparou para jogar. No pouco tempo que lutamos, deu para entender seus movimentos, se tentasse desviar para algum dos lados, provavelmente seria atingido de qualquer jeito, igual acontecia com os seus socos e, mesmo que não fosse atingido completamente, sairia bem ferido. Se havia algum modo de escapar daquela pedra, só um eu tinha em mente. Nisso, corri até ele o mais rápido possível. Minhas contusões insistiam em dar umas pontadas de dor, contudo, dei tudo de mim em minhas pernas. Eu precisava ser mais rápido. Intensifiquei a velocidade. Ele jogou a pedra. Corri mais, inclinei o corpo para trás e deslizei com uma rasteira na terra, passando por de baixo da pedra. Nem acreditei quando percebi que havia dado certo. De qualquer forma não tinha tempo para pensar. Continuei a correr até a besta.

Escutei um urro de luta ao lado. Nestor não foi golpeado, pelo contrário, ele bravamente atacava seu barbarian. Voltei a atenção ao meu. A libra ainda estava em minha mão. Apertei com força e parti para cima do monstro. Ele tentou me acertar um soco, mas enfiei o saxo em seu braço. Retirei e voltei minha atenção ao rosto da criatura. Com as forças que me restavam, pulei o que podia e avancei em seu pescoço. Levei um golpe nas costas, mas estava satisfeito pois senti minha faca quase ultrapassar a goela do monstro.

Não consegui me levantar, mas vi que o barbarian também não conseguia. Ele retirou meu saxo e o jogou longe. Levantou meio zonzo e eu da mesma forma. Fui até o saxo, não sabia atacar sem ele. O peguei, mas me dei conta que a moeda já não estava mais comigo. Me desesperei por um instante. “Quando o teste acabar eu procuro” — repeti para mim mesmo, tentei manter a calma. Finalmente, me pus de pé e voltei a correr até a criatura.

Minha coluna pipocava de dor, parecia que a qualquer momento se quebraria igual um galho seco. Dei um grito de guerra, como Nestor. Levantei meu saxo ao céu, como um soldado esperando uma benção, e avancei. Já próximo, recebi um soco do monstro, no peito. Gorfei e grunhi em dor.

Mas sorri.

O golpe já não era tão forte quanto antes — embora tenha me deixado tonto igual bêbado. Quando a criatura tentou desferir-me outro ataque, agarrei-me em seu braço com toda a força que podia. Ele balançou, balançou e balançou, fez de tudo para me repelir. Fiquei no ar por segundos, parecia que estava domando um touro selvagem. Eu era como um inseto em seu corpo, uma formiga ou um besouro, igual aqueles que caíram em mim enquanto cruzava a mata. Se ele fosse racional como os humanos, provavelmente pensaria assim também. Só que, diferente do que um mero inseto faria, aproveitei o impulso de seu braço em movimento e ataquei seu pescoço — um último e letal ataque. O monstro ficou imóvel. Eu ainda estava agarrado em seu braço, então, subitamente, a criatura despencou no chão como um tronco, junto comigo. Sua pele tornou-se cinza como o grafite. Em pouco tempo, dela começou a sair uma fumaça espessa e massiva. Finalmente, seu corpo tornou-se areia e nada restou ali.“O teste foi concluído” – repeti sozinho, tentando acreditar.