8 - OUTUBRO DE 1864 - parte 1

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Em um dia de outubro qualquer, fui chamada por Yukio. Já fazia um tempo desde a última vez em que eu havia saído, e então estranhei o pedido.

– Com licença – pedi ao entrar na sala de Yukio e vi que Tashiro e Tatsuo estavam ali também, o que de certa maneira me aliviou um pouco.

De todos ali, eu não me sentia à vontade ainda com Yukio e o senhor Tanizake. Eles eram sempre mais reservados e quase não havia brechas para uma aproximação.

Apesar do nervosismo, senti uma pequena esperança, já que talvez se eu saísse um pouco do complexo, poderia conseguir novas pistas dos wendigos.

– Você poderá sair se quiser, mas lembre-se – sua voz era fria como aço – prometemos te proteger, e vamos cumprir nossa parte se você cumprir a sua.

Aquelas palavras me acertaram em cheio. Eu sabia quem eu era ali naquele meio, mas de alguma maneira eu queria ser mais. Porém, as palavras dele me deram uma nova força, afinal, eu não era nada mais do que uma prisioneira ali, certo? E sem conseguir me conter eu respondi:

– Quando eu vim para cá, fizemos um acordo. Eu fiz uma promessa e eu não rompo as minhas promessas, então, não quebre a de vocês. Pedi diversas vezes para que vocês reconsiderassem a situação e me deixassem ir, vocês não me ouviram.

– Ei, calma aí – Tashiro disse rindo – estamos entre amigos, não vamos nos exaltar.

Amigos... Talvez para muitos dali eu realmente fosse isso, mas estava claro que para Yukio eu fazia apenas parte de um acordo.

– Vocês me protegem e eu ajudo a solucionar o problema de vocês com os wendigos, apesar de que nenhum dos dois lados está prosperando exatamente – eu seguia com a voz afiada, mas Yukio manteve sua compostura intacta – Eu sempre mantenho as minhas promessas.

– Os Choshu têm agido ultimamente e eu preferia não te envolver com assuntos internos e, portanto, prefiro que não deixe o complexo – Yukio seguiu como se não tivesse sido interrompido, ele parecia mais pensativo que o normal.

– E qual é o motivo de estar agindo contra a sua vontade então? – perguntei como se fosse uma simples pergunta rotineira e mantive meus olhos fixos nele. Ele desviou o olhar antes de falar.

– Você me lembra muito ela – ele sussurrou em um tom triste de uma maneira que apenas eu pude ouvir – Tivemos relatos de que um wendigo vem atacando durante a noite, pode ser apenas alguns ronins errantes, mas não tivemos sucesso nas investigações, precisamos de alguém que saiba com o que estamos lidando. Além do mais, você já está presa há muito tempo, terei que deixá-la sair algum dia.

– Na verdade eu estava fazendo as rondas já ... – eu comecei.

– Estou falando que você está livre para sair sozinha algumas vezes, contanto que avise e volte antes de escurecer. E por favor, mantenha a sua promessa. Os dois estão aqui como testemunhas do que eu acabei de dizer – ele me cortou em seco. Tanto Tashiro como Tatsuo o olharam tão surpresos quanto eu.

– Manterei.

Vendo que Yukio voltava ao seu trabalho e que ele não me escalaria para uma nova ronda, fiz uma reverência ao me levantar e saí.

"Yukio, com quem eu me pareço?" Foi o primeiro pensamento que eu tive ao deixar sua sala e seu ar de tristeza que aparentemente apenas eu pude notar.

Como de costume, voltei para o meu quarto, peguei meu material de desenho e resolvi ir para o pátio central. Me sentei embaixo de uma árvore e tentei sentir minha manipulação, tentei chamar o vento, mas ele não me respondeu. Olhei para o céu aberto sem nenhuma nuvem. Suspirei com uma certa frustração e comecei a desenhar.

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