39 - MONTANHA DAS HARPIAS

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Era início de noite quando chegamos ali. Olhei para o céu estrelado e vi a Lua, Lua vermelha que tantas vezes eu havia visto quando criança. Se não fosse a situação triste em que estávamos, eu provavelmente mostraria todas as belezas de Himura para eles.

Ficamos parados, olhando para as árvores sem dizer nada um para o outro. Me deitei para dormir, mas era incapaz de conciliar o sono. Fiquei lá, deitada, bem acordada com meus pensamentos.

Eu olhei para o céu noturno, enquanto inúmeros pensamentos corriam pela minha mente em uma velocidade vertiginosa. Eu não tenho certeza de quanto tempo fiquei ali até que escutei Saito se levantar. Ele se moveu como uma sombra ao deixar o nosso pequeno acampamento, tomando cuidado para não fazer nenhum som. Após um momento levando em consideração se eu o seguia ou não, optei por ir atrás dele, parte porque eu não conseguiria ficar ali parada e parte porque ele parecia muito triste.

Quando eu o encontrei, ele estava olhando para as estrelas como eu havia suspeitado, assim como fizera na noite em Kofu.

– Saito – o chamei baixinho para que não ocorresse como da última vez. Ele se virou ao som da minha voz.

– Eu não disse para você não andar sozinha a noite?

Suas palavras foram duras como sempre, mas algo em sua voz me fez pensar que seu coração simplesmente não estava ali. O que tinha acontecido naquela tarde parecia tê-lo deixado terrivelmente deprimido.

– Sim – falei ainda baixo – Achei que você provavelmente diria isso... tudo bem se eu ficar aqui com você?

Ele não disse nada, apenas se voltou para as estrelas. Se fosse outra pessoa, eu teria entendido isso como uma dispensa, mas de Saito, eu sabia que era o mais próximo que eu conseguiria de um convite. Dei alguns passos para me aproximar e parei ao lado dele. Ficamos ali por um tempo, a noite era extremamente silenciosa, sem nenhuma canção de insetos noturnos.

– Onde foi que nós erramos? – sua voz estava tão fraca que até mesmo o silêncio da noite ameaçou afogá-la.

– O que você quer dizer?

– Você se lembra do que Tatsuo disse hoje? Que Isao tinha perdido o caminho? Eu estava tentando descobrir quando foi esse momento.

Saito parecia estar falando sozinho. Eu não tinha certeza se ele ao menos se dava conta da minha presença ali.

– Isao já foi um verdadeiro guerreiro – ele seguiu – Quando ele parou...?

Eu não tinha certeza de como responder, na verdade eu nem tinha certeza se havia uma resposta, mesmo assim senti que precisava dizer algo.

– Acho que a única pessoa que pode dizer que cometeu um erro é o próprio Isao. Talvez não tenha sido só um grande erro, sabe? Talvez tenha sido um monte de pequenos erros, tão pequenos que nem mesmo ele tenha notado e eles continuaram se acumulando até que um dia haviam muitos deles para que ele pudesse voltar atrás.

Saito não disse nada no início, apenas me olhou com uma expressão completamente nova para mim.

– Então talvez um dia eu possa me tornar igual a ele.

– Por que você acha isso?

– Posso me perder nessa sede violenta, e minha sanidade vai desaparecer. Vou me virar contra outros guerreiros que conheço há anos e minha consciência deixará de incomodar. Posso esquecer o que é certo. Eventualmente, vou esquecer quem eu sou... algum dia... – apesar das palavras tristes, sua voz estava indiferente, mesmo assim podia ver que o simples pensamento doía.

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