26 - JUNHO 1865 - parte 2

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O complexo se encontrava em conflito. Muitos soldados rasos haviam conhecido a verdade sobre os nefilins e muitos falavam pelos cantos. Ninguém sabia ao certo como o rumor havia se espalhado, eu por outro lado, tinha as minhas dúvidas. Talvez alguém que quisesse muito um exército "imortal" estivesse tentando forçar um pouco para alcançar seu objetivo. Todos estavam proibidos de divulgar a informação sob pena de morte. Com tudo isso, não era de se admirar que os ânimos começassem a cair.

Com todos tensos no salão principal fui fazer o chá da tarde. Desde que a senhora Tanizake havia morrido, eu havia me esforçado para que o complexo se mantivesse no ritmo.

– Aqui está seu chá, Satoru – disse sorrindo.

– Oh – ele deu um pequeno sorriso, ninguém nunca mais havia sorrido verdadeiramente, mas era bom ver o esforço – Você poderia apenas deixá-lo aqui?

Deixei o chá onde ele indicou. Todos ali tinham os rostos tensos e sombrios.

– E então, qual é o plano? – Natsu perguntou pacientemente – Não há outra maneira de encarar isso. Eles nos enviaram uma declaração de guerra. Seria mais inteligente começar a nos preparar para uma.

– Você tem razão – Yukio disse – Quanto a preparação para a guerra.

Yukio disparou seus olhos por todos os homens na sala.

– Leve em consideração o que eu falei há algum tempo, comandante – Isao falou calmamente e fixou seus olhos em mim.

– Sou contra isso – Satoru falou firmemente – Isso é guerra. Haverá inimigos e aliados em todos os lugares. Não acho que seremos capazes de controlar a situação caso algum deles ou até mesmo um de nós enlouqueça. Realmente Isao e Tatsuo são muito poderosos, mas tentar isso com outras pessoas seria muito arriscado.

– Concordo – foi a vez de Natsu falar – Além disso, é algo desumano.

– Então o que você sugere? – para a minha surpresa foi Saito quem fez a pergunta.

– Estamos trabalhando nisso. Se fosse tão fácil encontrar uma solução, você realmente acha que estaríamos nessa confusão? – Natsu respondeu lançando um olhar furioso para Saito.

– Qual a sua opinião sobre isso, comandante? – perguntei.

– Deixe-me pensar sobre isso – ele franziu a testa – Eles já deixaram claro que irão nos atacar e que queriam resolver tudo nessa batalha.

Lembrei-me do recado enviado por Kiyoshi. Ele havia aparecido um belo dia com a declaração de guerra para que todos pudessem ouvir. Uma guerra que eu sabia, todos já esperavam.

– Ambar? – escutei Tashiro me chamando baixinho – Você tem um minuto?

– Claro – falei indo com ele para um canto da sala enquanto todos os outros discutiam sobre a batalha que chegava.

– Sei que vou morrer logo – ele falou tentando sorrir e eu não fui capaz de desmenti-lo – Eu não quero a transformação. Não quero ofendê-la, mas prefiro morrer como um homem a morrer como um monstro.

– Não me ofende – sorri tristemente.

– Existe alguma maneira de me deixar forte apenas para esta batalha? – ele suplicou – por favor, me deixa ajudar meus amigos uma última vez.

Passei a mão em meu pescoço, eu não sabia o que dizer a ele e nem tinha uma resposta para isso. Havia algo que pudesse ajudá-lo a lutar apenas esta guerra? E então eu lembrei, os ceifeiros podiam fazer esse acordo com ele, mas ele não teria nem um dia a mais com seus amigos.

– Tashiro – falei um pouco triste com a ideia de vê-lo morrer – Há algo que posso fazer por você, mas tem um preço muito alto. Acredite, eu não sou a favor, mas não sei se consigo recusar algo para você agora.

– Qual o preço? – ele perguntou sério.

– Provavelmente você morrerá logo após a batalha – falei olhando para baixo.

Ele refletiu por um momento antes de fazer a pergunta.

– Como faço isso?

– Bem – suspirei – posso trazer um ceifeiro de almas. O acordo é simples, você gasta todas as suas forças e vida que resta em um determinado tempo.

– Ou seja, eu teria a força acumulada do que me resta de vida. E quando eu acabar de gastar, eu morro.

– Sim.

– Isso é assustador – ele sorriu com tristeza – mas eu vou morrer de qualquer jeito.

– Tem mais uma coisa – eu falei apreensiva.

– Seja o que for, eu aceito... – ele me interrompeu dando de ombros.

– Vocês dois sussurrando assim no canto – Tatsuo disse chegando perto – As pessoas podem ter uma ideia errada se virem uma garota e um homem sozinhos assim.

– Vamos lá, Tatsuo – respondi, revirando os olhos – você sabe que é mais inteligente do que isso. Eu e Tashiro somos somente amigos.

– É, acho que você tem razão – Tatsuo deu de ombros – Ele não é realmente o seu tipo de homem, não é?

– Ei, o que você quer dizer? – perguntei com um pouco de vergonha.

– O que você quer dizer com "O que você quer dizer"? Vamos lá... – ele fez uma cara de atentado – Podemos perguntar para Saito o que ele acha...

Tatsuo jogou um sorriso cúmplice para Tashiro que riu com a ideia. Senti meu rosto queimando, mas ao invés de Tashiro entrar na brincadeira do amigo, ele apenas me disse baixo:

– Assim pelo menos eu serei capaz de empunhar uma espada – suas últimas palavras foram frias, odiosas e cheias de autodesprezo.

– Entendo – suspirei, sabendo que ele aceitaria a proposta.

– Hey, do que vocês estão falando? – Tatsuo de repente ficou sério e sua voz soou preocupada.

– Yukio, posso falar? – levantei um pouco a voz para que ele me escutasse. Ele acenou brevemente com a cabeça e eu segui – não ouvi quais foram as últimas alternativas, mas talvez eu tenha uma que pode ajudar. Há algum tempo, pedi permissão para disponibilizarem soldados das divindades. Tenho assuntos a tratar com os ceifeiros e então, eu traria alguns homens comigo.

– Não me leve a mal, Ambar – Yukio disse apertando os olhos – Mas seu povo não demonstrou interesse nenhum em resolver a situação por aqui até agora apesar de seus pedidos. Perdemos muitos homens, o que te faz acreditar que eles atenderão ao seu pedido agora?

– Você tem razão – falei suspirando – não te culpo por não confiar neles. Nesse momento eu também não tenho muita confiança nas divindades e por isso, levarei um pedido oficial de Himura.

– E em quanto tempo você acha que conseguirá isso? – ele perguntou cruzando os braços.

– Me dê dois dias, se o senhor me permitir, irei agora – falei firmemente.

– Por que eu tenho que te permitir? – ele franziu a testa.

– Simples – respondi com um sorriso – porque você é o meu comandante.

Vi um leve sorriso se desenhando em seu rosto e logo ele voltou a ficar sério.

– Você tem dois dias. Volte com ou sem os soldados.

– Sim, senhor – sorri e sem nenhum preparativo, abri uma fenda.

Olhei novamente para Tashiro e ele sussurrou: "estou contanto com você".

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