Capítulo 38 - Liberdade Inalcançável

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Era irritante pensar que a minha mente ansiava pela companhia dela, eu a odiava, queria destroná-la e queria fazê-la pagar por todo sofrimento causado, mas ainda assim era o único som que eu ouvia há dias, reparar em suas roupas era o único entretenimento para a minha mente entediada, analisar suas perguntas era o único trabalho do meu cérebro.

Não foi Ravena que entrou, cinco gárgulas apareceram diante de mim, sem falar nada um deles cobriu o meu rosto com um pano branco, fechando o velcro atrás da minha cabeça, senti quando a mesa foi levantada e carregada. Meu corpo gelou.

- Para onde estão me levando? - perguntei com voz autoritária.

Senti a diferença de claridade pelo pano e a corrente de ar que passou pelo meu corpo, ouvi o barulho de ferro batendo e senti que talvez eles subissem escadas. Permaneci quieta, a última coisa que eu queria era que a mesa caísse em cima de mim. O caminho parecia longo, a mesa balançava, subia, descia, era colocada no chão e erguida novamente, cheiros diferentes invadiram o meu nariz, cheiro de comida, de perfume, de mofo e poeira. Agarrei-me às informações que possuía, Ravena não queria me matar e não queria me marcar.

Quando a mesa foi apoiada no chão pela última vez pude sentir o calor do sol na minha pele, inconfundível, delicioso. Dedos cheios de anéis tiraram o pano do meu rosto. Ravena.

Olhei ao redor percebendo que estava num ambiente diferente, um cômodo pequeno, do meu lado direito um vaso sanitário e uma pia, do lado esquerdo uma mesa repleta de caixas de madeira escura, algumas pequenas e outras não muito grandes, como porta-joias. O teto, uma circunferência em formato pontiagudo, uma torre feita de telhas de barro, com um enorme buraco do lado direito, buraco por onde era possível ver o céu azul e a luz do sol entrava. Nas paredes lisas o mesmo símbolo.

- Conheça sua nova acomodação. - Ravena encenou a boa anfitriã. - Espero que faça bom proveito da luz do sol.

Olhei para ela e percebi que usava calças, calça jeans escura marcando suas curvas, uma camiseta branca de crochê com pérolas negras costuradas entre os pontos da linha, um salto agulha branco e simples e uma tiara com um diamante negro em forma de gota pendurado pela junção dos ferros de ouro superiores, de forma que o meio da tiara fosse vazio, apenas com o diamante pendurado. Uma joia criativa, possuía mais criatividade do que beleza, gostei.

- Para quem é esse vaso? - perguntei.

- Para você, não quero ficar sentindo o cheiro da sua urina.

- Então posso usar? - levantei os pulsos acorrentados.

- Qualquer gracinha e eu jogo outro raio na aldeia!

Ela passou a mão pelas correntes dos meus braços e elas se soltaram, como o corpo de uma cobra morta. Senti o alívio nos meus pulsos e em seguida ela fez o mesmo com os meus tornozelos e o meu pescoço. Desci da mesa com as pernas bambas, parecia ter desaprendido como andar. Aproximei-me do vaso e levantei o vestido, senti o seu olhar sobre mim.

- Privacidade? Será que dá? - demonstrei meu incômodo com a vigilância dela.

- Não vou ficar olhando pra sua vagina! - Ravena cruzou os braços com impaciência. - Faça antes que eu desista.

Bufei. Fiz o xixi, lavei a mão, o rosto e aproveitei para beber a água da torneira.

- Você sabe quando será a próxima vez que usará o vaso sanitário? - ela perguntou desviando a minha atenção da torneira.

- Não. - respondi a contragosto, entendendo a pergunta dela.

- Nem eu, então não beba água.

Como eu também não queria passar os próximos dias deitada na minha urina, achei sábio parar de beber a água.

A Mesa E O MarOnde histórias criam vida. Descubra agora