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— Se você pudesse escolher ser alguém, tenho certeza que escolheria ser uma pessoa que é boa no xadrez. Xeque-mate.

Eu revirei os olhos, bufando. Era a terceira vez.

— Odeio xadrez.

— Odeia porque perde.

— Sim, isso é óbvio, Ally. Como aprendeu a jogar assim?

— Minha mãe.

— Deixa eu adivinhar, faziam isso no tempo livre dela?

— Basicamente. — deu de ombros.

— Nenhuma brincadeira de boneca?

— Acho que ela não gosta tanto de bonecas. Ela gosta muito de xadrez, e me fez aprender a gostar. Ela dizia; "gosto de controlar as peças, como controlo as pessoas".

Ela gosta de jogar então? O mundo dela é um quadrado de madeira e nós somos as peças? Faz sentindo.

— Nossa, a sua mãe é...

— Realista? Porque ela realmente faz isso, até hoje.

— Eu ia dizer controladora, mas sim, isso também.

— Cuidado, como podemos saber que ela não pode te ouvir? — comentou, com um sorriso de canto, que fez eu repensar nas coisas que eu disse.

— Não me faça criar paranóias agora. — ela deu uma curta risada.

— Está com fome?

— Estou, na verdade.

— Vou pedir para a cozinheira fazer algo. — eu concordei em silêncio. Ela se levantou, indo para a cozinha.

— Hernández? — escutei a voz da mulher um pouco acima de mim, ela estava na escada. Não pude evitar em arrumar a minha postura. Mas que merda.  — Não sabia que já havia chegado. — ótimo. Isso significa que ela não ouviu nada.

— Há um tempo. — ela apenas concordou enquanto descia as escadas.

— E Allyson?

— Na cozinha.

Silêncio novamente. Eu devia ter ficado quieta. Esperado Allyson voltar e apenas pegar meu celular e fingir que estava ocupada. Mas não consegui.

— A... a senhora toca piano? — eu já sabia a reposta. Já sabia essa resposta há muito tempo.

— Sim. — ela era uma mulher de poucas palavras. Eu lambi os meus lábios, concordando com ela.

— E você?

— Não posso dizer que sou perfeita.

— Bom, você pode tocar em qualquer tecla que uma criança de quatro anos irá achar que você é o Beethoven. — certo, eu devia ter previsto essa. — Mas... se você quiser aperfeiçoar, eu posso lhe ensinar o que sei. — ela se sentou ao meu lado enquanto — eu acho — seus olhos desciam pelo meu corpo.

Eu poderia estar obcecada ao ponto de ver coisas? Talvez. Mas mesmo assim, aquilo me fez prender a respiração.

— Seria bom ter alguém na minha família que toca algum instrumento.

— Sim, pode se gabar para os seus primos. — ela sorriu sem mostrar os dentes. Um sorriso de Cate Blanchett.

Eu poderia contar as vezes que ela sorriu de verdade perto de mim e, eu não teria uma lista muito grande.

— Mãe? — Allyson disse, um tanto que surpresa por ver a mãe fora do escritório. Sim, Ally, eu também.

— Não estava ameaçando cortar a cabeça da S/n fora, não é? — a mulher fechou os olhos, dando uma risada nasal.

— Longe disso. Estávamos falando sobre tocar piano.

— É, piano é legal. Mas sabe o que é mais legal ainda? Filme e pipoca. — ela bateu uma palma. — S/n. — eu me levantei, entendendo que íamos para a sala de cinema.

— Deixe-me fazer companhia para vocês. — ela se levantou. Ally franziu o cenho.

— Certeza?

— Eu insisto.

— Está bem. — Allyson disse desconfiada. Eu também estava. Em um ano todo, Cate nunca insistiu em fazer companhia para nós. Pelo contrário, acho que ela evitava. Isso mostrava que ela já não tinha nada de melhor para fazer ou que desistiu da vida.

Nós estávamos na sala de cinema (ricos). Ally escolheu o filme dessa vez: Escritores da Liberdade. Acho que ela havia me dito que era obcecada nesse filme aos seus treze anos de idade.

Allyson estava no meio, entre mim e Cate. Eu não podia negar que estava observando a mulher, de vez em quando eu empurrava a minha poltrona para trás só para vê-la.

Ela tinha um dedo no lábio e as pernas cruzadas, ela era linda concentrada. Isso foi uma coisa que eu notei, por pouco tempo, na faculdade.

E Allyson? Ela estava entretida demais para me ver olhando para Cate. Aposto como eu parecia uma esquisita nesse momento. Mas estava sendo incontrolável. Era como se eu já não controlasse os meus pensamentos quando o assunto era Cate Blanchett.

— Você gostou do filme? — eu perguntei para Cate, quando estávamos sozinhas na cozinha.

— Sim, eu gostei. — ela deixou seu copo na pia. — Eu te perguntaria a mesma coisa, mas acho que eu era uma atração mais interessante naquele momento. Ou estou enganada, srta. Hernández? — ela me olhou, apoiando sua mão esquerda na pia e a sua mão direita na cintura.

Eu engoli em seco.

Ally podia não ter notado, mas merda, eu esqueci como Cate é.

Eu queria rir da cara dela e falar: "sim, você está totalmente enganada". Mas seria a mentira mais descarada que eu poderia falar. Eu estava imóvel e muda, o que estava piorando cada vez mais a situação. Ela me olhava com os olhos estreitos, como se conseguisse ver todos os meus pecados.

— S/n. — ah, graças a Deus, Ally! Eu me virei para ela. — Pode me acompanhar?

— Claro. — tentei fazer com que a minha voz não saísse falhada. Ela deu uma risada nasal, fazendo minha atenção voltar para ela.

— Para o seu bem, eu vou apenas ignorar que tivemos essa conversa. — ela sorriu divertida.

Eu estou sendo tola ao não tomar cuidado com as minhas ações, eu realmente não quero arrumar problemas por conta de uma atração idiota. Depois de tomar um copo de água, consegui ir até Ally.

— O que queria?

— Nada, era só para te tirar de perto da minha mãe antes que ela avançasse em você. Você quer fazer alguma outra coisa?

— Na verdade, eu acho melhor eu ir.

— Sério? Ela não te falou nada, né?

— Não. Eu só queria adiantar algumas coisas.

— Tudo bem. Se cuida.

E se ela começar a desconfiar de algo?

Era isso o que corria na minha cabeça. Parte de mim estava falando: não há como desconfiar de algo com apenas um olhar. E outra parte estava me refutando dizendo: ela é Cate Blanchett.

No fundo, eu sabia que ela podia desconfiar de uma coisa desse tipo, não por que ela fosse paranóica com as coisas ao seu redor, mas sim porque ela era observadora demais. Mas ela não vai perder mais do seu tempo com isso. Cate é muito ocupada para prestar atenção em uma universitária que a entediava. 

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