AuroraEu dei uma risada fraca para o que a Sophia tinha falado, e encarei o meu irmão pelo canto do olho, mas o Gabriel estava simplesmente de saco cheio pra ser no mínimo amigável.
Ele dirigia o carro dele, focado demais em qualquer coisa que acontecia na rua, pra não precisar fazer parte da nossa conversa.
Bom... eu estava sendo um pouco errada em nomear como uma "conversa", tudo o que Sophia tagarelava no banco de trás do carro.
Eu gostava dela. De verdade. Eu gostava muito da Sophia. Mas sempre senti uma pontinha de ciúme em relação a ela e o Patrick.
Ele amava ela pra caramba e sempre deixou muito claro pra todo mundo. Mesmo que ele não deixasse claro que amava ninguém, e era bem difícil arrancar qualquer gesto de felicidade ou de carinho do PT.
Mas ele sempre ficava feliz comigo.
... e com a Sophia.
Sophia: Minha nossa senhora, eu amo esse lugar - ela falou, abaixando o vidro do carro. Vi que tinha um motoqueiro parado nosso lado na sinaleira e precisava confessar que era um baita de um gostoso - Deixa eu ir na garupa!
Eu gargalhei, sentido a barriga doer por conta de tantas risadas que já tinha dado em tão pouco tempo, e o Gabriel me fuzilou com o olhar.
Escondi meu rosto entre as mãos, porque não ia conseguir parar de rir, e não queria arrumar motivos pro meu irmão ficar falando no meu ouvido.
Aurora: Você perdeu o medo da morte, né? Não dá pra sair mexendo com qualquer pessoa que vê na rua - falei olhando pra ela no retrovisor, depois que eu consegui controlar a minha risada - Se mexer com macho casado no morro, as meninas vão te deixar careca.
Sophia: Sou doida mas não sou idiota. Sou cria de favela também, gatinha. Sei que não dá pra sair mexendo com qualquer um... mas o Rio enche a minha imaginação de possibilidades.
Aurora: Você vaio pra cá pra ver o Patrick ou pra azarar uns boys? - perguntei.
Sophia: Azarar uns boys, com certeza!
Eu ri, negando com a cabeça.
Aurora: Ele vai encher o saco se ouvir isso saindo da tua boca.
Ela fez um barulho, tipo "deixa pra lá".
Sophia: Ele já se acostumou. A proteção de irmão mais velho ficou todinha pra você!
Aurora: Se você quiser é toda sua - dei de ombros - Já tenho uns três pra me preocupar.
Ouvi a risada debochada dela.
Sophia: Eu amo ser filha única. Qual deles é o pior? - ela perguntou.
Pensei por um momento.
Sem dúvidas, de todos eles, o menos pior era o PT, porque quase nunca ele sabia do que eu aprontava e a imagem que ele tinha, e que eu sempre mostrava era a de "boazinha".
Uma boa filha, uma boa irmã e uma boa amiga. Ele sempre me tratava com muito carinho em todas as visitas ou vezes que conversávamos, e nunca precisou me dar um sermão, como acontecia quase que diariamente com os outros três.
De todos, o que mais doía era o Matheus. Ele sabia como tocar no meu ponto fraco e sempre me fazia chorar, porque usava umas palavras duras e não tão fáceis de engolir.
A gente nem estava em um clima bom depois que eu contei que não gostava muito da nova namoradinha dele, mas o meu irmão cagou pra minha opinião e jogou na minha cara que eu não tinha a menor responsabilidade na vida, e que tudo o que eu tinha foi através dos meus pais.
Claro que eu amava ele. Mas estava chateada!
O Davi era uma peste de verdade. Pior do que ele, só duas versões dele. Sabia de todos os meus esquemas e ficava muito puto, fechava a cara e simplesmente não falava nada comigo, quando descobria que eu estava de papo com um de seus amigos.
E o Gabriel tinha basicamente a mesma proteção do meu pai. Era difícil, porque ele ameaçava os meninos de uma forma que até mesmo me deixava com medo, colocava uma galera na minha cola, e mesmo assim, me apoiava pra sair, me divertir, mas como ele sempre dizia... bem longe de meninos, ou então, ele mandaria os meninos para bem longe.
Aurora: Cada um tem um jeito único de ser terrível e de acabar com a minha juventude!
O Biel soltou o ar pelo nariz, atraindo a nossa atenção.
Lobo: Eu não tenho dúvida nenhuma. O Patrick vai ser o pior de todos. Tu tava no céu com a gente até agora.
Neguei com a cabeça.
Aurora: Nunca tive no céu com vocês fazendo de tudo pra me deixar longe do sexo oposto.
Lobo: Enquanto a gente faz de tudo pra te deixar longe do sexo oposto, o PT vai colocar os menor em extinção - ele riu - Foi difícil pra caramba pra nós que te viu crescer aqui fora... o mano vai sair do nada e ver que deu merda mesmo!
Aurora: Não deu merda - fiz careta, olhando ofendida pra ele - Eu só cresci.
Lobo: Quando tu tava na barriga, eu lembro que o PT deu a ideia de te trancar em uma torre, igual nos filmes da Bela Adormecida - a minha boca se abriu devido ao choque de ouvir aquilo - Se pá ele vai tentar fazer a mesma parada agora.
Aurora: Não vai... depois de quinze anos tudo o que ele vai querer é ficar com a nossa família reunida.
Sophia: É. Tudo isso é questão de colocar ele no lugar. Se ele vier falar algo, pergunta o que ele estava fazendo na tua idade! - incentivou.
Eu pensei por um momento, porque não fazia muito sentido. Eu sabia exatamente o que o Patrick estava fazendo na minha idade.
Lobo: Preso.
Sophia: Por tráfico, alguns homicídios, estelionato, porte de arma, e mais uns artiguinhos pra conta. Comparando a tua adolescência com a ele, o que é beijar na boca?
Aurora: Então tu fala isso pra ele.
Ela riu e segurou uma das tranças do meu cabelo.
Sophia: Não. É só você dar um sorrisinho que ele vai aceitar qualquer parada.
Mordi a boca, segurando o sorriso, e encarei a rua.
A Sophia voltou a se encostar no banco e eu vi o meu irmão negando com a cabeça, com um bico que tava quase encostava no vidro do carro, antes de sussurrar um "pilantra".