I59I - Perto do fim

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- E o que ele fazia com as garotas? - Perguntei assombrada.

- Roubava seus corações, para um plano mais vil, uma outra vingança pessoal. - Disse, olhando para mim em busca de alguma reação, eu permanecia assombrada por finalmente ter a verdade. - Ele continuou, construindo um clã de selvagens para ir atrás do verdadeiro culpado, aquele quem tinha dado a ordem para que partisse primeiro, aquele a quem ele devia se reportar e é a esse alguém que hoje eu destino o meu próprio plano. O homem como falei, o Mestre Lican anterior a mim foi um tolo, perdeu-se em seu próprio plano, enlouquecido.

- E porque você quer derrotar o mesmo homem? - Perguntei.

- Porque eu fiz uma promessa. - Falou distante.

Imaginei vendo o choque em seu rosto, vendo o último pulsar daquele coração, que a sua promessa não envolvera palavras ou um juramento, mas a si próprio.

Sua mãe havia sido morta pelos pecados do homem odioso, como ele se referia ao pai e depois disso eu entendia o porque, ele havia o transformado o filho em um objeto de vingança contra o avô. Quanto dessa luta era realmente para impedir o Lukoi de iniciar uma guerra? Quanto dessa luta não era por rancores passados que ensejavam um ciclo de vingança?

Eu havia sido arrastada para isso no meio da tempestade, transformada em mais um objeto para o mesmo fim. Bom, que se danasse, eu colocaria um ponto final de uma vez por todas.

- Que exótico. - Comentei, tentando não demonstrar minha repulsa para o prato. É só um órgão, provavelmente arrancando de alguém pelos simpáticos cozinheiros. Foco, Aysha!

Se o Lukoi queria transformar o jantar em uma provocação zombeteira, eu podia muito bem...

Raymond lançou a bandeja do outro lada da sala.

- Não comerei isso. - Afirmou.

Drivand sorriu e eu senti como se uma tonelada do seu poder caísse sobre a sala de repente.

- Tragam outro. - Pediu o Lukoi, a voz grave retumbando na sala de jantar.

O empregado que serviu Raymond começou a ir em direção a porta lateral, o derrubei com meu poder sem sequer olhar para ele. A prática estava tornando as coisas mais fáceis.

- Desculpe, acho que também perdi a fome. - Falei.

- Controle sua noiva ou eu o farei. - Avisou para Raymond.

- Pode tentar se quiser, mas duvido que tenha sucesso. - Respondeu.

Foi a gota d'água para Drivand que se levantou da mesa e partiu em direção a Raymond. Aproveitei seu momento de distração para alcançar uma das facas.

- Você deveria ser o meu herdeiro! Um Haldegar! - Esbravejou.

Raymond se levantou da sua cadeira e encarou o Lukoi com fúria nos olhos.

- Prefiro morrer a carregar o seu nome. - Cuspiu.

Comecei a me mover, tentando ser sorrateira o suficiente para me aproximar do Lukoi sem que ele visse.

- Garoto, não tome minha paciência. Você herdara o meu posto e liderara nossas frentes quando a batalha começar. E se tiver que comer um coração por dia para alcançar o potencial máximo do seu poder, é o que fara!

- Aysha! - Gritou Raymond, mas era tarde de mais.

Eu havia sido pega, uma mão em meu pescoço cortando o ar.

- Ou então basta comer o coração dela! - Falou, me atirando para o mesmo lado que Raymond atirara a bandeja. Minhas costas atingiram a parede e o impacto foi o suficiente para tirar o restante do ar dos meus pulmões. - Escolha agora!

Eu rolei e olhei pelo teto por um segundo enquanto pensava. Mesmo todo o poder que eu tinha acumulado não era o suficiente para lidar com o Lukoi, eu precisava de mais, precisava pagar um preço maior. Procurei o coração na bagunça e o alcancei, estava frio como a morte deveria ser, pegajoso e escorregadio.

Respirei fundo, nem ferrando.

Coloquei o coração no chão e me levantei, bem no momento que o Lukoi e Raymond projetaram suas sombras ferais, ambos com olhos vermelhos atacando um ao outro enquanto seus lobos espectrais faziam o mesmo.

Tome-o e acabe com isso.

Não havia outra forma. O poder do Lukoi era esmagador e Raymond acabaria perdendo, acabaria sendo obrigado a fazer o que o Lukoi desejasse.

- Sinto muito, meu amor. - Falei, quando comecei a tomar sua chama interna. Ele não caiu como os outros faziam, virou-se em minha direção, seus olhos pela primeira vez retornado a cor que deveriam possuir originalmente.

Belos olhos castanhos.

Levei uma das minhas mãos até a boca e a mordi, o suficiente para arrancar sangue, a dor foi uma alavanca para que eu soubesse quando parar de roubar seu poder.

A sensação era maravilhosa, diferente das outras, aquele poder não queria escapar, não arranhava minhas barreiras como um animal enjaulado ou lutava contra mim, ele se misturava ao meu. Era um poder cultivado pelo ódio, tirado de vidas inocentes e eu entendia disso, porque fazia parte de como pela primeira vez incitei o meu próprio poder.

Só que dessa vez eu não resisti ao impulso de molhar os meus dedos na poça de sangue, não, eu deixei o sangue da minha mão escorrer até molha-los por completo e depois os lambi, aproveitando o gosto.

O Lukoi me encarou sem deixar transparecer o que se passava no seu rosto.

- Vai precisar de mais do que isso se tentar lutar comigo. - Falou, andando até mim. - Derrotei Liones três vezes mais poderosos do que você. Pense pequena Liones, isso que está experimentando não chega nem perto do seu potencial máximo, fique aqui e convença-o a lutar pelo que é certo, vocês dois podem conquistar o continente inteiro com a minha orientação.

Balancei a cabeça.

- Tem razão, mas sabe, acho que não precisamos da orientação de alguém que mandou matar a própria nora e acabou enlouquecendo o filho com isso. - Falei.

- Ela era uma humana fraca! Estava os afastando dos seus potenciais, prendendo-os naquela montanha no fim do mundo. E o meu filho era um tolo, mas não deixarei meu neto seguir o caminho dele. - Falou. - Você é diferente, pode lutar junto com ele e os seus descendentes governaram esse continente de forma incontestável.

- É um plano muito ambicioso, devo dizer que adorei ele.

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