I29I - Desafio

6.6K 989 163
                                    

Fui puxada. Assim que cheguei ao fim das escadas que levavam até o jardim. Havia uma mão firme em minha boca junto com um calor estranhamente familiar, mas antes que eu pudesse escutar as palavras de Elikham, mordi sua mão.

Ele me soltou, mais rápido do que um humano teria sido capaz.

- Silêncio. – Pediu, sua voz comumente indiferente tinha uma nota de preocupação, balancei minha cabeça incapaz de vê-lo. O fato de não consegui sentir sua respiração, fez com o que eu prendesse a minha também.

Três vultos passaram pela abertura do corredor, projetando sombras contra as escadas a qual eu tinha percorrido, eles se detiveram por um momento e seguiram o caminho. Depois de alguns segundos senti a respiração de Elikham, ele farejou o ar acima de mim e só então me soltou.

- Deve voltar lá para cima, não é seguro. – Disse, empurrado uma de suas mãos contra as minhas costas. Firmei um dos meus pés na base do degrau.

- Não vou a lugar nenhum. – Informei, dirigindo-lhe um olhar desafiador. – O que está havendo?

- Lupossanguis – Disse a contragosto, como se a palavra significasse tudo. – O clã rejeitou sua punição, exigem sangue.

O meu sangue, li nas entrelinhas.

- Outro desafio? – Perguntei. Ele murmurou um sim, ainda havia preocupação em sua voz. – Onde está o Lobo? – Indaguei, lembrando-me das palavras sobre os desafios dirigidos a mim, ele havia tomado conta de um. "Por isso deve valorizar minha generosidade Aysha, não posso fazer isso uma segunda vez."

Quando Elikham não respondeu, dei meia volta.

Ele não tentou me impedir, apenas olhou uma vez para sua mão e me seguiu.

Eu irrompi o salão de ossos portando um rosto despreocupado. Repelir a coisa em minha caixinha poderia ter me dado alguma confiança. Uma frágil e débil confiança percebi, assim que cruzei a porta todos ou boa parte dos presentes me encararam, alguns com curiosidade, outros com desprezo e muitos poucos com neutralidade, eu podia sentir a expectativa de suas magias pinicar minha nuca, mas a avassaladora magia do Lobo também estava lá, como um peso em meus ombros e rapidamente afastou todas as outras.

As pessoas amontoadas no salão desfizeram seu circulo, me dando a visão do combate que ocorria em seu centro e da pequena pilha de Licans - inconscientes na melhor das hipóteses - jogados do lado esquerdo do trono, poeira e sangue no chão. O ar ficou preso em minha garganta. Três pessoas, ou melhor, Licans lutavam contra um único alvo.

Ele parou quando me notou, segurando o pescoço de um Lican, seus olhos daquela cor única entre o dourado e o alaranjado repousaram em mim, houve uma contração em seus lábios, como se ele fosse dizer algo, mas o que quer que fosse foi interrompido pelo segundo oponente o atacando pelas costas.

Predizendo o movimento ele agarrou o Lican e o jogou sobre o ombro, o homem deslizou pelo chão, ironicamente parando a poucos metros dos meus pés. Os outros dois homens desistiram do combate, usando uma garra para cortarem a própria carne do peito e deixar cair algumas gotas de sangue no chão.

Houve um momento de silêncio e contemplação, quebrado por uma voz conhecida.

- A infratora está aqui. – Ângela falou, atraindo minha atenção para onde ela estava, apoiada em um pilar do salão. O corte em seu rosto permanecia visível, alguma parte não tão boa do meu cérebro se alegrou. – A ratinha finalmente tomou coragem de assumir seus desafios?

Respirei fundo, o cheiro metálico do sangue invadiu meu olfato. Eu sabia que aquela situação era apenas uma questão de tempo, se eu não provasse algum valor para aquelas pessoas a autoridade já decadente do Lobo cairia e com isso minha instável segurança. É melhor um inimigo conhecido do que um desconhecido, minha mente relembrou, o mesmo pensamento que tive a ajuda-lo quando derramou seu sangue para me salvar.

VermelhoOnde histórias criam vida. Descubra agora