Capítulo 23 - Só uma provinha

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"O tempo tem uma forma maravilhosa de nos mostrar o que realmente importa."

Pov Marília

Congelei, meu queixo repousando na pele lisa e macia dela. Meus lábios se contraíram para dar uma resposta, mas não fazia ideia do que dizer. Com um suspiro suave, ergui o corpo e segurei seu rosto com ambas as mãos, apoiando o peso de meus braços nos dois lados de sua cabeça.

- Maraisa - sussurrei, com o nariz a centímetros do seu e esperei que ela olhasse para mim - Você está aqui - contornei sua bochecha rosada com o polegar e observei a cor se intensificar com meu toque - Isso é tudo o que importa.

Havia conflito nos olhos dela: medo, afeição, mágoa. Senti um certo desconforto. Sabia que ela não tinha se arrependido do que havíamos feito. A maneira como Maraisa me abraçou e sussurrou palavras deliciosas em meu ouvido asseguravam-me disso. Mas estava irremediavelmente ciente dos perigos que a cercavam por causa das nossas ações. O fato de gostar de Pêssegos não iria fazer diferença em como as pessoas, em especial a mãe dela, me enxergariam. Eu era uma ex-presidiária e, assim, alguém nada confiável. Nenhuma palavra bonita ou frase sofisticada poderia mudar aquilo. Almira jamais me veria de outra forma. Seu medo e sua mesquinhez a cegariam para o que eu realmente sentia por sua filha.

Meu coração ficou apertado. Rezava para que aquilo que havíamos experimentado juntas fosse suficiente para manter Maraisa ao meu lado pelo máximo de tempo possível. Queria mais com ela, dela, e estava disposta a assumir os riscos para conseguir isso. Pêssegos valia toda aquela merda que seria atirada contra mim e estaria lá para protegê-la da melhor maneira que pudesse.

Maraisa saiu do banheiro e voltou para a cama, deixando que eu envolvesse meu braço em seus ombros, puxando-a para junto de mim. Ela abraçou minha cintura com carinho e minha mão massageou suas costas em círculos reconfortantes enquanto os dedos dela dançavam em torno dos meus seios descobertos. Por mais nova que fosse aquela sensação de ficar abraçadinha com uma mulher na cama, a familiaridade de fazer aquilo com Pêssegos era tão calorosa quanto as cobertas em torno de nós.
Delicadamente pressionei os lábios contra sua cabeça.

- Onde você foi hoje à noite?

Não queria chateá-la, mas estava ansiosa por descobrir o que a tinha levado até à porta do meu apartamento depois de ter gritado comigo com tanta raiva. O que tinha engatilhado a percepção de que a tinha salvado em vez de tê-la impedido de ajudar o pai?

- Fiquei caminhando por um bom tempo - seus dedos apertaram minha cintura - Não sabia o que fazer. Eu estava... Simplesmente doía. Tudo doía - abracei seu pequeno corpo com força - Então cheguei em casa e acho que peguei um táxi - os lábios dela tocaram minha pele - Liguei para minha mãe.

Parei rapidamente o movimento de minha mão em suas costas.

- O quê?

Ela bufou.

- Eu sei. Eu devo ser burra demais por ter ligado para ela, né?

- Pêsse... - assim que ouviu minha voz, Maraisa interrompeu-me com firmeza.

- Ela começou a dizer quão decepcionada estava com o que tinha acontecido na casa da minha vó. Disse que sou ingrata com as pessoas ao meu redor, com quem se preocupa comigo. Que ela só quer o melhor para mim e que sou muito egoísta e estou muito envolvida com você para perceber.

Engoli em seco.

- Ela sabe sobre mim?

- Ela sabe que eu gosto de você - seu indicador deslizou por meu lábio inferior - Sabe que nós nos beijamos.

Um calafrio desceu por minha espinha à medida que a última semana começou a fazer sentido.

- Foi por isso que você fugiu da sua família e dos seus amigos. Foi por isso que você voltou de Chicago - sorri de maneira irônica - Eles sabem.
Maraisa balançou a cabeça.

- Eles acham que sabe o que está acontecendo, mas não sabem. Não fazem a menor ideia - a raiva era clara em sua voz - Mendonça, você precisa entender, minha própria mãe pensa que minhas escolhas estão erradas e que ainda sou uma criança que não conhece nada. Ela não sabe quanto amo meu trabalho, quanto amo o que faço todos os dias, quanto amo... - os olhos dela queimavam de fúria - Você é a única pessoa que me trata como se eu fosse eu mesma, que me faz sentir que o que faço é correto e significativo. Não há balelas, não há segredos com você.

Meus lábios se contraíram com o esboço de um sorriso.

- E comecei a enxergar como deve ter sido difícil revelar para mim quem você era - sua mão escorregou por meu maxilar - Mendonça, sei que só não me contou porque teve medo. Você é a única pessoa deste planeta que sabe o que passei. E quer saber de algo realmente irônico? Minha família, meus amigos, a polícia, o idiota do meu terapeuta, todo mundo disse que você não era real, que era uma invenção da minha cabeça, um resultado de estresse pós-traumático - ela acariciou meu rosto - Mas você é a coisa mais real na minha vida.

Não conseguia responder. Estava sem palavras e louca por seu toque.

"Maraisa" foi tudo o que consegui murmurar antes de colar a boca na dela. Três palavrinhas erram sussurradas de maneira incansável pela minha mente, borbulhando furiosamente, deixando-me sem ar. Engolindo essas palavras e o medo que sempre as acompanhava, deitei Pêssegos de barriga para cima e acomodei-me ao seu lado, colocando uma das suas pernas em cima do meu quadril. Apesar dela ter gemido, o movimento não tinha uma intenção sexual. Queria Maraisa de novo, mas queria ainda mais garantir para ela que tudo aquilo era real e que sempre estaria ali ao seu lado, onde eu realmente pertencia.

- Fique comigo esta noite. - joguei o cabelo dela para trás, precisando ver seu rosto inteiro - Por favor, Lila, só... só esta noite - busquei por uma resposta nas profundezas dos seus olhos - Mas não fique porque está chateada. Fique comigo porque você quer.
As palavras saíram da minha boca suplicantes. Tudo o que precisava era que ela dissesse "sim".

O sorriso que surgiu no seu rosto poderia ter iluminado toda a Broadway.

- Não vou a lugar nenhum.

(....)

O lobby da WCS Communications sonza era exatamente como me lembrava: pretensioso, repugnante e fedendo a dinheiro. Até a mobília parecia desconfortável, como se aquela porcaria tivesse sido roubada de uma câmera de tortura. Ri da ironia daquele pensamento em particular. O fato de estar naquele prédio já era uma tortura por si só. Porra, eu estava quase subindo pelas paredes.

Respirando fundo, caminhei na direção da mulher de cabelos negros na recepção, odiando o barulho alto provocado por meus coturnos no piso de madeira brilhante e esperei pacientemente que ela encerrasse a sua ligação.

- Tenho uma reunião às duas com Luisa - resmunguei quando ela finalmente desligou o telefone.

- Srta. Luisa Sonza.

Pisquei.

Desejo Proibido - Malila Onde histórias criam vida. Descubra agora