Capítulo Dezessete

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[...]

O céu começava a ficar cinzento, sinal de que o amanhecer logo chegaria à Nápoles.

Na sacada de um quarto de hotel, sentindo o vento frio da manhã balançar seu cabelo solto e arrepiar sua pele protegida apenas por um roupão macio, Clarice encarava a cidade abaixo, que começava a despertar aos poucos.

Não tinha conseguido dormir. Após chegarem ao hotel, havia sugerido a Aidan que tomassem um banho juntos. O moreno, provavelmente percebendo o quanto precisava de seu toque após notícias tão perturbadoras, a tomou lenta e carinhosamente, uma vez sob a água fria do chuveiro e outra sobre a grande cama do quarto.

Em seguida, parecendo exausto, Aidan adormeceu abraçado à sua cintura, com a cabeça em seu peito, sob seus dedos que permaneceram acarinhando os cabelos morenos por muito tempo após a respiração dele ficar lenta e pesada, indicando um sono profundo.

Foi então que os pensamentos começaram. Tão assustadoramente conturbados que faziam seu coração se acelerar, sua respiração falhar. Apenas o calor de Aidan sobre si conseguia mantê-la calma, mesmo que sentisse que poderia sair gritando pela cidade.

Entendia um pouco, mas não muito sobre as relações entre as famílias. Se fosse revelado ao mundo que era filha de Leonel Salvatore, isso teria alguma consequência?

Aidan não pareceu feliz com a notícia. Na verdade, cada vez que ele a tocava, a beijava ou olhava para ela, parecia estar sendo a última. Quando alcançou o ápice pela segunda vez, juntamente com ele, Aidan a havia beijado de um jeito que jamais tinha feito e, mesmo sentindo-se no céu, Clarice sentiu na língua um gosto estranho de despedida.

Desde então, não conseguia parar de pensar que o corpo de Aidan o havia feito dormir tão profundamente para evitar encarar o que quer que ele precisasse fazer de agora em diante.

Na metade da madrugada, quando os pensamentos se tornaram tão sufocantes que nem mesmo o calor de Aidan foi capaz de acalmá-la, Clarice se desvencilhou com cuidado do corpo pesado que a cobria e vestiu um dos roupões dispostos no banheiro, e então foi se sentar na sacada.

Estava na mesma posição desde então, querendo que o ar frio fosse capaz de clarear seus pensamentos.

Mais uma olhada para o céu acinzentado, apenas para perceber que os primeiros raios de sol começavam a surgir no horizonte.

Aidan tinha um fardo pesado para carregar. Como Don, ele precisava colocar as necessidades de todos acima das suas, sacrificar seus desejos e sonhos se isso fosse contra o que era melhor para o futuro da família. Todos esperavam muito dele, já que era o sucessor de Leonel Salvatore, homem que, a partir da pequena família herdada do pai, havia construído um império.

Mas e se, de algum jeito, Clarice pudesse compartilhar ao menos uma parte desse fardo com ele? E se houvesse um jeito do moreno poder dividir esse peso, o dever?

E se o surgimento de uma filha, uma filha de sangue, desviasse as atenções de Aidan, o deixando mais livre para viver?

Após tantas horas de pensamentos conturbados, esse era o único que havia restado na mente de Clarice. Ela não conseguia pensar em mais nada a não ser dividir, compartilhar, suportar o fardo juntos. De estrangeira indesejada, ela poderia passar a ser a filha de Leonel Salvatore.

Mas isso, claro, implicaria que ela desistisse, total e completamente, da pessoa que havia sido até agora. Nenhuma faísca daquela garota francesa poderia sobreviver, restando apenas a mulher que herdaria uma família, a maior de todo o país, um império de dinheiro e sangue.

Dangerous LoveOnde histórias criam vida. Descubra agora