Sempre odiei dirigir pelo Ex.Te.R.N.O.
O carro balança com as pedras no caminho enquanto desvio de grandes monumentos cobertos de musgos de um mundo esquecido e deixado para a natureza densa que sobreviveu aos desastres biológico e físicos.
Foram três dias de viagem com meus Espectros no carro. Nunca falam comigo, apenas escutam. Provavelmente comiam e bebiam água quando eu tirava meu horário para dormir nos turnos de vigias.
Os saqueadores foram um problema, mas nada que eu e meus Espectros não dessem conta. Aqui fora, nem o Magnata é capaz de governar, mas Theodoro faz alianças frequentes com os líderes de grupos para que vendam lealdade a ele e amplie seu governo. Meu pai sabe como os convencer, já viveu no Ex.Te.R.N.O e conseguiu um exército para dominar o C.E.N.T.R.O naquela noite...
Eu sou Cruel, filho de Theodoro. Pertenço a espécie Furtruck, repito mentalmente até que meus pensamentos mudem novamente e eu foque na minha missão, a caçada que farei e a espécie que devo matar.
O mapa do ponto de encontro nos levou para uma pequena cidade destruída e nunca frequentada por nenhuma espécie. Os prédios que um dia acredito terem sidos belíssimos, agora são abraçados pela natureza. Os carros deixados para trás não passam de ferro enferrujado.
Os pedaços de concretos nos fizeram seguir nosso caminho a pé até o prédio destruído que foi indicado como covil dos Fúrias negociadores. Nenhum grupo nos espera na entrada, e isso me fez parar e analisar o território.
Meus Espectros fecham a mão, sinalizando que não sentem nada de errado no ar. Se não sentem a vibração de perigo, então talvez os Fúrias não se importam conosco o suficiente. Já aconteceu de uma espécie nos tratar como vermes, nos odiando e nos enojando.
— Sinto cheiro de Fúrias — relatou um dos Espectros, a boca abafada pelo pano. — Estão lá dentro.
Farejo o ar e sinto o pesado de animal, a vontade de entrar em uma briga, a raiva que inalada de suas essências, a fúria que nunca os deixam em paz. A espécie espera lá dentro, tão pouco mostrando interesse em nós. Ao menos, não ainda.
Olhei para cima, para os vidros em estilhaços do prédio. Parei minha atenção em duas luzes vermelhas direcionadas para baixo, vidradas em mim.
São olhos.
Ampliei minha visão, mas por algum motivo estranho, vejo embaçado, como se meu poder se confundisse em focar.
Pisquei e esfreguei os olhos, como se o embaçado sumisse e eu voltasse a enxergar bem, mas os olhos vermelhos já tinham sumido da janela.
Os Fúrias nos esperam. E mesmo não os sentindo, algo me diz que há mais lá dentro, e há algo estranho nesse lugar.
Vejo meus Espectros se entreolhando. Não consigo vê seus rostos, mas eu podia jurar que estão com a expressão confusa, como se não ter sentido também fosse estranho para eles.
Entrei no prédio sem expressar confusão, medo ou relutância. Os Fúrias me estudam no silêncio, me testam. Não demonstrarei fraqueza. Que vejam que nada é capaz de me derrubar.
— Espera! — pediu um dos meus Espectros, olhando os canos com goteiras e o chão sujo de lodo. — Sinto vibrações.
Os Espectros podem sentir vibrações em quilômetros de distância, é um poder invejável. Eu queria poder sentir quantas vibrações existissem ao meu redor, contar os inimigos apenas com eles existindo. Os tornam letais, já os prepara para batalhar na direção certa.
— Quantos? — perguntei. — É uma armadilha?
— Não sinto vibrações de ataque — relatou. — Mas sinto vibrações fracas. Como se os Fúrias tivessem morrendo. Deixando esse mundo.
Suposições não nos ajuda em nada, o que nos restou foi seguir em frente atentos, prontos para enfrentar os inimigos. Já passamos por coisa pior, armadilhas muito mais bem armadas do que dentro de um prédio. O cheiro de Fúria está no ar, tudo indicando que a espécie está aqui, então seguimos o cheiro.
E lá estavam nossos futuros negociadores.
A claridade que entra na sala espaçosa com água no chão, paredes descascadas e a umidade fria, vem do sol quase se pondo do lado de fora, mas forte o suficiente para iluminar os corpos ensanguentados de sete Fúrias mortos.
Meus Espectros já entraram em posição de ataque, querendo sentir vibrações que não conseguem. Estamos enfrentando um inimigo invisível.
Me aproximo dos corpos, os estudando. De fato, são nossos negociadores, seus rostos condizem com a foto que carrego no bolso para identificá-los. O que me admiro é suas peles pálidas e roxas, como se tivessem morridos afogados, mas os buracos no peito indicam que foi esse o golpe fatal.
Direciono minha mão na pele de um dos Fúrias, sentindo-a fria. Tiro uma faca da coxa e rasgo a pele do morto, e espero.
Nenhuma gota de sangue jorrou do corpo.
O sangue que os banha foi dos rasgos de quando ainda estavam vivos. Me torno mais atento, já me posicionando para atacar.
Tinham vibrações e cheiro de vivos, seja lá o que os matou, fez isso em minutos quando estávamos entrando no prédio, nos atraindo até aqui. Os tiraram o sangue do corpo, mas para onde? Nenhuma gota está no chão para nós mostrar que os deixou sangrar até ficarem pálidos, só que isso demoraria dias até seus corpos chegarem nesse estado.
Me virei bruscamente para a entrada que passamos, para a porta que bateu com força, tremendo a água no chão e os vidros já despedaçados.
Pela primeira vez desde muito tempo, recusei um passo.
Atrás da porta estava gravada uma frase com sangue, uma que me atingiu tão forte que estremeceu meus ossos:
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Supremo Syton
FantasíaHenrique tinha apenas 10 anos quando sua casa foi tomada e obrigado a ser o que ele nunca quis ser. Tornou-se o homem mais perigoso e temido pelos seus inimigos. Destinado a torturas e obediência ao seu pai, o Magnata, um sádico que o tortura se fi...