A caçada

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Estou pronto.
      Estou pronto para acabar com a noite sem fim que exclui da minha vida, pois hoje eu sei que ela nunca terminou, apenas se prolongou por anos e anos.
      Estou pronto para matar Theodoro.
      Hoje é o dia da Caçada. O dia da morte do Magnata.
      O C.E.N.T.R.O estava movimentado devido a celebração. As espécies aliadas do Magnata que vieram do Ex.Te.R.N.O ocupam hotéis pela cidade.
      É desconcertante estar ao lado de Theodoro na arena que criou para ser celebrado o Caçada Syton, parecia um estádio de futebol. Os assentos estão ocupados, as espécies que já possuem times declarados usam camisetas e bonés com os rostos dos caçadores, todos furtruks.
      Beatriz convenceu Theodoro a dispensar meus Espesctros hoje, usando a desculpa que os ter aqui, na presença dele, faz parecer que não consegue lidar comigo, e hoje ele aguarda uma visita inusitada: o líder dos fúrias.
      C.S.
      Vicente lidera os sytons para conseguirem entrar no prédio, dando tempo para Devi consegui recuperar o Núcleo, então atacar. Estou bem ao lado de Theodoro para eu ser o primeiro a atacá-lo e acabar com isso, independentemente que eu não tenha apoio aqui para sair vivo quando todos os furtruks virem vigar seu Magnata.
      — Está belíssimo, Cruel — elogiou-me Beatriz discretamente.
      Não mudei a expressão do meu resto para não levantar suspeitas, mas Beatriz sabe que diria algo se estivéssemos a sós.
      Meu pai me quis equipar como um soldado e um homem de negócios. Calças cargos firmes ao corpo com bolsos, camisa preta e uma jaqueta de couro cinza que desde até a metade das minhas coxas, um estilo moderno de sobretudo com terno. Passaram gel em meu cabelo até o deixar brilhoso, o penteando para trás em uma curva delicada do lado bem no início da testa, deixando à mostra minhas orelhas pontudas.
      Beatriz era de longe a garota mais bonita da arena com seu vestido vermelho com um grande V atrás, deixando à mostra sua pele branca. A maquiagem realçava seus olhos e cabelos rosados, o batom vermelho era uma tentação que me causava em borra-lo. 
      Até o filho da puta do meu pai estava belíssimo, mesmo que seu rosto possuísse traços de arranhões discretos que nem o poder de Beatriz conseguiu cicatrizar tudo, como se os machucados que Ayla faz fosse mais poderoso do que o poder de cura.
      Quando me apresentei mais cedo a ele, o mesmo mal quis olhar na minha cara, parecia chateado e estressado, apenas ordenou que eu fosse para a sala de preparação onde seus contratados me tornaram em um dos homens mais atraente da celebração. Achei estranho, mas hoje nada me tirará o sorriso que mantenho oculto.
      “Vamos entrar quando C.S chegar”, avisou Vicente.
      Ouço sua voz pelo ponto escondido no meu ouvido, tão profundo que as vezes preciso me concentrar para ouvir o externo, já que fica abafado, o que me salva é o outro ouvido livre sem nada o tampando. Agradeço ao Davi por ter feito esse minúsculo aparelho para que nós nos comunicássemos.
      “Hoje possuem menos soldados do que antes”, observou Devi.
      “Os escalonei para servirem de soldados na cidade devido a caçada”, justificou Beatriz. “De nada, rapazes”.
      Eu e ela trocamos olhares compreensíveis.
      “Me lembre de comprar um presente para você”, divertiu-se Devi.
      Se não fosse pela tyfon, nunca teríamos chances de fazer tudo organizado, ela cuidou de tudo no C.E.N.T.R.O para que tudo dê certo no final.
      Eu queria falar algo, mas estou perto demais do meu pai, ele pode ouvir. Eu queria perguntar onde está Sandro, já que ele sempre está ao lado do seu Magnata. Hoje quem se mantém firme é Leonardo no lugar do homem que matou Lys.
      O furtruk soldado está equipado para a guerra, a farda de líder dos demais furtruks.
       Quando as cornetas soaram, meu corpo se arrepiou e minhas Sombras se agitaram.
      “Vamos entrar!”, garantiu Vicente.
       Theodoro, os ministros e os aliados do Ex.Te.R.N.O se levantaram para receber o convidado especial.
       C.S não estava nenhum pouco como um careca simpático.
       O fúria estava sendo escoltado pelos seus soldados fúrias pela arena, ocasionando alvoroço na multidão, os admirando. Ele estava assustador, mas para mim, vi a perfeição, mesmo com sua careca cheia de cicatrizes, seu rosto enrugado e de cara fechada, seus olhos de lagarto esbanjando o terror. É o homem que me tomou para si na primeira vez que apareci em sua caverna ferido, que me aceitou em sua família.
      — Me acionou, Magnata Theodoro, da espécie furtruk. Apenas espero que meu tempo não seja desperdiçado aqui — declarou C.S, a voz tão grossa que o tom feroz chegou no pilar alto que estamos, a área vip composta pelas espécies mais importantes do C.E.N.T.R.O.
      O sorriso do meu pai fora a diversão mais assustadora que já vi o ter.
      — Posso lhe garantir que seu tempo será bem gasto aqui — disse Theodoro. — Venha, preparei um lugar especial apenas para você.
      Meu pai apontou para um assento aconchegante do seu lado, a moldura da cadeira tingida de ouro e a almofada vermelha macia. Parecia dois tronos pequenos dignos dos homens que demonstram poder apenas existindo.
      C.S subiu as escadarias até a área vip sendo vigiado por todos e aos cochichos da multidão. Ignorou os ministros e veio até Theodoro, lhe apertando a mão, como se os demais não valessem a sua presença.
      — Finalmente nos encontramos, general — saudou meu pai.
      Gael, o líder fúria, o verdadeiro, era general e irmão de sangue de C.S que preferiu criar sua dinastia no Ex.Te.R.N.O do que dentro da terra, mas C.S por anos foi a dor de cabeça dele, sendo morto meses atrás pelo próprio irmão.
      O fúria que encontrei em minha missão eram os últimos corrompidos da dinastia de Gael que não quiseram servi a C.S, e pediam ajuda a Theodoro, mas Ayla resolveu esse pequeno impasse antes que abrissem a boca. Nunca perguntei como os outros mataram meus verdadeiros Espectros, porque tê-los mortos é melhor do que realmente querer saber algo.
      C.S olhou-me da cabeça aos pés, me julgando para saber se sou digno de sua presença.
      — Bom vê-lo novamente, Cruel — disse C.S. — Não o vejo desde que matou os sytons suicidas. Voltou para casa rápido demais. 
      Theodoro sorriu animado ao apertar meus ombros e apontar para mim, como um pai orgulhoso.
      — Se quer mais ajuda do meu filho, surpreenda-me, general — disse Theodoro. — Cruel nunca decepciona.
      Mantenho a neutralidade na face, embora o toque de Theodoro me cause náuseas.
      — Ah, vi com meus próprios olhos o que ele consegue fazer. — C.S sorriu pelo duplo sentido. — Mas não preciso dele, muito menos de você, Magnata Theodoro. Então, é você que me deve surpreender.
      Invés de Theodoro fechar a cara pela provocação, ele apenas aumentou o sorriso.
      — Eu vou — garantiu ele.
      Antes de sentar no lado direito do Magnata, C.S acenou com a cabeça para Leonardo e Beatriz.
      Eu ocupei meu assento no lado esquerdo do meu pai. Eu e C.S trocamos olhares cumplices. Vi ele desviar o olhar e por um segundo, lamentar me ver assim: alguém que não sou. Ele sabia que minha neutralidade sempre fora uma máscara de sobrevivência.
      — Meus súditos — a voz de Theodoro soou pelos altos falantes para que o público o ouvisse, e a agitação deles é a comprovação que ouviram, como também viram sua imagem no grande telão posto na parte superior da arena. — Comemoramos mais uma caçada aqueles que se acharam donos do mundo durante séculos após a guerra. — Mais gritos da multidão concordando com o Magnata. — Trago uma feliz e péssima notícia hoje a vocês.
      Theodoro olhou para trás, fixando seus olhos nos meus. Uma gélida gota de suor desde pela minha coluna me causando calafrios. Sustento aquele olhar tenebroso até que meu pai voltasse novamente a multidão para discursar.
      Algo está errado, observou minhas Sombras. Sinto-me atordoado.
      — A má notícia é que hoje celebramos a última caçada syton — disse ele. — Mas a boa notícia é que esse dia entrará para a história como o dia da extinção syton.
      Não, não entrará, digo mentalmente. Está errado, esse dia entrará para a história como o dia da sua morte.
      — Cruel — chamou meu pai.
      Levanto-me de imediato, como um soldado obediente.
      — Meu pai — o saúdo com a cabeça baixa.
      Ele estira a mão para mim, e eu a seguro. Em um simples puxão para ele, vi os passos tornando-se lentos e tudo se tornar um vazio sem fim se formando em meu peito.
      — Declare o início da Caçada e o fim de uma espécie — ordenou ele, me deixando em pé naquele pedestal, minha imagem na tela maior, uma multidão silenciosa esperando meu pronunciamento.
      Nunca me senti tão exposto quanto agora.
      Sabe o que é mais difícil disso tudo? Fingir não se importar. Fiz isso a minha vida toda, me escondendo em mim mesmo, e hoje o que deveria ser fácil, é minha pior tortura.
      Mesmo assim, não hesitei ou demonstrei incomodo.
      — Que a última caçada comece — declarei.
     A multidão vibrou em comemoração.
     O ponto no meu ouvido zumbiu em uma linha aguda de som que parecia estourar meus neurônios.
     Com tanto barulho externo, tudo ficou silencioso internamente.


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