Capítulo 1

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Marília

— Você tá pronta? — Ela me olha com os olhos brilhando e sorri.

—Estou! — Menti. Eu estava longe de estar pronta. Se tem uma coisa que eu não estava naquele momento era pronta. Mas sorri pra ela pra tentar de alguma forma passar segurança.

Ela se aproximou do mármore do banheiro e pegou o teste em suas mãos e o pressionou contra o peito numa tentativa de conter todo seu medo. Eu apenas a olhei, me aproximei e passei meu braço em volta de sua cintura. Ficamos em silêncio por longos minutos até que ela resolveu virar o teste. Eu me contive pra não olhar imediatamente, apenas afundei meu rosto na curva de seu pescoço e pedi pra todas as coisas existentes e poderosas do mundo pra que pelo menos daquele vez o resultado fosse o que esperávamos.

Sinto seu corpo ficar rígido, o barulho alto da sua saliva percorrendo toda sua garganta e um suspiro quase que indecifrável deixar seu corpo e eu apenas consigo me afastar e encarar sua expressão pelo reflexo do espelho.

Vejo seus olhos fixados no teste que estava em suas mãos. Eu me afasto e a encaro de costa pra mim. Não demora muito pra ela se vire e uma pontada de esperança tomar todo o meu ser.

— Amor... fala alguma coisa! - Suplico.

Ela me olha sem esboçar reação alguma ou eu simplesmente não consigo prestar atenção no que seus olhos estão me dizendo. Ela estende sua mão e me entrega o teste. Eu o pego e imediatamente o olho com um leve sorriso em meus lábios, mas, quando vejo o que ele indicava sinto como se um balde de água fria fosse jogado sobre mim. Sinto meus sentidos se perderem, tudo a minha volta parece parar e acontecer em câmera lenta. O som da minha respiração é pesado, por longos segundos me desligo de tudo a minha volta até que ouço ao fundo um pequeno gemido e então volta átona.

— Desculpa... — Sua voz é trêmula e falha. — Eu sinto muito.. — Sinto toda a dor em sua voz e em cada palavra que ela pronuncia.

— Tudo bem! — Estendo a mão e puxo pros meus braços. A envolvo em um abraço e sussurro quantas vezes forem preciso que ficará tudo bem.

— Eu sei o quanto queríamos isso, sei que planejamos a um bom tempo.

— Talvez não fosse a hora. — Falo na tentativa de consola-lá já que tudo que passa em minha mente é que não está nada bem e que mais uma vez não conseguimos.

Estamos tentando ter o nosso primeiro filho a longos meses. Já fazem três anos que casamos, apesar de o médico sempre dizer que não tem nada errado. Nada acontece. O positivo não chega. Apesar de toda a minha frustração, o que me deixa ainda mais frustrada é toda vez ver a Maiara empolgada e esperançosa e toda a sua confiança ir embora toda vez que um negativo aparece.

— Acho que não conseguirei fazer isso com você..

— Que? — Me afasto um pouco dela olho em seus olhos. — O que você quer dizer?

— Casamos planejando uma família Marília, mas, isso não está acontecendo. — Ela tenta conter mas as lágrimas continuam rolando por seu rosto. — Eu queria muito, mas pelo que percebo você acabou escolhendo errado. Escolheu uma mulher falha como eu que não consegue nem se quer gerar um bebê. Sinto muito.

Ela se afasta de mim e vai até a cama, senta na beirada da mesma e puxa o travesseiro o colocando contra seu rosto e um grito escapa de seus lábios. Eu apenas paro, observo toda a cena pois sei que independente do que eu fale agora não vai mudar nada.

Ela tira o travesseiro do rosto e o coloca sobre a cama e começa esmurra-lo sem parar e os gritos que antes eram abafados pelo mesmo agora preenche todo o vazio do nosso quarto.

Me aproximo dela sentando ao seu lado e apenas a abraço, sinto pequenos tapas em meu braço e ela tenta a todo custo se desvincular de mim.

— Me deixa, Marília. — Ela diz tentando se afastar. — Eu não mereço você e você não merece alguém que não consegue te dar uma família.

— Não seja tão cruel com você, meu amor. — A aperto ainda mais em meus braços. — Daremos um jeito, sempre damos um jeito. Eu posso fazer isso.

— Não! — Ela diz sem nem ao menos pensar duas vezes. — Planejamos tudo pra que fosse eu a ficar grávida, sempre foi uma das minhas prioridades e concordamos.

— Deixa de ser cabeça dura. Eu posso fazer isso, você não será menos mãe por isso.

— Não é sobre ser menos mãe, Marília. — Ela se afasta e me olha completamente decepcionada. — Você não entenderia.

— Me diz.. me diz que eu juro tentar! — A encaro na esperança de ouvir seja o que ela julga não ser algo incompreensivo por mim, mas som algum sai da sua boca.

Ao fundo ouço a porta de nosso quarto ser aberto e vejo a Maraisa parada na soleira da porta. Eu a olho como se pedisse socorro, não por não saber lidar com a pessoa que amo, mas por saber que ninguém entende e consola melhor a Maiara do que a sua própria cópia.

— Desculpa abrir a porta  eu pensei ouvir alguns gritos daqui... eu bati algumas vezes mas vocês não responderam. — Ela diz meio sem jeito, preocupada, nos encarando, tentando entender toda a cena que esta diante de seus olhos.

— Marília, sai! — Maiara diz num tom seco, sem nem ao menos me olhar. Ela abaixo sua cabeça e afasta um pouco seu corpo do meu. — Me deixa.. por... favor... Me deixa sozinha com a minha irmã.

Eu apenas a olhei, levantei da cama e não disse nada, apenas passei pela porta e a deixei ali sozinha com a Maraisa.

A cada passo que dava era uma lágrima que escorria pelo meu rosto. A frustração de nunca chegar o nosso tão sonhado positivo, a frustração de não saber lidar com toda essa bagunça juntamente com a Maiara, a frustração de vê-la mal e ter que manter a pose de durona, pois não tem como as duas desmoronarem ao mesmo tempo.

Eu sinto tudo em mim doer, sinto cada parte do meu ser, ser tomado por uma dor que não consigo descrever. É como se tudo que eu colocasse em minhas mãos escorrerem pelos meus dedos sem que eu pudesse fazer algo.

Eu já não tenho o que fazer, todas as vezes são assim, todos os negativos que tivemos no decorrer desse ano acabaram da mesma forma, eu dormindo no sofá ou no quarto de hóspede enquanto a Maiara prefere ser consolada pela Maraisa. Não a julgo, mas eu queria ser essa pessoa, eu também queria consola-lá e ser consolada.

Talvez eu devesse sair. Penso. Não tem nada que eu posso fazer aqui no momento é tudo que quero é tentar de algumas formar esquecer o que está acontecendo, nem que seja por algumas horas. Eu preciso.. eu necessito.

Depois da tempestade. - MaililaOnde histórias criam vida. Descubra agora